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Os sinais e as consequências da artrose em atletas de alto rendimento
Ciência e Saúde

Os sinais e as consequências da artrose em atletas de alto rendimento

A osteoartrite atinge as articulações e provoca dores desde tarefas do dia a dia como na prática esportiva de alto nível. Especialistas e atletas apontam como lidar de forma preventiva com a doença e métodos de tratamento
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Atacante Neymar sai chorando de campo após sofrer lesão no joelho esquerdo no jogo Uruguai x Brasil, no Centenário, pelas Eliminatórias da Copa (Foto: Pablo PORCIUNCULA / AFP)
Foto: Pablo PORCIUNCULA / AFP Atacante Neymar sai chorando de campo após sofrer lesão no joelho esquerdo no jogo Uruguai x Brasil, no Centenário, pelas Eliminatórias da Copa

 

 

As dores no joelho ao descer escadas, o incômodo no tornozelo em caminhadas mais extensas ou a pouca mobilidade na mão para atividades simples têm, na maior parte das vezes, a osteoartrite como causa. Popularmente conhecida como artrose, a doença é bastante frequente a partir dos 60 anos, sobretudo em mulheres, mas também atinge praticantes de exercícios físicos mais jovens, inclusive atletas profissionais de alto rendimento.

De acordo com a Sociedade Brasileira de Reumatologia, de 30% a 40% dos atendimentos em ambulatórios dessa especialidade são por causa de osteoartrite. A condição, de acordo com a Previdência Social, é responsável por 7,5% dos casos de afastamento de trabalho, além de 10,5% em relação auxílio-doença — a segunda doença mais apresentada — e por 6,2% das aposentadorias por questões médicas.

A enfermidade pode surgir a partir de fatores mecânicos (mau alinhamento do corpo, lesões ou fraturas) ou biológicos (artrite ou acúmulo de cristais), além da possibilidade de influência do fator genético. A orientação de profissionais da saúde, o controle do sobrepeso e a prática de exercícios contribuem para a prevenção das dores e do agravamento da condição. Em casos mais avançados, o tratamento envolve fisioterapia, medicamentos (oral ou injetável) e cirurgia.

Imagem ilustrativa em 3D de um atleta com articulações inflamadas(Foto: AdobeStock)
Foto: AdobeStock Imagem ilustrativa em 3D de um atleta com articulações inflamadas

No esporte de alta performance, a artrose leva os competidores a conviverem com uma rotina de dores, o que exige trabalhos de prevenção e tratamento — inclusive com uso de medicação por infiltração —, e até cirurgias em casos mais extremos, a depender do nível de exigência e intensidade de cada modalidade.

O basquete e o vôlei, pelos constantes saltos e impacto no solo, forçam bastante joelho e tornozelo dos jogadores; o futebol aumenta o desgaste das articulações devido às longas quilometragens percorridas e também pelo constante choque com os adversários; os atritos e as pancadas também acontecem no MMA. O atletismo, em suas diversas categorias, exige esforço de mãos, quadril, tornozelo e joelhos, por exemplo.

"O esporte competitivo, com alta demanda, alta potência, vai levar a um índice maior de lesões", explica o médico Carlos Andreoli, ortopedista da seleção brasileira de basquete e diretor do departamento de saúde da Confederação Brasileira de Basquete (CBB).

Carlos Andreoli, ortopedista da seleção brasileira de basquete e diretor do departamento de saúde da Confederação Brasileira de Basquete(Foto: Daniel Casanova/Divulgação)
Foto: Daniel Casanova/Divulgação Carlos Andreoli, ortopedista da seleção brasileira de basquete e diretor do departamento de saúde da Confederação Brasileira de Basquete

Em evento em São Paulo, no fim de setembro, no qual O POVO esteve presente, Andreoli apresentou estatísticas referentes aos efeitos da doença em atletas da modalidade, tanto na NBA, a principal liga do mundo, nos Estados Unidos, quanto no Brasil.

Um estudo na competição norte-americana entre as temporadas de 2006 e 2016 indicou que foram 12.960 lesões de jogadores no período, sendo quase 22% de tornozelo (2.832) e quase 20% de joelho (2.305). Já um levantamento com 108 atletas acerca da qualidade de vida após aposentadoria, 51 tiveram contusão no joelho: 72% conviveram com dores ao longo da carreira, e 34% passaram por cirurgia após encerrar a trajetória profissional.

