Você é o que você come. Certamente você já ouviu a frase que sintetiza a importância da alimentação na nossa vida. A comida pode tanto ajudar a garantir a sua saúde física como a desencadear sérios problemas. Infelizmente, em um século influenciado por grandes mídias e uma rotina que exige mais praticidade, a má alimentação segue como um desafio global.
Este cenário está relacionado a um conjunto de novos condicionantes, tais como a dimensão ambiental, ideológica, aspectos da demanda mundial, culturais, sociais e questões do mercado de alimentos.
O Relatório Luz 2021, da Agenda 2030, realizado por 57 organizações não governamentais, entidades e fóruns da sociedade civil, aponta que 9% da população brasileira passa fome; outros 11,5% sofrem com insegurança alimentar moderada e 34,7% insegurança leve. Deste percentual, apenas 44,8% dos brasileiros se alimentam bem.
O questionamento que fica é: o que estamos consumindo? Segundo a nutricionista Thaís Almeida, o alimento é o combustível do corpo, sendo ele um dos responsável pela vida. “Os nutrientes dos alimentos são digeridos e absorvidos, transformando-se em energia e material de construção para o corpo (como músculos e células), além de manter o metabolismo regulado. Ou seja, a alimentação é o que a gente come, enquanto a nutrição é o que o corpo faz com esses alimentos”, afirma.
A especialista destaca que os alimentos nutritivos são fundamentais para manter o corpo saudável e prevenir problemas de saúde por darem ao organismo tudo o que ele precisa. “Uma boa alimentação pode não garantir uma nutrição adequada se os alimentos consumidos não forem balanceados ou nutritivos”.
Segundo o Guia Alimentar para População Brasileira, do Ministério da Saúde, é indicado que a alimentação tenha como base alimentos frescos (frutas, carnes, legumes) e minimamente processados (arroz, feijão e frutas secas), além de evitar os ultraprocessados (como macarrão instantâneo, salgadinhos de pacote e refrigerantes).
Apesar da recomendação, de acordo com a pesquisa do Kantar, o mercado de fast food — comida rápida — segue em expansão no cenário nacional, com um aumento de 34% no valor consumido em 2024, em comparação ao mesmo período de 2023. Apesar da alta inflação e dos repasses de preços, esse mercado se consolidou como uma opção prática e conveniente para muitos brasileiros.
Thaís Almeida pontua que comidas industrializadas geralmente vêm cheias de açúcar, sal e gorduras ruins. “O problema é que, além de serem pobres em nutrientes, podem contribuir para ganho de peso, aumento do colesterol, pressão alta, diabetes, doenças do coração, alguns tipos de câncer e desequilíbrios no corpo que afetam nossa energia e bem-estar”, destaca.
Diversas religiões, culturas, tradições e até movimentos sociais apresentam preocupação com alimentação e influenciam a práticas de dietas como fonte de saúde e de autocuidado. Na Índia, por exemplo, existe um sistema tradicional de medicina, com mais de 5.000 anos de história, chamado Ayurveda, onde à alimentação se baseia no equilíbrio entre corpo, mente e espírito.
Os seus princípios incluem a valorização de alimentos sazonais e locais, uma dieta que varia conforme as estações, o consumo de alimentos integrais — sem produtos processados —, além de uma dieta que busca o equilíbrio de sabores, incorporando o doce, azedo, salgado, picante, amargo e adstringente, promovendo saúde e satisfação.
A nutricionista relembra que, infelizmente, a realidade de falta de acesso a alimentos saudáveis causa um grande impacto na saúde das pessoas, aumentando os casos de doenças e criando uma situação de desigualdade, onde as pessoas mais vulneráveis acabam tendo mais acesso a alimentos baratos e pouco nutritivos.
“Hoje em dia, a alimentação é um grande paradoxo. Estamos mais conscientes da importância de comer bem, mas, ao mesmo tempo, o consumo de alimentos ultraprocessados só cresce. A vida corrida e a facilidade de acesso a esses produtos acabam prejudicando a escolha por alimentos mais saudáveis”, finaliza.
O Dia Mundial da Alimentação é comemorado anualmente em 16 de outubro. A data, celebrada pela primeira vez em 1981 com à temática “A comida vem primeiro”, é tida como um momento de reflexão em estratégias que visam melhorar o cenário de desafios alimentares
Henrique Neves é diretor da Rigel, uma empresa cearense especializada no combate a fungos com experiência na indústria alimentícia. Segundo ele, as empresas superam diversos desafios com frequência, mas, para aquelas que atuam no ramo alimentício, um dos obstáculo é com a segurança dos alimentos, garantido pelo Sistema de Gestão da Segurança dos Alimentos (SGSA).
