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Tadala, hormônios e o caminho perigoso para se tornar um homem-alfa
Ciência e Saúde

Tadala, hormônios e o caminho perigoso para se tornar um homem-alfa

Na busca pela masculinidade "alfa" cada vez mais homens são atraídos para um caminho que mistura testosterona, drogas como pré-treino, redes sociais e o discurso red pill. Mas quais os riscos escondidos por trás dessa transformação?
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Valmar trabalha com divulgação de promoções em farmácias no interior da Bahia e viralizou nas redes sociais com um vídeo em que faz publicidade da Tadalafila (Foto: Reprodução / Instagram)
Foto: Reprodução / Instagram Valmar trabalha com divulgação de promoções em farmácias no interior da Bahia e viralizou nas redes sociais com um vídeo em que faz publicidade da Tadalafila

Quem passa em frente às farmácias de Salvador já deve ter se deparado com a locução animada que anuncia em ritmo de pagodão: "O citrato é passado, na farmácia formou fila, todo mundo quer comprar o tal da tadalafila".

Os versos amplificados são de Valmar Tadala, locutor e influenciador digital que soma quase 70 mil seguidores nas redes sociais. Ele ficou conhecido por promover o medicamento Tadalafila, um fármaco usado para tratar dificuldades de ereção.

Similar ao viagra, mas com efeitos mais duradouros, não há problema algum em usar esse medicamento, desde que sob orientação profissional. O problema, reconhecido inclusive pelo Conselho Federal de Farmácia, é o uso da tadalafila como parte da rotina de pré-treino de muitos homens Brasil afora.

Além do uso indiscriminado do medicamento, homens também estão aplicando doses de testosterona regularmente, geralmente visando a aumentar a massa muscular. Nesse engodo, médicos autodenominados "hormonologistas", "moduladores" ou "especialistas em anti-aging" (áreas não reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina) têm usado as redes sociais para promover a testosterona como cura milagrosa para diversos problemas, desde cansaço a dificuldades de relacionamento.

Disfarçada de autocuidado, a prática é perigosa e pode causar danos sérios à saúde. Além disso, envolve práticas predatórias de marketing digital e o mundo misógino dos influenciadores “red pill”. A lógica por trás do uso do medicamento antes do treino está na sua capacidade de relaxar o endotélio, a camada que reveste internamente as artérias. Em teoria, isso facilitaria o fluxo sanguíneo para os músculos, promovendo um crescimento mais acelerado.

No entanto, o medicamento não foi desenvolvido para essa finalidade, e especialistas alertam sobre os riscos de buscar atalhos no desempenho físico sem acompanhamento profissional. "Medicamentos, incluindo a tadalafila, não devem ser tratados de forma leviana. Seu uso deve seguir rigorosamente as indicações médicas, evitando práticas que possam comprometer a saúde pública. A combinação de exercícios físicos com o uso irresponsável de fármacos é potencialmente prejudicial à sociedade", ressalta Fátima Aragão, membro do Conselho Federal de Farmácia (CFF).

Assim como qualquer outro medicamento, o uso indiscriminado da tadalafila pode causar efeitos adversos e interagir perigosamente com outras substâncias. Entre os efeitos colaterais mais comuns estão dor de cabeça, indigestão, dores nas costas, rubor facial, congestão nasal e desconforto muscular. Em casos raros, pode levar a alterações na visão, audição ou ritmo cardíaco.

Mesmo com esses alertas, a substância tem sido cada vez mais adotada por jovens como um reforço para a academia e a vida sexual. Leonardo*, 27, usa a tadalafila pelo menos cinco vezes por semana — tanto antes dos treinos quanto das relações sexuais.

Ele começou em 2024, após assistir a recomendações em um canal do YouTube sobre estilo de vida fitness. "Além do ficar muito mais evidente, a gente cansa menos. Às vezes sinto dor de cabeça, mas quando chego em casa ainda tenho disposição para namorar. Sinto que meu desempenho fica muito melhor com a Tadala", conta.

Fátima Aragão reforça que a tadalafila deve ser usada apenas com prescrição médica, seguindo rigorosamente as orientações sobre dosagem e administração. “É fundamental lembrar que a tadalafila não é indicada para todos os homens, especialmente aqueles com problemas cardíacos ou que fazem uso de medicamentos à base de nitratos”, alerta.

Mais recentemente, o medicamento ganhou uma nova apresentação: além dos comprimidos, passou a ser comercializado na forma de balas de goma. A novidade ganhou repercussão no final de março de 2025, após o influenciador Jon Vlogs anunciar o lançamento da "Metbala", divulgada como "a primeira gummy de tadalafila do Brasil".