"No basquete envolve uma posição de salto, aqueles saltos, aquelas enterradas. Acompanhando pré e pós-temporada, alguns atletas viram que existem alterações, pela ressonância, na cartilagem. Ao longo de uma temporada, a cartilagem acaba sofrendo esse desgaste", aponta o ortopedista.

Fábio Krebs, médico da Conmebol e presidente da regional do Rio Grande do Sul da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia(Foto: Daniel Casanova/Divulgação)
Foto: Daniel Casanova/Divulgação Fábio Krebs, médico da Conmebol e presidente da regional do Rio Grande do Sul da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia

No futebol, a Conmebol, entidade responsável pelas competições da América do Sul, também cataloga dados das lesões dos atletas em torneios de seleções nacionais do continente e clubes — Eliminatórias da Copa do Mundo, Copa América, Libertadores e Sul-Americana, por exemplo. Ao final do ano, o departamento médico da entidade repassa as informações às equipes e também colhe dados sobre o trabalho realizado para tentar evitar contusões.

"A gente envia um médico de campo da Conmebol (aos jogos) e faz um relatório das principais lesões que ocorrem para que, no final do ano, a gente tenha um levantamento do que houve mais de lesão: se foi mais lesão muscular, de entorse, de contusão... Para que, com isso, tu possa também orientar os clubes e as seleções da América do Sul — e também do mundo, como a Fifa nos orienta a fazer — que tenham trabalhos preventivos", afirma o ortopedista Fábio Krebs, médico da Conmebol e presidente da regional do Rio Grande do Sul da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT-RS).

 

 

Efeitos da artrite em "atletas de fim de semana"

A osteoartrite também pode se manifestar em atletas amadores ou recém-iniciados, o que faz os médicos e profissionais do esporte alertarem para a necessidade de cuidados prévios ao começo da prática regular de atividades físicas, como o "racha" de futebol semanal com os amigos, a corrida de rua ou treinos na academia.

"Esse atleta se inspira no atleta profissional e quer ser um atleta profissional. Claro que não vai ter a mesma condição de treinamento ou de prevenção, mas a principal coisa que eu digo: fazer uma avaliação médica antes de qualquer prática esportiva, uma avaliação nutricional, para que, com isso, tu possa ter um desempenho na parte física, com um educador físico, e o trabalho preventivo, junto com a fisioterapia, para fazer a atividade física de maneira saudável e preservando o corpo", pondera Krebs.

Modelo do calçado faz a diferença para os exercícios físicos(Foto: Jesse D. Garrabrant / NBAE / Getty Images / Getty Images via AFP)
Foto: Jesse D. Garrabrant / NBAE / Getty Images / Getty Images via AFP Modelo do calçado faz a diferença para os exercícios físicos

Até mesmo o modelo de calçado para o exercício pode fazer a diferença. "Muitas vezes, a gente não sabe o nosso tipo de pisada. [...] E a maioria das escolhas do calçado é baseada em propaganda da televisão, e não do que você precisa. Aí, você gasta aquela grana naquele tênis, porque o campeão da maratona olímpica usou. Não precisa. Se tivesse um tênis mais baratinho, mas correto para você, ia ser a melhor escolha", alerta Leandro Gregorut, ortopedista e diretor médico do Ironman Brasil.

O médico indica que uma corrida em ritmo mais lento — comumente chamada de trote — induz uma carga de nove vezes o peso do corpo em cada passada, enquanto uma corrida transmite em até 14 vezes a cada passada. Até movimentos mais corriqueiros, como descer escadas (seis vezes o peso corporal), também podem forçar em demasia as articulações, o que exige cuidados.

"Você começa a sentir uma dorzinha depois que a atividade (física) começou. Ela pode durar depois que acabou a atividade, porque criou uma inflamação e esse processo inflamatório pode durar de 24 horas a 72 horas, de um a três dias. Aí, começa a piorar e, quando piora, não acontece somente na prática esportiva, acontece também no dia a dia. Você não sente tanto para subir escada, mas incomoda para descer escada, aí começa a doer quando está com a perna cruzada, dormindo, o joelho começa a ficar inchado...", detalha Gregorut.

 

 

Os sacrifícios do esporte de alto rendimento

"No esporte de alto rendimento, como eu estou dentro há mais de 20 anos, posso falar que não é saúde. Ninguém sai de lá bem".

