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Menopausa com qualidade de vida
Ciência e Saúde

Menopausa com qualidade de vida

A nova era das terapias hormonais e suplementações tem proporcionado qualidade de vida a mulheres que sofriam com os piores sintomas da menopausa
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Certa vez, uma amiga me contou que foi pegar a chave do carro e trouxe o liquidificador. Como assim? Enlouqueceu? Outra amiga derramou suco na mesa e, por rápidos instantes, tentou dar “ctrl+c, ctrl+v”, como se estivesse no computador. E uma terceira, enquanto dirigia olhando para o sinal verde, seguiu normalmente o fluxo do trânsito, mas depois se perguntou: será que o sinal estava mesmo verde?

Não se preocupem, todas estão bem; mas esses são relatos de mulheres que já passaram dos 50 anos e que demoraram a entender que não estavam em nenhum processo demencial, ainda que tivessem, em alguns momentos, uma espécie de “névoa mental”. Na época, não foi feito nenhum diagnóstico, mas hoje sabemos que esse pode ser apenas um dos vários sintomas da menopausa: um conjunto de pequenas confusões que acontecem nessa fase, bem como ondas de calor, insônia, irritabilidade, perda de libido e vários outros tipos de mal-estar, muitas vezes confundidos com doenças de outra natureza.

Os desconfortos variam de acordo com as características e o estilo de vida de cada pessoa; porém, o fim dos ciclos menstruais e da capacidade reprodutiva feminina é marcado por mudanças hormonais que podem causar incômodos significativos. A boa notícia: há tratamento, e atualmente não é mais preciso sofrer calada.

A menopausa é dividida em três etapas (ver quadro); a última é quando a menstruação ocorreu há 12 meses. Essa é uma fase que pode ocorrer antes do período previsto, dependendo da situação de saúde da mulher, mas normalmente ela acontece entre os 45 e os 55 anos de idade - porém, hoje é possível tratar isso sem grandes problemas.

A médica ginecologista Khatiane Lustosa fala da libertação provocada pela evolução da ciência e das terapias hormonais. Diferente do que se pensava na década de 1990, quando eram ressaltados os riscos de tais procedimentos, atualmente os benefícios desses tratamentos para um envelhecimento saudável são comprovados .

“Os tratamentos e os estudos avançaram, tanto na dose e na vinculação do hormônio para fins terapêuticos, quanto na idade-alvo das pacientes. No passado isso era muito cruel e, na verdade, queremos quebrar esse ciclo de violência”, reforça a médica.

Infelizmente, esse tipo de tratamento não pode ser aplicado a todas as mulheres. No grupo das mulheres saudáveis (sem histórico de câncer, problemas hepáticos, AVC e outras questões), o tratamento com hormônio é o mais recomendado; já as mulheres com alguma comorbidade precisam caprichar em alimentação, suplementação, vitaminas e atividade física.

Com o avanço das pesquisas, foram criadas suplementações, vitaminas e indicações de mudanças no estilo de vida, que podem melhorar bastante os desconfortos. Khatiane Lustosa reforça a necessidade de explicação para se quebrar os tabus referentes à realização de terapias corretas. “O que acontece é que perdemos hormônios muito precocemente em relação ao homem”.

Existem indicações distintas, dependendo da idade das pacientes e do estágio da menopausa. No período da perimenopausa (que antecede a parada da menstruação), com o tratamento correto, a especialista destaca que é possível reduzir os fogachos (as conhecidas “ondas de calor”), a osteoporose, doenças cardiovasculares e demência. As linhas de tratamento são amplas, incluindo até antidepressivos, dependendo do caso.

A médica alerta para os cuidados na escolha dos profissionais e das suplementações. “As suplementações de vitaminas, antioxidantes e fibras naturais não têm benefício robusto. Às vezes, podem ter um efeito placebo, melhorando os sintomas quando pode haver, de fato, uma deficiência”. Na sua avaliação, os problemas passam a existir quando hormônios são consumidos corriqueiramente (como se fossem apenas suplementações) e quando há dosagens incorretas.

As terapias hormonais, no caso da menopausa, envolvem a reposição de estrogênio e progesterona, hormônios que diminuem durante essa fase da vida. A agência reguladora dos Estados Unidos (FDA) aprovou vários protocolos de terapia hormonal que aliviam não apenas os calores, mas também as síndromes geniturinárias, responsáveis por secura vaginal e dores durante o sexo.

