O Ceará tem em desenvolvimento o primeiro projeto de rodovia com eletropostos estrategicamente instalados para o abastecimento de veículos eletrificados. A chamada "Linha Verde" deve se estender ao longo da rodovia estadual CE-085 por 300 quilômetros, entre Fortaleza e Jijoca de Jericoacoara, e tem expectativa de ser concluída até o fim deste ano.
A informação foi revelada pelo engenheiro Vicente Ferreira, vice-presidente no exercício da presidência do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado do Ceará (Sindipostos-CE) e vice-presidente da Câmara Setorial de Energia da Federação do Comércio de Bens Serviços e Turismo (Fecomércio-CE).
"Nós fizemos um estudo prévio, elaboramos um pré-projeto e já levamos para um parceiro privado, mas, se não der certo, temos planos B e C", afirmou, acrescentando que a iniciativa acontece independentemente das políticas públicas de estímulo ao setor.
Ele diz que há interlocução com a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, mas o apoio pedido é institucional.
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O trajeto até Jeri foi escolhido pelo apelo turístico da cidade, que atrai viajantes que estão em Fortaleza, e pela infraestrutura já disposta na rodovia CE-085, duplicada em boa parte há cerca de uma década.
De imediato, ele conta que acionou a Enel, distribuidora de energia no Estado, para assegurar que a rede elétrica suporte a instalação de eletropostos com capacidade superior a 40 quilowatts, os quais permitem cargas rápidas nos veículos.
O parceiro privado mencionado pelo presidente em exercício do Sindipostos-CE é uma empresa geradora de energia. Outras, especializadas em instalação de eletropontos, também devem ser envolvidas. Sobre o investimento, apenas com os equipamentos projetados, o aporte gira em torno de R$ 3 milhões, inicialmente.
A Linha Verde demonstra atenção dos proprietários de postos de combustíveis a uma frota que só cresce. Entre 2022 e 2023, a expansão da frota eletrificada (veículos 100% elétricos e híbridos) saltou 91%, de 909 unidades para 1.941.
Emplacamentos que devem ser superados em 2024, uma vez que os números do primeiro semestre computados pela Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) indicam que 2.842 carros eletrificados foram vendidos no Estado. É a terceira maior quantidade no ano entre os nordestinos, atrás de Bahia (2.292) e Pernambuco (2.117).
"O fator infraestrutura é preponderante para que você elimine, na minha opinião, a única barreira que existe pro carro elétrico a crescer exponencialmente", indica Carlos Augusto Serra Roma, diretor do Grupo de Infraestrutura e integrante do conselho da ABVE.
A iniciativa cearense coloca o Estado na lista de unidades da federação que contam com infraestrutura para abastecimento de veículos elétricos ao longo de rodovias. No Nordeste, há uma entre Salvador e Rio Grande do Norte, enquanto que, no Sudeste, rodovias entre São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais foram as primeiras a serem criadas no País.
Com um número de 30 e 40 postos previamente listados para compor a Linha Verde do Ceará, a quantidade de eletropostos deve saltar dos atuais 234, à medida que mais postos forem aderindo.
Apesar de contar com a terceira maior frota da Região, o Ceará é o que mais possui pontos de abastecimento para esse tipo de automóvel no Nordeste.
A Linha Verde surge como a primeira tomada de decisão do Sindipostos rumo a este novo nicho de mercado dos carros elétricos, e deve ser o pontapé inicial para a criação de uma legislação local com regras para o tipo de serviço.
"Os postos têm tudo a ver com o carro e nós vamos ter uma convivência energética. O carro a combustão não vai acabar. Vai ter uma convivência de múltiplos combustíveis", projetou Vicente Ferreira.
O diretor da ABVE concorda com o empresário cearense. Em São Paulo, o executivo participou do primeiro grupo de trabalho para a formação de uma legislação estadual com regras para os eletropostos e disse que, além das áreas de prédios e shoppings, os postos devem continuar sendo o espaço adequado para o abastecimento.
Ferreira acredita ainda que a legislação em vias de consulta pública por lá deve ser espelhada pelo Ceará - onde ainda não há iniciativa do tipo, segundo o Sindipostos - e demais estados, em um movimento de padronização das regras em todo o País.
ABVE: Nordeste é ambiente de excelência para veículos elétricos
Ao mesmo tempo que ajuda o Brasil a cumprir o papel de liderança internacional na transição energética e na redução do aquecimento global, os carros elétricos têm no Nordeste do País um ambiente propício ao desenvolvimento de novas indústrias e mercado consumidor, segundo avalia Carlos Augusto Serra Roma, diretor do Grupo de Infraestrutura e integrante do conselho da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE).
"Os estados do Nordeste têm a vocação natural do sol e dos ventos para gerar energia. Nós precisamos atravessar esse momento difícil de déficit fiscal muito grande. Mas a Região será um polo de produção muito grande, não só de produção de veículos, mas de qualquer item relacionado, como semicondutores", afirmou ao O POVO.
O executivo destaca ainda que os carros elétrificados (elétricos e híbridos) estimulam, além da indústria automotiva, a de geração de energia e de desenvolvimento de software, gerando empregos de alta renda tão necessários para a redução das desigualdades na Região.
Perguntado se as medidas do governo federal, como o Mover e a Reforma Tributária, ajudam a desenvolver os veículos eletrificados no Brasil, Roma é categórico: "Não. Não vejo ajuda nesse sentido. Tem um protecionismo por medo de perder empregos na indústria local."
Ele diz que há "um ceticismo contra o carro elétrico na Europa, nos Estados Unidos e que se transfere para o Brasil", mas o interesse dos consumidores locais e o modo como funcionou para eles está revertendo isso.
Não à toa, ele cita a perda de participação de mercado no País pela Chevrolet, que não investiu com afinco neste segmento, e a expansão das chinesas BYD e GWM, que enxergaram o mercado local e resolveram investir bilhões de reais em fábricas no Brasil.
Sobre o papel dos governos estaduais e municipais, Roma ressalta que os gestores perdem melhores oportunidades de emprego aos habitantes e investimentos ao não estimular os elétricos, seja via menores impostos ou até metas de uso do transporte público 100% elétrico.
Eletropostos pelo País
Fonte: ABVE