A dura visão do experiente pivô de basquete Vitor Faverani, 36, do São Paulo, pode assustar pela franqueza, mas traduz a realidade de muitos atletas que disputaram — ou ainda disputam — as principais competições nacionais ou internacionais. Não são poucos os casos de ex-jogadores ou ex-competidores que ainda convivem com dores mesmo após um longo período longe da alta performance.

No Novo Basquete Brasil (NBB), principal competição disputada por Faverani com a camisa do Tricolor do Morumbi, foram monitorados 96 jogadores de oito times, entre julho e outubro de 2023. A lesão mais recorrente era no joelho, com 23% deles já tendo sido submetidos a procedimentos cirúrgicos.

Pivô de basquete Vitor Faverani, do São Paulo(Foto: Miguel Schincariol/Saopaulofc.net)
Foto: Miguel Schincariol/Saopaulofc.net Pivô de basquete Vitor Faverani, do São Paulo

Aqueles de gerações mais antigas, que não tinham as melhores condições de tratamento disponíveis e nem a medicina moderna para as cirurgias mais eficientes, às vezes sofrem com limitações até na locomoção e precisaram se afastar de vez dos exercícios — em alguns casos, aposentadorias foram antecipadas pela condição física prejudicada. O ex-jogador de futebol Zico, maior ídolo do Flamengo, por exemplo, teve grave lesão no joelho durante a carreira e até hoje padece com as consequências.

Um campeonato de basquete de masters em 2022 foi monitorado pela CBB, com 86 atletas, de 35 a 86 anos. Quase 80% deles já tinham sofrido com dores no joelho, e 28% passaram por cirurgia.

"Sou atleta profissional de basquete desde os 13 anos de idade. Tenho nove cirurgias nos joelhos e acho que vou fazer a décima daqui a pouco. Joguei quase 15, 16 anos na Europa, todos os meus tratamentos foram lá, e eles decidiram me aposentar. Faz seis anos. Eu sou teimoso demais e falei para eles que não ia me aposentar", relembra Faverani, que já defendeu o Boston Celtics, da NBA, e o Barcelona-ESP, por exemplo.

Junior "Cigano" dos Santos, lutador de MMA do UFC comemora a conquista do cinturão dos pesos pesados ao derrotar Cain Velásquez Foto: Divulgação(Foto: Donald Miralle/Zuffa LLC)
Foto: Donald Miralle/Zuffa LLC Junior "Cigano" dos Santos, lutador de MMA do UFC comemora a conquista do cinturão dos pesos pesados ao derrotar Cain Velásquez Foto: Divulgação

Entre trabalhos preventivos, uso de infiltração e tolerância às dores, os atletas de alto rendimento por vezes decidem competir no "sacrifício", sobretudo em momentos decisivos. Foi o que fez o lutador de MMA Júnior Cigano em 2011, quando disputou o cinturão dos pesos-pesados do UFC com o mexicano Cain Velasquez e ganhou por nocaute, recorda o ortopedista e traumatologista Fábio Costa, diretor médico da Comissão Atlética Brasileira de MMA.

Cigano sentiu dores no joelho ainda no vestiário, durante o aquecimento, a dez minutos de subir para a luta. Recorreu ao médico e sentiu firmeza para encarar o mexicano no octógono sem dores, mesmo sendo atingido pelo adversário.

"Eu não podia dar nada para ele, porque a Comissão Atlética de Nevada não permite nenhum tipo de medicação ali. Mas eu tinha uma garrafinha de água, encostei numa mesa, esmaguei uma coisa, fingi que estava colocando remédio para ele e dei a garrafinha. 'Toma, botei morfina aí dentro, você não vai sentir nada'. Ele bebeu aquela água acreditando que aquilo ia melhorar ele. Três minutos depois, ele fazia assim (imita pisada): 'Melhorou, doutor'. A luta durou um minuto e quatro segundos", relata o médico baiano, orgulhoso.

Fábio Costa, diretor médico da Comissão Atlética Brasileira de MMA(Foto: Daniel Casanova/Divulgação)
Foto: Daniel Casanova/Divulgação Fábio Costa, diretor médico da Comissão Atlética Brasileira de MMA

As privações na vida social também fazem parte da rotina dos atletas, o que inclui alimentação regrada, disciplina no descanso e obediência às recomendações dos profissionais. "Tem que comer direitinho, evitar fritura, gordura, carne saturada, não pode fumar, evitar beber... São as boas recomendações de saúde para você poder praticar aquilo que gosta", diz Leandro Gregorut.

