As mudanças climáticas estariam elevando a concentração de mercúrio nos mares e oceanos e se acumulando no organismo de algumas das espécies mais consumidas de pescado no mundo, inclusive no Ceará.
É o que aponta estudo feito em conjunto pela Universidade Federal do Ceará (UFC), pela Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap) e pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Transferência de Materiais Continente-Oceano (INCT-TCMO).
Conforme explica o pesquisador da UFC e membro da Academia Mundial de Ciências, Luiz Drude, o mercúrio “forma um complexo orgânico muito forte, que é muito tóxico e que é muito difícil de ser excretado pelo organismo. Então, ele acaba se acumulando ao longo da cadeia alimentar. O resultado disso é que aqueles peixes no topo da cadeia alimentar, tais como os tubarões, os atuns e aqueles grandes peixes pelágicos, acabam apresentando concentrações bem mais elevadas de mercúrio”.
“Esse mercúrio é resultado do impacto dessas mudanças globais que a gente está testemunhando no planeta. O mercúrio é um elemento volátil. A maior parte dele está na atmosfera e, eventualmente, se deposita nos solos, nos sedimentos. Aí quando você altera o uso do solo, provoca desmatamento ou erosão costeira, esse mercúrio é remobilizado. E, eventualmente, ele se acumula ao longo da cadeia alimentar em um processo natural, que é característico do elemento químico mercúrio”, complementa Drude.
No caso do Ceará, o levantamento aponta uma concentração mais elevada em peixes como arraias, cações e algumas espécies de atum, tais como o atum bandolim. Por outro lado, lagostas, sardinhas, além de pescados cultivados por meio da aquicultura apresentam baixa concentração de mercúrio em seus organismos.
“O camarão e a tilápia são praticamente isentos do mercúrio porque eles crescem rápido e não se alimentam de fontes naturais, acabam comendo ração, por isso nunca vão chegar a apresentar concentrações elevadas”, exemplifica o pesquisador.
O mercado também tem monitorado os níveis de concentração de mercúrio no pescado cearense, notadamente o atum, mais suscetível ao problema, e que tem grande apelo para exportação. Porém, nas análises feitas pela indústria não foram constatados níveis preocupantes do elemento tóxico.
O diretor comercial da Compex, Paulo Gonçalves, “a nossa espécie de atum que seria, potencialmente, acumuladora de mercúrio, quando se faz a análise aqui, o resultado sempre é baixo. A gente está trabalhando num pescado de alto mar, quase em águas internacionais”.
Gonçalves também descarta que o veto à exportação de pescado cearense pela União Europeia tenha se dado por problemas com a concentração de mercúrio. “Nós nunca tivemos um relatório de não conformidade, na União Europeia, com relação ao mercúrio, mesmo que tenha algumas espécies que acumulem mercúrio nós estamos sempre fazendo análise do pescado com relação a metais pesados e a nossa incidência é muito baixa”, pontuou o empresário.
A opinião é corroborada pelo presidente da Câmara Setorial da Economia do Mar, ligada à Agência de Desenvolvimento do Estado do Ceará (Adece), Roberto Gradvohl. “Nesse momento, nós estamos sem poder exportar por uma questão que a gente entende que é política, mas que tem nos prejudicado. A Europa é um dos maiores clientes do mundo e a gente podia estar mandando essa lagosta viva. O nosso atum poderia estar lá na mesa do europeu”, citou.
Por fim, ele lembrou que a questão da contaminação dos mares e do meio ambiente, de um modo geral, é um desafio global. “Você vê a questão dos microplásticos. Ela não está só no pescado. Todos nós seres humanos já temos microplásticos em nosso organismo. Se você for olhar a produção de animais, todos eles já têm plásticos dentro do organismo. O plástico fino é uma questão sanitária mundial. Não é um problema só do Ceará”, ressaltou.
CONCENTRAÇÃO DE MERCÚRIO
BAIXO
Camarão
Lagosta
Tilápia
Sardinha
Robalo
Tainha
Serra
Cioba
Arabaiana
Guaiúba
Ariacó
Biquara
Salema
Dentão
MÉDIO
Pargo
Cavala
Atum branco
Atum laje
Vermelho
Guarajuba
ALTO
Atum bandolim
Arraias
Cações
RECOMENDAÇÃO DE CONSUMO (ADULTO)
BAIXO: Até 16 porções de 150 gramas por mês
MÉDIO: No máximo 6 porções de 150 gramas por mês
ALTO: No máximo 2 porções de 150 gramas por mês
Fontes: UFC/Funcap/INCT-TMCO