O vídeo promocional do produto acumulou 146 mil curtidas antes de ser apagado da página do criador de conteúdo, que soma 10,4 milhões de seguidores na rede social. Em meio as polêmicas, Jon Vlogs pode ter chamado atenção de um público inesperado: os técnicos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O órgão agora investiga se a venda do medicamento em formato de doce pode ser enquadrada como crime contra a saúde pública.

Quinto medicamento genérico mais vendido do Brasil em 2024, a tadalafila foi além das prateleiras das farmácias e chegou a ser comercializada até em versões de bala de goma flavorizada. Mas seu impacto não se limita apenas ao comércio: o fármaco se tornou um fenômeno cultural.

Com uma estética moderna e voltada para o público jovem, a tadalafila virou referência em músicas que vão do piseiro ao funk. No YouTube, o videoclipe de "Tadalafila", dos Barões da Pisadinha, já ultrapassa 625 mil visualizações.

Além da música, o medicamento também ganhou popularidade entre frequentadores de academias, que o utilizam como um, não comprovado, auxiliar no ganho muscular. Especialistas ouvidos pelo O POVO+ não conseguem determinar se o hype na cultura pop impulsionou o consumo da tadalafila ou se foi o aumento do uso que inspirou a sua presença na música.

A lógica por trás do uso do medicamento antes do treino está na sua capacidade de relaxar o endotélio, a camada que reveste internamente as artérias. Em teoria, isso facilitaria o fluxo sanguíneo para os músculos, promovendo um crescimento mais acelerado.

No entanto, o medicamento não foi desenvolvido para essa finalidade, e especialistas alertam sobre os riscos de buscar atalhos no desempenho físico sem acompanhamento profissional. "Medicamentos, incluindo a tadalafila, não devem ser tratados de forma leviana. Seu uso deve seguir rigorosamente as indicações médicas, evitando práticas que possam comprometer a saúde pública. A combinação de exercícios físicos com o uso irresponsável de fármacos é potencialmente prejudicial à sociedade", ressalta Fátima Aragão, membro do Conselho Federal de Farmácia (CFF).

Assim como qualquer outro medicamento, o uso indiscriminado da tadalafila pode causar efeitos adversos e interagir perigosamente com outras substâncias. Entre os efeitos colaterais mais comuns estão dor de cabeça, indigestão, dores nas costas, rubor facial, congestão nasal e desconforto muscular. Em casos raros, pode levar a alterações na visão, audição ou ritmo cardíaco.

Mesmo com esses alertas, a substância tem sido cada vez mais adotada por jovens como um reforço para a academia e a vida sexual. Leonardo*, 27, usa a tadalafila pelo menos cinco vezes por semana — tanto antes dos treinos quanto das relações sexuais.

Ele começou em 2024, após assistir a recomendações em um canal do YouTube sobre estilo de vida fitness. Fátima Aragão reforça que a tadalafila deve ser usada apenas com prescrição médica, seguindo rigorosamente as orientações sobre dosagem e administração.

“É fundamental lembrar que a tadalafila não é indicada para todos os homens, especialmente aqueles com problemas cardíacos ou que fazem uso de medicamentos à base de nitratos”, alerta.

Mais recentemente, o medicamento ganhou uma nova apresentação: além dos comprimidos, passou a ser comercializado na forma de balas de goma. A novidade ganhou repercussão no final de março de 2025, após o influenciador Jon Vlogs anunciar o lançamento da "Metbala", divulgada como "a primeira gummy de tadalafila do Brasil".

O vídeo promocional do produto acumulou 146 mil curtidas antes de ser apagado da página do criador de conteúdo, que soma 10,4 milhões de seguidores na rede social. Em meio as polêmicas, Jon Vlogs pode ter chamado atenção de um público inesperado: os técnicos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O órgão agora investiga se a venda do medicamento em formato de doce pode ser enquadrada como crime contra a saúde pública.

 

 

Testosterona turbo: o culto ao corpo

Para quem acompanha o mundo das séries, o fenômeno "Adolescência", da Netflix, tem dominado os feeds desde seu lançamento, em meados de março de 2025.

A minissérie aborda, entre outras questões, o crescimento da visibilidade de grupos masculinistas, que alegam sofrer desvantagens devido a um suposto "tratamento preferencial às mulheres" na sociedade atual.

Esses discursos frequentemente expressam desprezo, oposição ou afastamento em relação às mulheres e são estruturados em narrativas que reforçam a ideia de uma crise da masculinidade.

Movimentos como o red pill (associado a coaches de masculinidade), o MGTOW (sigla em inglês para "homens seguindo seu próprio caminho") e os incels (comunidades de "celibatários involuntários") se expandiram na última década, especialmente em fóruns anônimos da internet, como os conhecidos "chans". Nos últimos anos, o movimento se tornou parte de uma indústria lucrativa que monetiza livros, cursos, palestras e conteúdos digitais.