"O maior desafio é você fazer a pessoa entender que o benefício dela vai ser maior se seguir um plano do que simplesmente fazer da cabeça dela, que pode não melhorar ou se machucar", finaliza o médico.

 

 

A infiltração como opção de tratamento

No esporte de alto rendimento, os atletas convivem com as dores em treinos e jogos e, com o avançar da idade, passam a se cercar de mais cuidados e trabalhos físicos preventivos para conseguir manter o desempenho em bom nível. Por vezes, porém, é necessário recorrer à infiltração, que consiste na aplicação de medicamento em uma região inflamada — em geral, em articulações ou músculos.

O avanço da medicina esportiva proporcionou que a infiltração se tornasse uma medida profilática, e não emergencial, chamada de viscosuplementação. Ou seja, os competidores passaram a fazer tratamentos periódicos com medicações injetáveis, especialmente o ácido hialurônico, o que evita o uso antes de jogos ou torneios importantes para se livrar da dor de maneira momentânea.

A substância, que é uma molécula fabricada pelo corpo humano e por outros animais, ajuda a lubrificar, sustentar e preencher os tecidos, amenizando o desgaste de articulações como joelho e tornozelo. A medida já é recorrente em modalidades como futebol, basquete, MMA e maratonas de corrida, por exemplo.

Lance do jogo entre New Orleans Pelicans e Golden State Warriors pela NBA: constantes saltos no basquete forçam as articulações(Foto: Noah Graham / NBAE / Getty Images / Getty Images via AFP)
Foto: Noah Graham / NBAE / Getty Images / Getty Images via AFP Lance do jogo entre New Orleans Pelicans e Golden State Warriors pela NBA: constantes saltos no basquete forçam as articulações

"A viscosuplementação atua como um amortiguador de impacto, um lubrificante da articulação, como se fosse um óleo numa engrenagem, para que possa funcionar de maneira adequada, sem ter tanto rangido", exemplifica Fábio Krebs.

Os médicos recomendam um intervalo entre as aplicações, seja semestral ou anual, para que o ácido hialurônico surta efeito e evite prejuízos ao corpo dos atletas com eventual uso em demasia. Em geral, o método é utilizado por atletas com osteoartrite ou condromalácia patelar. O período entre a aplicação e o retorno às atividades também exige um hiato de dois a três dias para que não haja reações adversas.

Laura Amato, atleta maratonista
Laura Amato, atleta maratonista Crédito: Daniel Casanova/Divulgação

"Eu tive uma experiência que fiz uma infiltração de ácido hialurônico na Espanha e o médico falou, para mim, 48 horas ou 24 horas (para voltar aos treinos), que é o mínimo, para garantir que você já pode fazer o impacto. Eu não obedeci, obviamente — falei que era teimoso —, e fui treinar. Meu joelho inchou, e eles tentavam tirar o líquido do joelho e não conseguiam. Até que eles colocaram uma agulha que parecia uma mangueira e começaram a puxar como se fossem vidrinhos", recorda Vitor Faverani.

Adepta das corridas de rua e aspirante a maratonista, a paulistana Laura Amato, de 48 anos, começou a treinar há oito anos e, diante do ritmo intenso, sentiu as dores da condromalácia patelar. Recorreu a uma consulta médica à procura de soluções e ouviu que teria de parar com a atividade física recém-descoberta. "Eu falei: 'De forma alguma. Comecei agora, descobri aos 40, e vou parar de correr? Não, vou correr'".

Laura procurou outras opiniões médicas até conhecer o tratamento com ácido hialurônico, ao qual deu início em meio ao período de Covid-19, quando sofria com dores intensas. "Há uns dois anos e meio, três, comecei com o tratamento. A primeira aplicação que eu fiz foi fantástica. (Fiquei) sem dor, estava com muita inflamação. Na pandemia, eu não conseguia dormir à noite, de tanta dor nos joelhos, uma inflamação terrível", contou.

 

 

Maior tendência de osteoartrite para mulheres

Os estudos apontam que, em uma escala global, 300 milhões de pessoas são acometidos pela artrose, sendo a doença mais prevalente em pacientes com mais de 60 anos. No recorte geral, 18% das mulheres têm a doença, ao passo que 10% dos homens sofrem com dores nas articulações.

