A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 66/2023, que prevê, entre outras questões, estabelecer como parâmetro mínimo para municípios e estados as regras aprovadas pela Reforma da Previdência de 2019 deve impactar diretamente servidores públicos cearenses, caso seja aprovada na Câmara dos Deputados, conforme projetam entidades classistas.
Isso porque o texto aprovado, por unanimidade, no Senado Federal no dia 14 de agosto, estabelece que as regras previdenciárias de municípios e estados não podem ser menos rigorosas que as adotadas pela União, ou seja, as normas previstas na Reforma da Previdência realizada em 2019.
A preocupação se dá, justamente, porque o Estado do Ceará adotou, naquele mesmo ano, um regime previdenciário para os seus respectivos servidores com regras menos rígidas.
Situação semelhante ocorre em outros estados e municípios Brasil afora, o que levou cerca de 98 entidades classistas de todo o País a publicarem nota conjunta com posicionamento contrário à aprovação desse trecho específico da PEC. A proposta tratava originalmente do reescalonamento (mudança nas condições de pagamento) de precatórios e dívidas dos municípios com a Previdência.
Conforme observa o diretor jurídico e econômico-tributário do Sindicato dos Fazendários do Ceará (Sintaf-CE), Ivanildo França, a PEC cria o artigo 40-A na Constituição. “Esse artigo, especificamente, não trata de regras de Previdência, mas diz o seguinte: os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão ter regras de previdência menos rigorosas do que as regras da União”, detalha.
“Se houver regras mais rigorosas, continuam valendo. Se houver regras menos rigorosas e não forem ajustadas em até 18 meses, passam a valer compulsoriamente as regras da União”, acrescenta Ivanildo França. "Sem discussão, foi alterada uma regra fruto de um ano de discussão política e social", criticou.
Apesar dos pontos apontados pelas instituições que representam servidores públicos estaduais e municipais, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) se posicionou favoravelmente à PEC 66/2023, em comunicado à imprensa.
“A estimativa é de mais de R$ 400 bilhões para os municípios. O pacote de medidas defendido pela CNM faz parte de esforços para aliviar a pressão nas finanças públicas de forma sustentável”, disse a entidade em nota.
O POVO entrou em contato com a Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece), mas não obteve resposta até a publicação desta matéria em sua versão impressa.
Tão logo seja enviado, o posicionamento da instituição será atualizado em sua versão digital.
A PEC 66/2023 e seus impactos jurídicos
A Proposta de Emenda à Constituição Federal n° 66/2023 foi recentemente aprovada pelo Senado Federal, cuja proposta inicial era abrir novo prazo para renegociação das dívidas dos municípios tanto com o Regime Geral, como com os Regimes Próprios de Previdência Social.
Nesse sentido, vale destacar que houve significativa introdução, de modo inesperado, de alterações que versam sobre a extensão de equiparação às regras do regime próprio da Previdência da União para os Estados e o Distrito Federal, o que, certamente, ofende os direitos de milhares de servidores estaduais e municipais, com inobservância aos princípios e regras relativos ao subsistema previdenciário constitucional.
Isso porque a alteração na redação da PEC n° 66/2023, a qual está sendo denominada como “Segunda Reforma da Previdência”, tem como objetivo impor rígidas mudanças nas regras previdenciárias dos Estados, o que poderá desestruturar conquistas alcançadas pelos servidores públicos ao longo dos anos.
Tal descompasso ocorrerá em razão, por exemplo, do aumento da idade para aposentadoria das mulheres de 55 para 62 anos, e de homens de 60 para 65 anos, além do estabelecimento de pedágio de 100% de tempo de serviço para se aposentar, redução das pensões, aumento obrigatório dos valores das contribuições previdenciárias, dentre outras modificações igualmente danosas.
Tais mudanças se afiguram em traços de inconstitucionalidade, vez que, por tratarem acerca de regras de aposentadoria, atribuem a competência de propositura ao Presidente da República, segundo inteligência da alínea “c” do inciso II do art. 61da Constituição Federal. No caso em questão, a PEC foi proposta pelo Senado Federal.
Ademais, há clara violação ao princípio do retrocesso social ao permitir que sejam fixadas regras mais rígidas aos servidores estaduais e municipais do que as normas gerais previstas na Constituição Federal para os servidores públicos federais.
Outrossim, tem-se que possíveis reformas dos Regimes Próprios de Previdência e seus critérios para aposentadoria e demais benefícios previdenciários devem ser realizados pelo próprios Entes Federativos, considerando a realidade de cada um, além de assegurar a sua autonomia e competência para legislar sobre as referidas temáticas, sendo, inconstitucional, portanto, a “centralização obrigatória” da regras previdenciárias, já que visa restringir e inviabilizar a forma federativa do Estado brasileiro.
Dessa forma, os servidores públicos correm risco iminente de retrocesso e violação de seus direitos em caso de aprovação da PEC n°66/2022, que agora será votada na Câmara dos Deputados.
Luiz Fontenele
Advogado previdenciarista