O ministro Juscelino Filho (Comunicações) revelou, em entrevista exclusiva ao O POVO, que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) fará um novo estudo técnico sobre a usina de dessalinização de Fortaleza, a Dessal. Motivo de conflito entre a Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) e as operadoras de telecomunicações, o empreendimento terá o apoio, ou não, do Ministério após a conclusão deste parecer. A Anatel, inclusive, já se colocou contra a construção da Dessal.
Mas a primeira visita oficial do ministro ao Ceará acontece por outro motivo: assegurar a conectividade dos fortalezenses. Hoje, cumprindo uma agenda que já executou em outros quatro estados, ele visita Fortaleza na chamada Blitz da Telefonia Móvel. A seguir, ele conta os detalhes da iniciativa, fala da Dessal e também da relação do Governo Lula com o União Brasil, partido ao qual é filiado e eleito deputado federal pelo Maranhão. (Colaborou Érico Firmo)
O POVO: O que motivou as blitze sobre qualidade da internet móvel? Alguma pesquisa ou indicativo de qualidade foi observado e serviu de motivador? Se sim, qual?
Ministro Juscelino Filho: Criamos a Blitz da Telefonia Móvel no ano passado, após identificarmos que moradores de diversas cidades relatavam problemas de sinal. Tivemos, inclusive, a instauração de CPIs em alguns estados, diante das crescentes queixas da população. O governo do presidente Lula tem a preocupação de ouvir a população. E foi isso que fizemos. Agora estamos passando por todas as capitais dos estados brasileiros para aferir a qualidade do sinal e buscar, junto às operadoras, soluções.
A equipe técnica da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) analisa as regiões de "sombra", locais relatados pela sociedade civil e por órgãos públicos por terem problemas de sinal, para saber como está a velocidade de conexão nas faixas 4G e 5G e a sua qualidade.
E desde quando assumimos o Ministério, também definimos critérios mais rigorosos para as operadoras. A velocidade mínima do 4G passou para 10 mbps e do 5G, para 100 mbps. Além disso, o índice mínimo de cobertura com níveis de qualidade adequados passou de 80% da área atendida para 95%.
OP - Quais os locais da Região Metropolitana de Fortaleza serão monitorados?
Ministro - Serão 20 pontos. A Anatel iniciou este trabalho na segunda-feira (25) e vou participar do encerramento na praça da Imprensa Chanceler Edson Queiroz, na quarta (27), em uma cerimônia oficial. Já realizamos esse trabalho em Belém (PA), Cuiabá (MT), João Pessoa (PB) e São Luís (MA). Esta é uma política pública muito importante que busca, principalmente, o aperfeiçoamento de todo o ecossistema de telefonia, proporcionando benefícios diretos ao cidadão.
OP - Vimos que há a proposta de criar um selo de qualidade para as operadoras de qualidade boa e ruim. Qual o peso disso para as empresas? Sofrem alguma sanção?
Ministro - A fiscalização da Anatel produz um relatório que é enviado às operadoras detalhando todos os problemas identificados e dando um prazo de seis meses para que tudo seja corrigido. Quem não cumprir com as suas obrigações irá ganhar um selo de má qualidade do serviço. Evidentemente, ninguém quer receber esse tipo de classificação pelo Poder Público. As próprias operadoras, com o passar do tempo, entenderam que esse tipo de fiscalização é importante para o país.
O Ministério das Comunicações mantém diálogo permanente com as empresas e busca a melhor solução possível para a população. Claro que, se o serviço estiver muito aquém daquilo do que é exigido pelas normas que tratam do tema e não for apresentado um plano de ação razoável para resolver a questão, é possível que a Anatel instaure procedimentos que podem resultar em algum tipo de penalidade.
OP - Há projeções que estabelecem uma relação direta entre acesso à banda larga (móvel ou fixa) e o desenvolvimento econômico. Com as metas estabelecidas pelo Ministério nessa blitz para velocidade, há projeção sobre o quanto deva aquecer a economia dos locais ou mesmo do País?
Ministro - A economia digital já está extremamente presente nas nossas vidas e vai crescer muito mais. Será a economia do futuro. O Ministério das Comunicações é responsável no G20 por este tema e temos várias ações para promover a inclusão digital das pessoas que mais precisam, a população pobre.
Temos que possibilitar que as pessoas que vivem sem acesso à internet passem a ter conectividade. O nosso objetivo é incluí-las nessa economia, dar mais opções de crescimento pessoal e também estimular ainda mais o nosso mercado nacional. Porque a inclusão digital promove a inclusão social. Elas vão ter mais possibilidades de formação profissional, de se candidatar a empregos, de interagir por meio desses canais, dentre muitas outras coisas.
