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SINTA A DOR, FALE SOBRE ELA
Ciência e Saúde

SINTA A DOR, FALE SOBRE ELA

Nunca tivemos tantas pessoas adoecidas, a despeito do uso desmesurado de ansiolíticos e antidepressivos
Edição Impressa
Tipo Notícia

Vivemos em um tempo acelerado, marcado pelo imediatismo, pela falência das narrativas. Isso é fato. Nesse tempo, a escuta do sofrimento, da dor e das nossas angústias dá lugar a uma desimplicação do sujeito com relação a sua história. O que isso significa? Significa que cada vez mais nos distanciamos de nós mesmos e vivemos como autômatos, alheios à condição de sujeitos desejantes. Pagamos um preço alto por esse modo de viver. Nunca tivemos tantas pessoas adoecidas, a despeito do uso desmesurado de ansiolíticos e antidepressivos. Se tais medicamentos resolvessem a dor de existir era de se esperar que as pessoas estivessem bem, mas essa não é a cena. Muito pelo contrário. É exatamente o discurso que está na linha de frente e que dá muito lucro à indústria de medicamentos, um dos sintomas do nosso tempo. É muito mais fácil atribuir a causa do sofrimento e da angústia a uma alteração na química cerebral, depositando nas pílulas da felicidade a restituição de um suposto bem-estar.

Viver não é fácil. Viver é difícil! Não há manual, não há receita para o bem-viver. Cada um, na sua singularidade, tem que lidar com o fato de que o mundo não é como você gostaria que ele fosse. As pessoas não são como você gostaria que elas fossem. Estamos no setembro amarelo, mês de prevenção ao suicídio. Ato sempre singular que comporta a força destrutiva da pulsão de morte como sendo a única via possível de descarga do sofrimento. O suicídio, a loucura, a sexualidade e a morte são dados da condição humana que não podem ser curados porque a humanidade não pode curar-se do que ela é. Como disse certa vez a psicanalista francesa Elisabeth Roudinesco:"já imaginaram uma sociedade que eliminasse a morte, o suicídio, a loucura, as neuroses? O que seria o homem livre de suas paixões? Seria um cemitério!"

É preciso que possamos dar nome aos nossos sofrimentos, falar deles e não silenciar. Como diz um trecho da letra de uma das canções da banda inglesa Tears for Fears: "feel the pain, talk about it". Ou seja, sinta a dor, fale sobre ela. Implicar-se na sua dor, no seu sofrimento e não fugir deles.

Tem um ditado muito conhecido que diz: não se fala de corda em casa de enforcado. É exatamente o contrário! É preciso falar. Dar nome a dor de existir, o que também não é fácil mas possibilita ao sujeito o vislumbre de uma outra posição subjetiva diante da vida. Pense nisso.

 

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