Esse sistema está relacionado à estratégia da empresa, aos processos produtivos, à armazenagem na fábrica e no local de venda, ao transporte, ao tempo de prateleira, a experiência do consumidor em sua casa e à todas as pessoas envolvidas nesses processos.
Além desses cuidados, a empresa utiliza uma abordagem em três etapas que envolvem a avaliação de processos, necessidade de desenvolvimento e/ou implantação de equipamentos e comercialização de conservante antimofo, protegendo os alimentos de microrganismos prejudiciais.
“Nos guiamos por referências nacionais e internacionais de uso dos conservantes. Para isso, utilizamos substâncias amplamente reconhecidas e aprovadas por órgãos reguladores, comuns na indústria alimentícia e considerados totalmente seguros. Nossa estratégia para aplicação saudável está relacionada ao rigor das proporções”, explica Henrique Neve.
Segundo a engenheira agrônoma com PhD em Ciência e Tecnologia de Alimentos, Jacqueline de Oliveira, os conservantes desempenham um papel essencial na segurança alimentar, impedindo a deterioração e o crescimento de microrganismos que poderiam causar intoxicações e perdas de alimentos.
“Em nosso organismo, os conservantes sintéticos são geralmente processados e eliminados sem grandes complicações, desde que consumidos dentro dos limites recomendados pelas agências reguladoras. Contudo, em algumas pessoas sensíveis, o consumo excessivo de certos conservantes pode desencadear reações adversas, como alergias ou desconfortos digestivos”, alerta.
Ela destaca que atualmente existe um crescente interesse pelos conservantes naturais, que tendem a ser mais compatíveis com o organismo. “Esses conservantes, derivados de fontes como plantas e óleos essenciais, possuem propriedades antimicrobianas e antioxidantes, além de oferecem uma alternativa mais natural ao consumidor, sem comprometer a segurança dos alimentos”.
A engenheira agrônoma pontua que para aqueles que procuram uma alternativa de reduzir o consumo de conservantes, o ideal é, além de alimentos caseiros, priorizar alimentos frescos, locais e minimamente processados — como frutas, vegetais e carnes frescas —, em vez de produtos ultraprocessados.
“O mais importante é encontrar um equilíbrio, porque os conservantes têm um papel na segurança alimentar, e não é necessário excluí-los completamente da dieta. O foco deve ser a moderação e a variedade, optando por alimentos mais naturais sempre que possível, sem demonizar os conservantes, necessários em muitos contextos”, ressalta.
Entre 2017 e 2018, as irmãs gêmeas Evellyn Gislene e Evellyn Castro, influenciadas por movimentos sociais veganos e vegetarianos procuraram se aprofundar no assunto. Na época elas tinham 14 anos.
Era uma simples tarde no shopping enquanto comiam um hambúrguer, que as irmãs, influenciadas com tema, se olharam e percebem que aquilo não estava mais fazendo sentido, então decidiram ser vegetarianas. No começo, elas foram tirando gradualmente algumas carnes da dieta, logo, já sentiram a diferença positiva em sua vida.
Hoje, com 21 anos e universitárias, as gêmeas seguem se apoiando. Com o tempo, elas aprimoraram mais ainda seus dotes culinários, cozinhado a sua própria comida a base de soja, legumes e muitos outros vegetais. A atenção com a comida, a melhora na digestão e uma saúde mais nutritiva foram consequências desse novo estilo de vida.
“Com a retirada da proteína, é preciso entender quais os nutrientes que o seu corpo precisa e fazer a substituição correta. Estamos em uma sociedade muito acelerada, onde existe toda uma estrutura que te incentiva a ter uma alimentação com o mesmo fluxo e pouco saudável. É importante entender que precisamos nos alimentar de uma forma mais calma e consciente”, reflete Evellyn Castro.
Para a nutricionista especialista em nutrição vegetariana, Sara Ortins, o veganismo é um modo de viver baseado em um posicionamento ético e político em relação as demais espécies e indivíduos do reino animal, logo, vai muito além do aspecto da alimentação, não utilizando nada derivado de animais.
“Já o vegetarianismo diz respeito somente a alimentação, podendo ser classificado em “vegetarianismo estrito” — que exclui qualquer alimento de origem animal — e “ovolactovegetarianismo”, que elimina carnes, mas ainda consome ovos, leite e derivados. Existem também os “ovovegetarianismo” e o “lactovegetarianismo”, explica.