Por isso, temos ações em diversas frentes. Estamos garantindo acesso à internet de qualidade a todas as 138 mil escolas públicas de ensino básico no Brasil. Estamos construindo infovias de fibra ótica para levar internet de banda larga a localidades remotas nas regiões norte e nordeste. E vamos doar neste ano mais de 28 mil computadores para pontos de inclusão digital.
OP - O Ministério, via Anatel, empregou uma política de liberação de espectro para a ativação do 5G bem acelerada no último ano. Mas as operadoras não vêm acompanhando o ritmo, alegando que cumprem o que está no edital. Como o Ministério avalia, nesse cenário, a expansão do 5G no Brasil?
Ministro - Pela primeira vez, o PAC incluiu as telecomunicações e temos um grande investimento de R$ 27,9 bilhões para promover a inclusão digital. A maior parte desses recursos, R$ 18,5 bilhões, está relacionada à expansão da telefonia móvel, com o 5G chegando aos 5,5 mil municípios brasileiros e 1,7 mil pequenas localidades, além de expandir o 4G para 4,7 mil distritos, vilas e áreas rurais. Ou seja, temos um grande investimento dedicado a isso e o Ministério, junto com a Anatel, estão promovendo todos os esforços possíveis para levar a melhor tecnologia para a população.
É importante perceber que a expansão do 5G interessa aos clientes e às empresas, que concorrem entre si para oferecer os melhores serviços. Por isso, acredito que estamos avançando em um bom ritmo e espero que seja possível acelerar ainda mais com o crescimento da nossa economia, que o presidente Lula está conseguindo realizar com muito sucesso.
OP - Há cerca de dois anos, Fortaleza é palco de um embate entre as operadoras de telecom e a Companhia de Água e Esgoto do Ceará por conta da instalação da primeira usina de dessalinização de água do mar do Brasil. O local escolhido para o empreendimento, a Praia do Futuro, é o principal ponto de conexão de cabos submarinos de fibra óptica do País e a operação da usina gera riscos para os equipamentos de telecom, segundo as operadoras. A Anatel, inclusive, já se posicionou a favor das empresas de telecom, assim como o Comitê Gestor da Internet. Qual a posição do Ministério? E como atua nisso?
Ministro - Este é um assunto que estamos tratando com muita responsabilidade, atenção e diálogo com todas as partes envolvidas. Evidentemente, não podemos permitir nenhum prejuízo à internet e à conectividade no país. Além disso, a usina de dessalinização é uma obra muito importante para o povo do Ceará. Todos entendem da mesma forma e estamos procurando a melhor solução possível. Conversei com o Governo do Estado e com as operadoras. O Ministério das Comunicações recebeu há duas semanas da Cagece o estudo de impacto do empreendimento e encaminhamos toda a documentação para que a Anatel faça uma nova avaliação, de forma técnica, sobre o assunto, que vai servir de base para a análise do Ministério sobre a obra.
OP - O governo tem plano de taxar as big techs para financiar a inclusão digital. Qual seria o modelo e a forma de tributação? Projeta-se arrecadar qual volume aproximado de recursos e como seria usado o dinheiro?
Ministro - Estamos trabalhando, dentro do Ministério, na formatação desse projeto para levá-lo ao presidente Lula. A equipe técnica está analisando os números e as possibilidades para chegarmos numa proposta que vamos apresentá-la neste primeiro semestre.
As grandes plataformas da internet faturam bilhões no Brasil, mas utilizam a infraestrutura de telecomunicações no nosso país de forma gratuita para um tráfego de dados muito intenso. Para se ter uma ideia, essas empresas são responsáveis por mais de 80% do tráfego nas redes móveis no mundo. Por isso, nada mais justo e coerente que elas contribuam e esses recursos sejam destinados, total ou parcialmente, para a inclusão digital, especialmente em municípios mais pobres.
Esta é uma discussão que não acontece apenas no nosso país, mas acontece em todo o mundo e nossa posição é muito clara nesse sentido.
OP - Seu partido, o União Brasil, tem setores bastante críticos ao governo do qual o senhor é parte. O senhor considera o União um aliado confiável? Algo muda com a mudança de comando?
Ministro - O União Brasil faz parte do governo do presidente Lula e é confiável. Tem demonstrado isso nas votações no Congresso Nacional. Ocupamos, hoje, três ministérios, e entregamos o mesmo número de votos, se não maior, que outros partidos da base aliada, em números absolutos. Vivemos numa democracia, o partido é grande, plural, formado por parlamentares diferentes. É difícil ter uma unidade. Agora, temos uma aliança de coalizão, que garante a governabilidade e o União Brasil tem contribuído de forma significativa.
No que se refere à nova direção, não há mudanças na relação com o governo. A maioria dos parlamentares, tanto na Câmara, quanto no Senado, entendem que a aliança tem sido positiva, principalmente, na construção de um País melhor e União Brasil tem dado a sua contribuição e continuará dando.