O advento do real, há exatos 30 anos, encerrou um ciclo de hiperinflação que bateu os 2.477,% em 1993, ano anterior à adoção do plano econômico que culminou com a implantação da moeda.
Os ciclos inflacionários se constituíam como um dos maiores entraves ao desenvolvimento do País desde, pelo menos, a década de 1960. Diversos planos econômicos e mudanças de moedas ocorreram com o objetivo de controlar as altas taxas anuais de inflação ao longo de, aproximadamente, quatro décadas. Todos sem sucesso.
Até o dia 1º de julho de 1994. O mês imediatamente anterior havia registrado inflação mensal de inacreditáveis 47,43%. Em 31 de julho, o índice mensal despencou para 6,84% e em agosto teve nova queda expressiva, para 1,86%. Um ano depois, pela primeira vez o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou com patamar mensal abaixo de 1%.
Em maio de 2024, último mês com dados inflacionários disponíveis, esse percentual fechou em 0,46%, com acumulado de 12 meses em 3,93%. Para avaliar o impacto que o real teve na economia nacional e analisar os principais desafios para manter a força da moeda como fator de estabilidade, em um cenário atual de volatilidade cambial, O POVO ouviu três especialistas cearenses.
Para o economista e conselheiro da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec Brasil), Ricardo Coimbra, “ao longo desses 30 anos, o Plano Real gerou uma perspectiva de melhoria de cenário para a economia brasileira”. Conforme o especialista, o cenário de hiperinflação “gerava um desequilíbrio em todo o ambiente macroeconômico, com perda de valor da nossa moeda, instabilidade e dificuldade de atração de investimentos”.
Por sua vez, Eldair Melo, membro do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE), lembra que “a estabilização da moeda permitiu uma série de avanços. O PIB brasileiro, por exemplo, cresceu significativamente. De 1994 a 2014, o PIB do Brasil mais que triplicou, passando de cerca de US$ 500 bilhões para mais de US$ 2,2 trilhões. Esse crescimento foi acompanhado pela melhoria em diversos indicadores sociais. A pobreza extrema caiu de 13,4% em 1993 para 4,5% em 2014”.
O presidente da Academia Cearense de Economia (ACE), Lauro Chaves, pondera, contudo, que embora o Plano Real tenha sido exitoso em seu objetivo principal de acabar com a hiperinflação e trazer estabilidade, outros aspectos precisam ser aperfeiçoados para o desenvolvimento concreto do País. “Você tem a questão da capacitação do capital humano, tem a questão da infraestrutura, do ambiente de negócios, da legislação, da reforma tributária. São muitas questões juntas que precisam acontecer. Porém, sem o controle da inflação nada disso seria possível”, ressalta.
“As gerações mais novas não têm ideia do que é ter uma inflação de 30% a 50% ao mês e todos os preços da economia indexados. Então, o Plano Real é, sim, um caso de sucesso mundial em termos de controle da inflação, mas você querer que ele venha a solucionar os graves problemas da economia brasileira está totalmente errado, porque não foi para isso que ele foi criado”, pontua Chaves, que é também professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece).
Recentemente, a desvalorização cambial também trouxe preocupação aos economistas, com o dólar avançando 6,43% frente à moeda brasileira no último mês. “Isso é reflexo das incertezas econômicas, das flutuações dos preços das commodities e das preocupações com a trajetória fiscal do País. A cotação do dólar, que estava em torno de 5,20 no início de junho, agora está próximo de 5,60”, cita o economista Eldar Melo.
Nesse sentido, o conselheiro da Apimec Brasil, Ricardo Coimbra, afirma que, turbulência momentânea à parte, a economia brasileira “pode ter uma melhoria de cenário no médio e no longo prazo, gerando uma maior estabilidade da nossa moeda em relação a outras moedas e um controle mais significativo do processo inflacionário”.
“Isso significa dizer que, com metas de inflação e também metas de controle fiscal, você pode gerar uma perspectiva positiva para os próximos anos, gerando uma melhor estabilidade da nossa moeda em relação a outras moedas”, conclui Coimbra.
30 ANOS DO PLANO REAL
Taxa anual de inflação
1993: 2.477,15%
1994: 916,43%
1995: 22,41%
2000: 5,97%
2005: 5,69%
2010: 5,91%
2015: 10,67%
2020: 4,52%
2023: 4,62%
2024*: 3,93%
Cotação do dólar
1993**: CR$ 326,09
1994: R$ 0,85
1995: R$ 0,98
2000: R$ 2,04
2005: R$ 2,58
2010: R$ 1,66
2015: R$ 4,01
2020: R$ 5,59
2023: R$ 4,97
2024***: R$ 5,58
*Acumulado em 12 meses ( junho de 2023-maio de 2024)
*Moeda ainda era o cruzeiro real (CR$)
*Cotação no dia 28 de junho de 2024