Apresentando-se como guias da masculinidade em meio a profundas transformações sociais, econômicas e tecnológicas — incluindo mudanças nos relacionamentos —, muitos desses influenciadores defendem uma postura masculina reativa e a restauração de uma sociedade centrada no protagonismo dos homens.

Uma das principais causas alardeadas por esses grupos para justificar essa "crise da masculinidade" seria a queda nos níveis de testosterona nas novas gerações. Segundo essa visão, a falta de energia, a redução do apetite sexual e a "passividade" diante do mundo seriam sinais de uma masculinidade enfraquecida, que precisaria ser resgatada.

Para quase qualquer problema — mesmo que inventado —, uma busca rápida nas redes sociais leva a uma solução aparentemente simples: uma injeção, uma cápsula ou, principalmente, um implante hormonal, e voilà, os sintomas desaparecem.

No centro desse discurso reducionista, a testosterona ocupa um lugar de destaque. E, mesmo sem respaldo científico para as indicações, a adesão cresce rapidamente. Mas o uso descontrolado do hormônio, sem prescrição médica e em doses inadequadas, pode trazer sérios riscos à saúde.

Pressão por uma imagem idealizada

Não há dúvidas entre os especialistas de que a testosterona pode, de fato, proporcionar uma sensação de bem-estar, mesmo quando utilizada de maneira inadequada. Lucas*, 25, compartilha sua experiência com a testosterona em um fórum anônimo voltado para entusiastas da masculinidade "alfa".

"Eu comecei a usar as injeções porque queria mais que só um corpo musculoso. Queria ser o cara — o tipo de homem que as pessoas respeitam, que as mulheres desejam e os outros homens invejam", conta.

A pressão para se tornar essa figura idealizada, cercada de status e força, veio de conversas e vídeos nas redes sociais, onde influenciadores red pill exaltam a busca pela "masculinidade verdadeira".

"Eu vi vários caras falando sobre o quanto o uso de testosterona e outros 'truques' biológicos ajudavam a alcançar o topo. A mensagem é clara: se você não está investindo na sua virilidade, no seu corpo e no seu desempenho, você está perdendo a guerra", explica Lucas.

Ele acredita que, ao seguir esse caminho, está moldando seu corpo e sua mentalidade para se tornar um "homem alfa de valor", uma expressão constantemente repetida pelos gurus de masculinidade nas redes sociais.

De clique em clique, a saúde vai pro ralo

De balas de goma de colágeno, passando por shakes, chás, cápsulas fitoterápicas até injeções de hormônio. O universo virtual está abarrotado de conteúdos maliciosos que induzem os usuários a procurarem medicamentos e outras substâncias que prometem resultados milagrosos.

Além dos conteúdos que incentivam a hipermasculinidade, influenciadores anunciam produtos dos mais diversos, prometendo uma vida mais saudável. Nesse contexto estão alguns médicos que acumulam milhões de seguidores. Na era do marketing digital, isso não seria um problema se não fosse o próprio Código de Ética Médica.

Segundo o Artigo 13 da Resolução 1.974/11, "é vedada a publicação nas mídias sociais de autorretrato (selfie), imagens e/ou áudios que caracterizem sensacionalismo, autopromoção ou concorrência desleal". A regra parece ser difícil de seguir já que, muitas vezes, são os resultados que viralizam.

Para quem faz a reposição de testorenona, o ganho muscular é visível e a libido dispara — efeitos que, à primeira vista, parecem vantajosos. Mas o problema não está nos resultados imediatos e, sim, no custo que eles cobram com o tempo.

"Pesquisas indicam que usuários de anabolizantes em excesso têm um risco de morte quase três vezes maior em comparação com aqueles que não fazem uso dessas substâncias", alerta o endocrinologista Felipe Duarte.

É importante pontuar que o Conselho Federal de Medicina (CFM) proibiu, em 2023, a prescrição médica de terapia hormonal e anabolizantes com finalidade puramente estética. A medida mantém a permissão da indicação a pacientes com diagnóstico comprovado da falta do hormônio no organismo e o quadro clínico compatível com a utilização desse tipo de tratamento.

Segundo o Conselho, a norma destaca a inexistência de estudos clínicos de boa qualidade metodológica que demonstrem a magnitude dos riscos em homens e em mulheres, além da ausência de comprovação científica da necessidade da terapia hormonal com testosterona para a mulher.

Ainda de acordo com a instituição, o médico não pode "expor a figura de seu paciente como forma de divulgar técnica, método ou resultado de tratamento, ainda que com autorização expressa do mesmo". O Código de Ética Médica impede também a autopromoção e a venda de produtos e apostilas.

Por isso é importante ficar alerta e perceber quando um discurso promovido nas redes sociais é malicioso. Na dúvida, a indicação é sempre procurar o seu médico.

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