Ela também ressaltar que é preciso evitar produtos industrializados, especialmente produtos que “imitam” carnes de origem animal, que em sua maioria podem ser tão prejudiciais quanto os produtos de origem animal, por serem ultraprocessados, com muitos aditivos e conservantes.
“Quanto mais natural e diversificada for a alimentação vegetal, mais saudável será. É preciso atentar para o volume da refeição, procurar sempre compor as refeições com os diversos grupos alimentares, consumir sementes, diversificar as receitas, além de uma avaliação nutricional para fazer os ajustes necessários em relação às vitaminas e a quantidades de alimentos nas refeições a partir da individualidade de cada”, aconselha.
Evellyn Gislene relembra que no início é preciso um suporte de apoio, e que além de começa a olhar com muita mais clareza para prato que está comendo, existem alternativas que ajudam a manter a dieta em meio a uma rotina preenchida de responsabilidades.
“Algo que nos ajuda é a preparação do nosso próprio alimento, a montagem de um prato mais balanceado e o restaurante universitário. Outra coisa que prestamos atenção são os produtos vegetarianos disponíveis no mercado, porque alguns deles são super industrializados e vendidos como algo saudável”, relata.
A nutricionista Thaís Almeida ressalta que em quer seguir essas dietas precisa ficar atento a alguns nutrientes, como proteínas, ferro, B12 e ômega-3, para evitar deficiências. Ela enxerga que o segredo está na organização e no planejamento.
“Cada pessoa tem necessidades diferentes de acordo com a idade, estilo de vida, atividade física e saúde. O que funciona para um, pode não ser o ideal para outro. Por isso, é importante personalizar a alimentação para garantir que todas as necessidades nutricionais sejam atendidas”, conclui.
Em nosso Estado, 3,4 milhões de pessoas ainda sofrem de algum grau de insegurança alimentar, conforme as estimativas do último trimestre de 2023 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A pesquisa também estima que essa insegurança está presente em 35,1% dos domicílios cearenses, atingindo 3.455.000 de moradores.
Com essa triste realidade, em 2023 um programa do Governo do Estado surgiu com o intuito de superar esse desafio e focar em ações emergenciais de combate à fome. Denominado Ceará Sem Fome, nesses quase dois anos, o projeto atuou mediante aquisição de alimentos, dinheiro e rede de cozinhas.
São mais de 1.300 cozinhas do programa em funcionamento, bem como por meio dos R$ 300 que é disponibilizado, mensalmente, a mais de 53 mil famílias que atualmente recebem o Cartão Ceará Sem Fome. “Muitas pessoas são beneficiadas e alimentadas através deste projeto”, afirma Maria Ferreira, conhecida como Lia, cozinheira do programa.
Moradora do Conjunto Madre Feitosa, localizado na cidade de Crato, Lia está por trás da preparação das marmitas em sua região há quase um ano. Em seu relato, ela explica que toda alimentação envolvida nesse processo são naturais, não podendo ser nada cru e enlatado.
Além disso, toda combinação do cardápio é aprovada primeiramente por uma nutricionista, e quem trabalha na cozinha precisa seguir algumas regras de higienização, como usar um fardamento adequado e a não utilização de acessórios.
“São mais de 100 marmitas entregues diariamente. Se uma casa tem 10 pessoas, as 10 recebem. Existe uma lista de controle todo final de mês. É uma ação de grande importância e impacto para a nossa comunidade”, reflete Lia. A sua parceira de cozinha, Dedê Freitas, recorda a quantidade de moradores carente e de alta vulnerabilidade que se beneficiam com o programa.
“Se você vê a alegria das pessoas vindo buscar as comidas. Todo dia é um cardápio diferente e uma alimentação balanceada. Muitas pessoas com diversos problemas de saúde estão melhorando só por mudar sua alimentação e ter acesso a ela. Esse trabalho preenche muita coisa dentro de mim”, finaliza.
>>Ponto de vista
Por Gabriel Matos*
O seu nutricionista não é o único que deve se interessar pelo que tem no seu prato; isso também é papel do Estado. Alimentação deve ser objeto de política pública, sim. O Brasil — o “celeiro do mundo”, líder na exportação de soja, milho, café e açúcar, dentre outros — tem, na verdade, que comer muito arroz com feijão para acabar com a fome e a insegurança alimentar que ainda atingem milhões.