Alguns tipos de terapia hormonal podem ser administrados através de comprimidos, adesivos, géis, cremes, sprays ou anéis vaginais. O impacto desses tratamentos tem sido bastante positivo, permitindo um envelhecimento com melhor qualidade de vida.

Apesar de todos os avanços, o assunto “menopausa” ainda está envolto em tabus. Embora muitas artistas (Cláudia Raia, Angélica, Fernanda Lima) tenham passado a dar depoimentos em podcasts sobre como estão atravessando esse processo, não foi fácil encontrar mulheres em Fortaleza que quisessem dar seu próprio depoimento. Nesta reportagem, tivemos o apoio de três jornalistas e de uma assistente social que contribuíram ao contar suas histórias, além de profissionais renomados da área da saúde.
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Alimentos são aliados contra desconfortos

A nutricionista Raquel Saratt destaca a importância de se observar os sintomas da menopausa desde o início. Na perimenopausa ocorrem normalmente os maiores desconfortos, com uma grande oscilação hormonal, embora a mulher continue menstruando e podendo ainda engravidar.

“Isso pode acontecer no final dos 30 anos, no início dos 40 e pode perdurar por até 10 anos, até que seja definitivamente declarada a menopausa”, afirma ela. Esse também é o período mais oportuno para começar uma terapia de reposição hormonal, desde que seja orientada por um médico.

A nutricionista ressalta que, independente da mulher fazer a terapia de reposição hormonal ou não, a alimentação é fundamental nesse processo para a melhoria da qualidade de vida e a redução dos sintomas.

Para atravessar esse período, ela destaca o consumo de proteínas magras, fracionadas ao longo do dia, bem como a ingestão de fibras e de gorduras poliinsaturadas (presentes em óleos vegetais, sementes, castanhas e peixes como salmão, sardinha e atum), além do baixo uso de alimentos ricos em açúcar, sódio e gorduras saturadas. “Isso ocorre muito com alimentos processados e ultraprocessados, que possuem aditivos, corantes, conservantes e estabilizantes”, detalha.

No rol de alimentos que podem ajudar as mulheres a atravessar esse período, estão os ricos em fitoestrógenos, contribuindo na redução dos sintomas da menopausa. “Esses alimentos possuem compostos semelhantes ao estrogênio, que é o hormônio feminino. Eles melhoram alguns sintomas, como os calorões, e estão na soja e em seus derivados (grãos, leite, iogurte, tofu). Também pode ser utilizado o inhame na preparação de purês, sopas, cozidos e até sucos, além de outros tubérculos e legumes”, reforça.

Raquel aconselha a inclusão da linhaça nos pratos do dia a dia. “Ela pode ser adicionada em grãos ou como farinha, consumida junto a shakes proteicos, iogurtes, fruta e outros grãos integrais de modo geral”. Vale lembrar que a boa ingestão de alimentos, além de aliviar os desconfortos, é imprescindível para uma boa saúde óssea e cardiovascular.

Com relação à suplementação, a especialista ressalta a necessidade de ouvir a queixa de cada paciente, além da realização de exames laboratoriais para uma melhor avaliação. “As prescrições são individualizadas, não é interessante sair comprando suplementos porque você leu ou viu. Ela tem que ser orientada, até para a pessoa saber quais são os horários ideais para a sua utilização e a sua dosagem”, alerta ela.

As questões individuais e subjetivas de cada pessoa devem ser consideradas, mas Raquel destaca algumas questões comuns normalmente utilizadas nas suas prescrições, como o uso de suplementação de cálcio e de vitamina D, dependendo da situação da paciente; uma boa alimentação para a manutenção da saúde óssea; e a prevenção da osteoporose.

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Crise na sexualidade feminina

Um dos sintomas presentes na menopausa é a perda de libido, questão que atrapalha muitos relacionamentos. O desconhecimento e a falta de diálogo aberto entre os casais faz com que essa jornada se transforme em um processo solitário e mais doloroso.

