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A melodia do luto: acordes da memória marcam Dia de Finados na Capital
Cotidiano

A melodia do luto: acordes da memória marcam Dia de Finados na Capital

| AMOR E FÉ | Entre memórias e homenagens, população da capital cearense visitou familiares e amigos neste sábado, 2, nos cemitérios São João Batista e Parque da Paz
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O psicólogo Wilton Silva, 32, fez uma homenagem para a noiva Thaís Moraes, que morreu há três meses (Foto: Samuel Setubal
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Foto: Samuel Setubal O psicólogo Wilton Silva, 32, fez uma homenagem para a noiva Thaís Moraes, que morreu há três meses

Se a saudade tivesse trilha sonora própria, a de Wilton Silva, 32, seria "Wicked Game", do músico Chris Isaak. São os acordes dessa canção que acompanham o psicólogo ao visitar o túmulo da noiva, Thaís Moraes, neste sábado, 2, no feriado do Dia de Finados.

Silva não é o único no cemitério Parque da Paz, localizado na avenida Juscelino Kubitschek, a carregar flores. Mas, no meio da sua caminhada, também leva nos braços um violão para homenagear a amada; na sacola do buquê improvisado, uma lata de Coca-Cola Zero.

"A música é uma das minhas conexões com minha noiva, que faleceu há três meses. Embora seja pouco tempo, as conexões ainda permanecem nessas pequenas coisas", compartilha.

Seria possível descrever Thaís em uma palavra? Wilton não hesita: luz. "Ela também era psicóloga, e se tem uma palavra que pode defini-la, seja na minha visão, no meu sentimento… Todos os pacientes dela a descreveram como luz, como uma pessoa meiga".

Os acordes da vida de Thaís são dedilhados com esmero durante a caminhada, como se o psicólogo decidisse apresentar uma prévia à capela da mulher. Era "uma profissional incrível" e gostava de equitação: chegou até a competir, antes de sofrer uma lesão.

Ao chegar no túmulo da noiva, Wilton deposita as flores aos poucos, com delicadeza. Não presta atenção ao fotógrafo: se dedica a tirar as rosas e colocá-las, uma por uma, ao redor da lápide que marca o espaço da família Moraes.

Uma parte do buquê deve retornar para a mãe de Thaís, que normalmente o acompanha nas visitas. A noiva também foi mãe, e a criança agora segue os seus passos na equitação - "de maneira intuitiva, ela via as fotos da Thaís", adiciona o noivo.

No fundo da sacola, agora sem as flores, Wilton pega a lata de Coca-Cola e explica que a bebida era uma das favoritas da amada. "Eu venho aqui, bebo e deixo pela metade. Eu sei que o zelador vem (tirar), mas é simbólico".

Com a bebida na grama, começa a dedilhar os primeiros acordes de "Wicked Game", a voz baixa, apenas para Thaís: "Nunca sonhei que conheceria alguém como você / E nunca sonhei que perderia alguém como você". ("I never dreamed that I'd meet somebody like you / And I never dreamed that I'd lose somebody like you", no original).

Horas antes, no outro lado da cidade, o avô de Caroline Medeiros, 27, fazia aniversário. "Ele já se foi, há 15 anos, e viemos cuidar do túmulo e orar por ele", explica a advogada, que visitava o cemitério São João Batista, no Centro de Fortaleza. "Meu avô foi uma pessoa muito sorridente, muito resiliente e muita aberta", descreve. "Eu lembro que, quando eu era criança, ele me dava R$ 2 escondido, que era muito dinheiro (na época), e eu abria o portão de casa, atravessava a rua, comprava bombom e voltava escondida"

O bom-humor e o sorriso também são características recordadas pela coordenadora de marketing Joyce Souza, 28, sobre as pessoas que decidiu homenagear no Dia dos Finados.

"Elas gostavam muito de alegria, não gostavam de choro, então eu tento não chorar. É por isso que tento viver a minha vida, mesmo vivendo com o luto", compartilha.

"A minha forma de viver o luto é fazer o que eu gosto e as coisas que eu sabia que elas iam gostar que eu fizesse", explica Joyce. "Eu fui lá e casei, fiz uma festa linda… Adoro ir pros cantos que eu ia com essas pessoas, seja até fazer uma compra no supermercado".

Ao posar para a foto no final, abre um sorriso. O gesto é, brinca a coordenadora, "coerente" com tudo o que já havia falado para a repórter sobre as pessoas queridas; e mais: uma homenagem a cada uma.

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