Um passo importante para isso foi tomado com o lançamento, no dia 16 de outubro de 2024, do terceiro Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo), juntamente com o inédito Plano Nacional de Abastecimento Alimentar (Planab/Alimento no Prato). Em suma, esses documentos objetivam facilitar a produção e a distribuição de alimentos saudáveis, consolidando esforços em prol da meta de tirar o país do Mapa da Fome até 2026.
Os avanços, contudo, não são obtidos se contarmos somente com a boa vontade dos que têm a caneta à mão. O lançamento do Planapo, por exemplo, chegou a ser adiado em quatro ocasiões diferentes. Se a participação popular é imprescindível à criação de políticas públicas eficazes, cumpre reconhecer a atuação de organizações da sociedade civil, como a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), no sentido de garantir que a alimentação saudável tenha o seu devido espaço no debate público.
E esse debate precisa partir de duas premissas. A primeira: falar de alimentação é falar de saúde pública. O Brasil é o país que mais usa agrotóxicos no mundo, superando o consumo dos Estados Unidos e da China juntos. Não faltam estudos que relacionam esses aditivos químicos a alergias, doenças cardíacas, alterações hormonais e depressão, dentre outras comorbidades. O ditado prevê que “você é o que come”; o nosso adoecimento começa já no café da manhã.
A segunda: alimentação e meio ambiente andam de mãos dadas. Mais de 70% das emissões nacionais de gases de efeito estufa vêm justamente do agronegócio, seja por desmatamento, seja por queimadas. A bancada ruralista do Congresso Nacional transforma tudo que toca em pasto sob o slogan “agro é pop”. Mas quão “pop” é um modelo produtivo que, além de não botar alimento no prato de quem mais precisa, deixa uma pegada ambiental difícil de apagar?
Espera-se que, com o Planapo e do Planab, sejam fortalecidas cadeias produtivas que dispensam venenos; que promovem saúde e segurança nutricional; que fazem um uso sustentável do solo; que prestigiam a agricultura familiar. Isso sim é pop.
*Gabriel Matos é estudante de Jornalismo (UFC), cofundador do projeto de extensão “Cuida, Criatura!”, servidor público municipal e bacharel em Direito (UFC)
Os conservantes em nossa mesa
Henrique Neves é diretor da Rigel, uma empresa cearense especializada no combate a fungos com experiência na indústria alimentícia. Segundo ele, as empresas superam diversos desafios com frequência, mas, para aquelas que atuam no ramo alimentício, um dos obstáculo é com a segurança dos alimentos, garantido pelo Sistema de Gestão da Segurança dos Alimentos (SGSA).
Esse sistema está relacionado à estratégia da empresa, aos processos produtivos, à armazenagem na fábrica e no local de venda, ao transporte, ao tempo de prateleira, a experiência do consumidor em sua casa e à todas as pessoas envolvidas nesses processos.
Além desses cuidados, a empresa utiliza uma abordagem em três etapas que envolvem a avaliação de processos, necessidade de desenvolvimento e/ou implantação de equipamentos e comercialização de conservante antimofo, protegendo os alimentos de microrganismos prejudiciais.
“Nos guiamos por referências nacionais e internacionais de uso dos conservantes. Para isso, utilizamos substâncias amplamente reconhecidas e aprovadas por órgãos reguladores, comuns na indústria alimentícia e considerados totalmente seguros. Nossa estratégia para aplicação saudável está relacionada ao rigor das proporções”, explica Henrique Neve.
Segundo a engenheira agrônoma com PhD em Ciência e Tecnologia de Alimentos, Jacqueline de Oliveira, os conservantes desempenham um papel essencial na segurança alimentar, impedindo a deterioração e o crescimento de microrganismos que poderiam causar intoxicações e perdas de alimentos.
“Em nosso organismo, os conservantes sintéticos são geralmente processados e eliminados sem grandes complicações, desde que consumidos dentro dos limites recomendados pelas agências reguladoras. Contudo, em algumas pessoas sensíveis, o consumo excessivo de certos conservantes pode desencadear reações adversas, como alergias ou desconfortos digestivos”, alerta.
Ela destaca que atualmente existe um crescente interesse pelos conservantes naturais, que tendem a ser mais compatíveis com o organismo. “Esses conservantes, derivados de fontes como plantas e óleos essenciais, possuem propriedades antimicrobianas e antioxidantes, além de oferecem uma alternativa mais natural ao consumidor, sem comprometer a segurança dos alimentos”.