A psicóloga e sexóloga Zenilce Bruno coloca essa fase como um dos momentos mais difíceis da sexualidade feminina. “Conhecemos inicialmente o ideal de sexualidade, o casamento e a maternidade. Quando chega a menopausa, há um baque muito rápido:
em um ano você se transforma em outra pessoa, pois mudamos fisicamente por conta da queda dos hormônios. Há também dificuldade em se manter o desejo de uma vida sexual ativa. Com a elevação do cansaço, a irritação e as alterações no sono, o desejo acaba diminuindo, e o contato sexual é dificultado pela redução da lubrificação vaginal”, acrescenta.

A reposição hormonal ajuda na superação desses problemas, mas nem todas as mulheres podem se beneficiar desse tipo de indicação médica. Além do momento fisiológico, há também questões sociais: esse é um momento em que várias mulheres estão se aposentando; algumas começam a ser avós e outras estão se preparando para esse momento.

Diante disso, Zenilce lembra que o desejo não envolve apenas beleza, mas também a intensidade da interação entre as pessoas. “Nós desejamos os indivíduos que nos agradam com o contato com o seu corpo e com a sua alma. Nessa faixa etária, porém, as pessoas disponíveis diminuem e isso influencia o desejo da mulher”, destaca.

Apesar de todas essas condições, Zenilce lembra que, quando há o amor, o desejo aumenta. “Até nos relacionamentos antigos isso acontece; às vezes, o relacionamento ganha uma nova roupagem”. A psicóloga reforça que é necessário ter alguém a desejar e que a mulher também conheça o próprio corpo.


Renascimento através da causa

A jornalista Silvia Ruiz, 54, foi uma das primeiras a levantar, em nível nacional, a bandeira da discussão sobre a menopausa. A repórter da área de saúde, acostumada a falar sobre vários tipos de doenças, se assustou quando percebeu os primeiros sintomas, que apareceram entre 47 e 48 anos. Primeiro veio o cansaço, depois uma certa confusão mental.

O diagnóstico da médica sobre os sintomas associados à menopausa proporcionaram a ela um alívio e, a partir da reposição hormonal, os incômodos foram melhorando. Com um diagnóstico rápido e cuidados com alimentação, suplementos, atividade física e sono regular, Sílvia estabeleceu seu projeto para um envelhecimento saudável. “Pensar em envelhecer com saúde é um privilégio”, reforça.

Ela conta que o diagnóstico abriu um novo portal na sua vida. “Foi um renascimento, com delícias e dores, mas não é fácil; é como uma gravidez e a adolescência: não é fácil”, acrescenta. Diante do diagnóstico, cuidados e interesse pelo tema, Sílvia se aventurou em um novo negócio e lançou sua marca de suplementos.

Infelizmente, uma grande quantidade de mulheres ainda não sabe o que fazer a partir dos sintomas. “A quantidade de mulheres que faz reposição hormonal é muito baixa. Atualmente, as mulheres procuram o botox, reclamam dos estereótipos de que têm de cortar o cabelo curto, mas acabam tendo de vir com um arsenal para enfrentar os sintomas da menopausa”, desabafa.

Somente mais recentemente há um movimento global para discutir a menopausa. Mesmo assim, Sílvia lembra que muitas mulheres não falam sobre os sintomas para os maridos porque pode não pegar bem. “As mulheres ainda são cobradas para ser sexies, gostosas, prontas para o sexo. Essas questões ainda são tabu; até na área médica ainda há pouca receptividade em relação aos incômodos das mulheres. Muitos profissionais da saúde, quando escutam as mulheres sobre os sintomas, encaminham-nas para o psiquiatra ou para o ortopedista. Ainda estamos muito mal assistidas”, reclama.
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Cuidados e busca por informação

A assistente social Germana de Araújo Gomes Cabral, também estudante de Psicologia, começou a procurar entender o processo de menopausa aos 39 anos; mas, entre 42 e 43 anos (período em que muitas mulheres entram na perimenopausa), ela tentou antecipar os cuidados em função de uma TPM mais forte que ela sentiu. Infelizmente, foi prontamente desencorajada com o seguinte discurso: “Você está muito nova; não é hora de você pensar nisso”.

A partir desse momento, Germana passou a pesquisar sozinha sobre o assunto; depois, com a ajuda de amigas e de um grupo de leitura. A partir de então, com o acompanhamento de uma nutricionista, ela vem mantendo uma prática de atividades físicas e de alimentação que ajuda a superar algumas questões neste período.