A incidência maior em indivíduos do sexo feminino passa por questões hormonais e formato da bacia, por exemplo, além de também poder ter influência de fatores genéticos e trabalhos pesados.

"Normalmente, a mulher, quando vai envelhecendo, a taxa hormonal vai caindo e, com isso, prejudica a cartilagem, os ligamentos, os tendões e a musculatura. O sistema muscoloesquelético é protegido pelos fatores hormonais femininos", explica Leandro Gregorut.

Leandro Gregorut, diretor médico do Ironman Brasil(Foto: Daniel Casanova/Divulgação)
Foto: Daniel Casanova/Divulgação Leandro Gregorut, diretor médico do Ironman Brasil

O período pós-gestação também requer alguns cuidados das novas mamães no retorno aos exercícios em razão das mudanças que ocorrem no organismo antes e depois do parto.

"Quando tem a gestação, acontece um excesso de hormônios, então aumenta a flexibilidade tendínea, flexibilidade ligamentar, tem frouxidão das estruturas, o que favorece depois a ter algum tipo de lesão. Quanto tempo demora para voltar ao normal? Meses e meses. Mas, se você não fizer de uma maneira correta, um realinhamento muscular, fortalecimento, vai dar problema", avisa o médico.

Os especialistas também alertam que, para as mulheres que já praticam atividades físicas, não há problema em dar continuidade durante a gestação, com os devidos cuidados, mas que há uma atenção maior em relação àquelas que querem começar em meio à gravidez.

O repórter viajou a convite da empresa farmacêutica Adium

Efeitos da artrite em "atletas de fim de semana"

A osteoartrite também pode se manifestar em atletas amadores ou recém-iniciados, o que faz os médicos e profissionais do esporte alertarem para a necessidade de cuidados prévios ao começo da prática regular de atividades físicas, como o "racha" de futebol semanal com os amigos, a corrida de rua ou treinos na academia.

"Esse atleta se inspira no atleta profissional e quer ser um atleta profissional. Claro que não vai ter a mesma condição de treinamento ou de prevenção, mas a principal coisa que eu digo: fazer uma avaliação médica antes de qualquer prática esportiva, uma avaliação nutricional, para que, com isso, tu possa ter um desempenho na parte física, com um educador físico, e o trabalho preventivo, junto com a fisioterapia, para fazer a atividade física de maneira saudável e preservando o corpo", pondera Krebs.

Até mesmo o modelo de calçado para o exercício pode fazer a diferença. "Muitas vezes, a gente não sabe o nosso tipo de pisada. [...] E a maioria das escolhas do calçado é baseada em propaganda da televisão, e não do que você precisa. Aí, você gasta aquela grana naquele tênis, porque o campeão da maratona olímpica usou. Não precisa. Se tivesse um tênis mais baratinho, mas correto para você, ia ser a melhor escolha", alerta Leandro Gregorut, ortopedista e diretor médico do Ironman Brasil.

O médico indica que uma corrida em ritmo mais lento — comumente chamada de trote — induz uma carga de nove vezes o peso do corpo em cada passada, enquanto uma corrida transmite em até 14 vezes a cada passada. Até movimentos mais corriqueiros, como descer escadas (seis vezes o peso corporal), também podem forçar em demasia as articulações, o que exige cuidados.

"Você começa a sentir uma dorzinha depois que a atividade (física) começou. Ela pode durar depois que acabou a atividade, porque criou uma inflamação e esse processo inflamatório pode durar de 24 horas a 72 horas, de um a três dias. Aí, começa a piorar e, quando piora, não acontece somente na prática esportiva, acontece também no dia a dia. Você não sente tanto para subir escada, mas incomoda para descer escada, aí começa a doer quando está com a perna cruzada, dormindo, o joelho começa a ficar inchado...", detalha Gregorut.

 

Os sacrifícios do esporte de alto rendimento

O médico Leandro Gregorut indica que uma corrida em ritmo mais lento — comumente chamada de trote — induz uma carga de nove vezes o peso do corpo em cada passada, enquanto uma corrida transmite em até 14 vezes a cada passada. Até movimentos mais corriqueiros, como descer escadas (seis vezes o peso corporal), também podem forçar em demasia as articulações, o que exige cuidados.