A engenheira agrônoma pontua que para aqueles que procuram uma alternativa de reduzir o consumo de conservantes, o ideal é, além de alimentos caseiros, priorizar alimentos frescos, locais e minimamente processados — como frutas, vegetais e carnes frescas —, em vez de produtos ultraprocessados.
“O mais importante é encontrar um equilíbrio, porque os conservantes têm um papel na segurança alimentar, e não é necessário excluí-los completamente da dieta. O foco deve ser a moderação e a variedade, optando por alimentos mais naturais sempre que possível, sem demonizar os conservantes, necessários em muitos contextos”, ressalta.
Um novo estilo de vida
Entre 2017 e 2018, as irmãs gêmeas Evellyn Gislene e Evellyn Castro, influenciadas por movimentos sociais veganos e vegetarianos procuraram se aprofundar no assunto. Na época elas tinham 14 anos.
Era uma simples tarde no shopping enquanto comiam um hambúrguer, que as irmãs, influenciadas com tema, se olharam e percebem que aquilo não estava mais fazendo sentido, então decidiram ser vegetarianas. No começo, elas foram tirando gradualmente algumas carnes da dieta, logo, já sentiram a diferença positiva em sua vida.
Hoje, com 21 anos e universitárias, as gêmeas seguem se apoiando. Com o tempo, elas aprimoraram mais ainda seus dotes culinários, cozinhado a sua própria comida a base de soja, legumes e muitos outros vegetais. A atenção com a comida, a melhora na digestão e uma saúde mais nutritiva foram consequências desse novo estilo de vida.
“Com a retirada da proteína, é preciso entender quais os nutrientes que o seu corpo precisa e fazer a substituição correta. Estamos em uma sociedade muito acelerada, onde existe toda uma estrutura que te incentiva a ter uma alimentação com o mesmo fluxo e pouco saudável. É importante entender que precisamos nos alimentar de uma forma mais calma e consciente”, reflete Evellyn Castro.
Para a nutricionista especialista em nutrição vegetariana, Sara Ortins, o veganismo é um modo de viver baseado em um posicionamento ético e político em relação as demais espécies e indivíduos do reino animal, logo, vai muito além do aspecto da alimentação, não utilizando nada derivado de animais.
“Já o vegetarianismo diz respeito somente a alimentação, podendo ser classificado em “vegetarianismo estrito” — que exclui qualquer alimento de origem animal — e “ovolactovegetarianismo”, que elimina carnes, mas ainda consome ovos, leite e derivados. Existem também os “ovovegetarianismo” e o “lactovegetarianismo”, explica.
Ela também ressaltar que é preciso evitar produtos industrializados, especialmente produtos que “imitam” carnes de origem animal, que em sua maioria podem ser tão prejudiciais quanto os produtos de origem animal, por serem ultraprocessados, com muitos aditivos e conservantes.
“Quanto mais natural e diversificada for a alimentação vegetal, mais saudável será. É preciso atentar para o volume da refeição, procurar sempre compor as refeições com os diversos grupos alimentares, consumir sementes, diversificar as receitas, além de uma avaliação nutricional para fazer os ajustes necessários em relação às vitaminas e a quantidades de alimentos nas refeições a partir da individualidade de cada”, aconselha.
Evellyn Gislene relembra que no início é preciso um suporte de apoio, e que além de começa a olhar com muita mais clareza para prato que está comendo, existem alternativas que ajudam a manter a dieta em meio a uma rotina preenchida de responsabilidades.
“Algo que nos ajuda é a preparação do nosso próprio alimento, a montagem de um prato mais balanceado e o restaurante universitário. Outra coisa que prestamos atenção são os produtos vegetarianos disponíveis no mercado, porque alguns deles são super industrializados e vendidos como algo saudável”, relata.
A nutricionista Thaís Almeida ressalta que em quer seguir essas dietas precisa ficar atento a alguns nutrientes, como proteínas, ferro, B12 e ômega-3, para evitar deficiências. Ela enxerga que o segredo está na organização e no planejamento.
“Cada pessoa tem necessidades diferentes de acordo com a idade, estilo de vida, atividade física e saúde. O que funciona para um, pode não ser o ideal para outro. Por isso, é importante personalizar a alimentação para garantir que todas as necessidades nutricionais sejam atendidas”, conclui.
Ceará sem fome
Em nosso estado, 3,4 milhões de pessoas ainda sofrem de algum grau de insegurança alimentar, conforme as estimativas do último trimestre de 2023 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A pesquisa também estima que essa insegurança está presente em 35,1% dos domicílios cearenses, atingindo 3.455.000 de moradores.