Ela também passou a ler alguns livros - entre eles, “O Cérebro e a Menopausa”, da neurocientista e escritora ítalo-americana Lisa Mosconi - e a acompanhar alguns podcasts sobre o tema. Germana lamenta que muitos profissionais de saúde não estejam atentos para isso e que, em muitos casos, receitem psicofármacos sem entender as causas fisiológicas do problema.

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Confronto com o processo de envelhecimento

A jornalista Maísa Vasconcelos, 60, conta que o período da menopausa chegou em um período de muitas mudanças na sua vida: após o nascimento do primeiro neto, os dois filhos acabaram indo morar em outros estados, e a sensação era a do famoso “ninho vazio”.

Dentro desse contexto, a falta da menstruação demorou a ser entendida por ela. Os sintomas vinham, mas não havia uma compreensão racional. “Às vezes ocorriam os suores, uma tristeza, uma ansiedade, a insônia, queda de cabelo, falta de concentração, mas não associava tudo isso à menopausa”, relembra.

Todos esses movimentos ocorreram em um intervalo de cerca de 10 anos. Somente com o agravamento dos sintomas é que Maísa foi procurar uma terapia hormonal, embora as amigas preferissem uma reposição natural. “Eu fui pela ciência”, destaca ela.

Na avaliação de Maísa, nós, mulheres, somos sempre cobradas em relação ao envelhecimento. “Hoje, felizmente, há mais espaços para falar, mas percebo também uma romantização desse processo. Todos os dias somos confrontadas com a exigência por esconder nosso processo de envelhecimento”.

Para a jornalista Ana Márcia Diógenes, a menopausa veio de uma forma diferente. Aos 49 anos, ela teve de fazer uma histerectomia (retirada do útero), fato que, na sua avaliação, fez com que a menopausa passasse de forma mais rápida.

“Demorei um tempinho para aceitar fazer a reposição porque eu tinha receio, porque existe um tabu, principalmente em relação ao câncer de mama; mas hoje eu acho a reposição muito mais segura do que era no passado”, relata.

Ana Márcia lamenta o fato de muitas mulheres ainda sentirem vergonha de falar sobre o assunto. “Eu acho que, quanto mais a gente fala e desmistifica o tema, mais normalizamos a realidade, e até os homens poderão também assumir as questões de cuidar das suas próstatas”.

Para conviver bem com a menopausa


O que é a menopausa

Marca o fim do período reprodutivo feminino

Sintomas

Vermelhidão no rosto

Suores

Palpitações no coração

Vertigens

Cansaço muscular

Dificuldade para esvaziar a bexiga

Dor

Perda de urina

Infecções urinárias e ginecológicas

Ressecamento vaginal


Fases da menopausa

Perimenopausa - antecede a parada da menstruação e dura vários anos. É caracterizada por alterações hormonais (diminuição dos níveis de estrogênio e progesterona).

Menopausa - é a fase em que ocorre a última menstruação. No caso das mulheres brasileiras, o período em que ocorre esse ciclo é geralmente entre 48 e 49 anos.

Pós-menopausa - tem início após a última menstruação. Nesse período há uma redução de vários sintomas da menopausa (ondas de calor, por exemplo).


Cuidados

Não minimize os sintomas
Mantenha consultas médicas regulares
Ajuste sua alimentação: uma dieta balanceada rica em cálcio e vitamina D pode ajudar a melhorar problemas de pele e dentários
Pratique atividades físicas: a prática de atividade física regular ajuda na saúde do coração e no alívio do “nevoeiro mental”

Alimentos indicados

Soja
Inhame
Linhaça
Vegetais verdes com tons escuros (espinafre, rúcula, agrião)
Frutas roxas ou vermelhas (morangos, tomate, mirtilo, açaí, acerola)
Grãos integrais
Leguminosas e oleaginosas
Amêndoas


Suplementação

Vitamina D
Vitaminas do complexo B
Cálcio
Magnésio
Ômega 3
Creatina
EPA e DHA

Fonte: Raquel Saratt

Obs.: o uso desses suplementos deve ser feito com orientação médica, dependendo de cada situação e com a devida prescrição de dosagem e periodicidade


Alimentos que pioram os sintomas

Café
Bebidas alcoólicas
Alimentos ultraprocessados

 

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