"Você começa a sentir uma dorzinha depois que a atividade (física) começou. Ela pode durar depois que acabou a atividade, porque criou uma inflamação e esse processo inflamatório pode durar de 24 horas a 72 horas, de um a três dias. Aí, começa a piorar e, quando piora, não acontece somente na prática esportiva, acontece também no dia a dia. Você não sente tanto para subir escada, mas incomoda para descer escada, aí começa a doer quando está com a perna cruzada, dormindo, o joelho começa a ficar inchado...", detalha Gregorut.

Entre os atletas a situação é ainda mais intensa. "No esporte de alto rendimento, como eu estou dentro há mais de 20 anos, posso falar que não é saúde. Ninguém sai de lá bem". A dura visão do experiente pivô de basquete Vitor Faverani, 36, do São Paulo, pode assustar pela franqueza, mas traduz a realidade de muitos atletas que disputaram — ou ainda disputam — as principais competições nacionais ou internacionais. Não são poucos os casos de ex-jogadores ou ex-competidores que ainda convivem com dores mesmo após um longo período longe da alta performance.

No Novo Basquete Brasil (NBB), principal competição disputada por Faverani com a camisa do Tricolor do Morumbi, foram monitorados 96 jogadores de oito times, entre julho e outubro de 2023. A lesão mais recorrente era no joelho, com 23% deles já tendo sido submetidos a procedimentos cirúrgicos.

Aqueles de gerações mais antigas, que não tinham as melhores condições de tratamento disponíveis e nem a medicina moderna para as cirurgias mais eficientes, às vezes sofrem com limitações até na locomoção e precisaram se afastar de vez dos exercícios — em alguns casos, aposentadorias foram antecipadas pela condição física prejudicada.

Um campeonato de basquete de masters em 2022 foi monitorado pela CBB, com 86 atletas, de 35 a 86 anos. Quase 80% deles já tinham sofrido com dores no joelho, e 28% passaram por cirurgia. "Sou atleta profissional de basquete desde os 13 anos de idade. Tenho nove cirurgias nos joelhos e acho que vou fazer a décima daqui a pouco. Joguei quase 15, 16 anos na Europa, todos os meus tratamentos foram lá, e eles decidiram me aposentar. Faz seis anos. Eu sou teimoso demais e falei para eles que não ia me aposentar", relembra Faverani, que já defendeu o Boston Celtics, da NBA, e o Barcelona-ESP, por exemplo.

Entre trabalhos preventivos, uso de infiltração e tolerância às dores, os atletas de alto rendimento por vezes decidem competir no "sacrifício", sobretudo em momentos decisivos. Foi o que fez o lutador de MMA Júnior Cigano em 2011, quando disputou o cinturão dos pesos-pesados do UFC com o mexicano Cain Velasquez e ganhou por nocaute, recorda o ortopedista e traumatologista Fábio Costa, diretor médico da Comissão Atlética Brasileira de MMA.

Cigano sentiu dores no joelho ainda no vestiário, durante o aquecimento, a dez minutos de subir para a luta. Recorreu ao médico e sentiu firmeza para encarar o mexicano no octógono sem dores, mesmo sendo atingido pelo adversário.

"Eu não podia dar nada para ele, porque a Comissão Atlética de Nevada não permite nenhum tipo de medicação ali. Mas eu tinha uma garrafinha de água, encostei numa mesa, esmaguei uma coisa, fingi que estava colocando remédio para ele e dei a garrafinha. 'Toma, botei morfina aí dentro, você não vai sentir nada'. Ele bebeu aquela água acreditando que aquilo ia melhorar ele. A luta durou um minuto e quatro segundos", relata o médico baiano, orgulhoso.

As privações na vida social também fazem parte da rotina dos atletas, o que inclui alimentação regrada, disciplina no descanso e obediência às recomendações dos profissionais. "Tem que comer direitinho, evitar fritura, gordura, carne saturada, não pode fumar, evitar beber... São as boas recomendações de saúde para você poder praticar aquilo que gosta", diz Leandro Gregorut.

"O maior desafio é você fazer a pessoa entender que o benefício dela vai ser maior se seguir um plano do que fazer da cabeça dela", finaliza o médico. 

A infiltração como opção de tratamento

No esporte de alto rendimento, os atletas convivem com as dores em treinos e jogos e, com o avançar da idade, passam a se cercar de mais cuidados e trabalhos físicos preventivos para conseguir manter o desempenho em bom nível. Por vezes, porém, é necessário recorrer à infiltração, que consiste na aplicação de medicamento em uma região inflamada — em geral, em articulações ou músculos.