Com essa triste realidade, em 2023 um programa do Governo do Estado surgiu com o intuito de superar esse desafio e focar em ações emergenciais de combate à fome no estado. Denominado Ceará Sem Fome, nesses quase dois anos, o projeto atuou mediante aquisição de alimentos, dinheiro e rede de cozinhas.
São mais de 1.300 cozinhas do programa em funcionamento, bem como por meio dos R$ 300 que é disponibilizado, mensalmente, a mais de 53 mil famílias que atualmente recebem o Cartão Ceará Sem Fome. “Muitas pessoas são beneficiadas e alimentadas através deste projeto”, afirma Maria Ferreira, conhecida como Lia, cozinheira do programa.
Moradora do Conjunto Madre Feitosa, localizado na cidade de Crato, Lia está por trás da preparação das marmitas em sua região há quase um ano. Em seu relato, ela explica que toda alimentação envolvida nesse processo são naturais, não podendo ser nada cru e enlatado.
Além disso, toda combinação do cardápio é aprovada primeiramente por uma nutricionista, e quem trabalha na cozinha precisa seguir algumas regras de higienização, como usar um fardamento adequado e a não utilização de acessórios.
“São mais de 100 marmitas entregues diariamente. Se uma casa tem 10 pessoas, as 10 recebem. Existe uma lista de controle todo final de mês. É uma ação de grande importância e impacto para a nossa comunidade”, reflete Lia. A sua parceira de cozinha, Dedê Freitas, recorda a quantidade de moradores carente e de alta vulnerabilidade que se beneficiam com o programa.
“Se você vê a alegria das pessoas vindo buscar as comidas. Todo dia é um cardápio diferente e uma alimentação balanceada. Muitas pessoas com diversos problemas de saúde estão melhorando só por mudar sua alimentação e ter acesso a ela. Esse trabalho preenche muita coisa dentro de mim”, finaliza.
Agroecologia é pop
O seu nutricionista não é o único que deve se interessar pelo que tem no seu prato; isso também é papel do Estado. Alimentação deve ser objeto de política pública, sim. O Brasil — o “celeiro do mundo”, líder na exportação de soja, milho, café e açúcar, dentre outros — tem, na verdade, que comer muito arroz com feijão para acabar com a fome e a insegurança alimentar que ainda atingem milhões.
Um passo importante para isso foi tomado com o lançamento, no dia 16 do último mês, do terceiro Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo), juntamente com o inédito Plano Nacional de Abastecimento Alimentar (Planab/Alimento no Prato). Em suma, esses documentos objetivam facilitar a produção e a distribuição de alimentos saudáveis, consolidando esforços em prol da meta de tirar o país do Mapa da Fome até 2026.
Os avanços, contudo, não são obtidos se contarmos somente com a boa vontade dos que têm a caneta à mão. O lançamento do Planapo, por exemplo, chegou a ser adiado em quatro ocasiões diferentes. Se a participação popular é imprescindível à criação de políticas públicas eficazes, cumpre reconhecer a atuação de organizações da sociedade civil, como a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), no sentido de garantir que a alimentação saudável tenha o seu devido espaço no debate público.
E esse debate precisa partir de duas premissas. A primeira: falar de alimentação é falar de saúde pública. O Brasil é o país que mais usa agrotóxicos no mundo, superando o consumo dos Estados Unidos e da China juntos. Não faltam estudos que relacionam esses aditivos químicos a alergias, doenças cardíacas, alterações hormonais e depressão, dentre outras comorbidades. O ditado prevê que “você é o que come”; o nosso adoecimento começa já no café da manhã.
A segunda: alimentação e meio ambiente andam de mãos dadas. Mais de 70% das emissões nacionais de gases de efeito estufa vêm justamente do agronegócio, seja por desmatamento, seja por queimadas. A bancada ruralista do Congresso Nacional transforma tudo que toca em pasto sob o slogan “agro é pop”. Mas quão “pop” é um modelo produtivo que, além de não botar alimento no prato de quem mais precisa, deixa uma pegada ambiental difícil de apagar?
Espera-se que, com o Planapo e do Planab, sejam fortalecidas cadeias produtivas que dispensam venenos; que promovem saúde e segurança nutricional; que fazem um uso sustentável do solo; que prestigiam a agricultura familiar. Isso sim é pop.
Gabriel Matos
Estudante de Jornalismo (UFC) e cofundador do projeto de extensão “Cuida, Criatura!”.
Servidor público municipal e bacharel em Direito (UFC).