O avanço da medicina esportiva proporcionou que a infiltração se tornasse uma medida profilática, e não emergencial, chamada de viscosuplementação. Ou seja, os competidores passaram a fazer tratamentos periódicos com medicações injetáveis, especialmente o ácido hialurônico, o que evita o uso antes de jogos ou torneios importantes para se livrar da dor de maneira momentânea.

A substância, que é uma molécula fabricada pelo corpo humano e por outros animais, ajuda a lubrificar, sustentar e preencher os tecidos, amenizando o desgaste de articulações como joelho e tornozelo. A medida já é recorrente em modalidades como futebol, basquete, MMA e maratonas de corrida, por exemplo.

"A viscosuplementação atua como um amortiguador de impacto, um lubrificante da articulação, como se fosse um óleo numa engrenagem, para que possa funcionar de maneira adequada, sem ter tanto rangido", exemplifica Fábio Krebs.

Os médicos recomendam um intervalo entre as aplicações, seja semestral ou anual, para que o ácido hialurônico surta efeito e evite prejuízos ao corpo dos atletas com eventual uso em demasia. Em geral, o método é utilizado por atletas com osteoartrite ou condromalácia patelar. O período entre a aplicação e o retorno às atividades também exige um hiato de dois a três dias para que não haja reações adversas.

"Eu tive uma experiência que fiz uma infiltração de ácido hialurônico na Espanha e o médico falou, para mim, 48 horas ou 24 horas (para voltar aos treinos), que é o mínimo, para garantir que você já pode fazer o impacto. Eu não obedeci, obviamente — falei que era teimoso —, e fui treinar. Meu joelho inchou, e eles tentavam tirar o líquido do joelho e não conseguiam. Até que eles colocaram uma agulha que parecia uma mangueira e começaram a puxar como se fossem vidrinhos", recorda Vitor Faverani.

Adepta das corridas de rua e aspirante a maratonista, a paulistana Laura Amato, de 48 anos, começou a treinar há oito anos e, diante do ritmo intenso, sentiu as dores da condromalácia patelar. Recorreu a uma consulta médica à procura de soluções e ouviu que teria de parar com a atividade física recém-descoberta. "Eu falei: 'De forma alguma. Comecei agora, descobri aos 40, e vou parar de correr? Não, vou correr'".

Laura procurou outras opiniões médicas até conhecer o tratamento com ácido hialurônico, ao qual deu início em meio ao período de Covid-19, quando sofria com dores intensas. "Há uns dois anos e meio, três, comecei com o tratamento. A primeira aplicação que eu fiz foi fantástica. (Fiquei) sem dor, estava com muita inflamação. Na pandemia, eu não conseguia dormir de tanta dor", contou.

Maior tendência de osteoartrite para mulheres

Os estudos apontam que, em uma escala global, 300 milhões de pessoas são acometidos pela artrose, sendo a doença mais prevalente em pacientes com mais de 60 anos. No recorte geral, 18% das mulheres têm a doença, ao passo que 10% dos homens sofrem com dores nas articulações.

A incidência maior em indivíduos do sexo feminino passa por questões hormonais e formato da bacia, por exemplo, além de também poder ter influência de fatores genéticos e trabalhos pesados.

"Normalmente, a mulher, quando vai envelhecendo, a taxa hormonal vai caindo e, com isso, prejudica a cartilagem, os ligamentos, os tendões e a musculatura. O sistema muscoloesquelético é protegido pelos fatores hormonais femininos", explica Leandro Gregorut.

O período pós-gestação também requer alguns cuidados das novas mamães no retorno aos exercícios em razão das mudanças que ocorrem no organismo antes e depois do parto.

"Quando tem a gestação, acontece um excesso de hormônios, então aumenta a flexibilidade tendínea, flexibilidade ligamentar, tem frouxidão das estruturas, o que favorece depois a ter algum tipo de lesão. Quanto tempo demora para voltar ao normal? Meses e meses. Mas, se você não fizer de uma maneira correta, um realinhamento muscular, fortalecimento, vai dar problema", avisa o médico.

Os especialistas também alertam que, para as mulheres que já praticam atividades físicas, não há problema em dar continuidade durante a gestação, com os devidos cuidados, mas que há uma atenção maior em relação àquelas que querem começar em meio à gravidez.

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