O caminho para chegar a uma proposta de acordo entre a União e os donos de barracas da Praia do Futuro tem um novo entrave. Os empresários rejeitam a proposta da Superintendência de Patrimônio da União (SPU) de reduzir o tamanho dos empreendimentos para até 800 metros quadrados (m²) com ampliação do calçadão para o espaço onde atualmente estão as estruturas físicas na praia.
A proposta da SPU apresentada ao Fórum Permanente para a Requalificação da Praia do Futuro em setembro deste ano prevê ainda, dentre outros pontos, a permanência de até 60 barracas por um prazo de 20 anos, com licitação a cada período, conforme previsto no plano de 2017 do Instituto de Planejamento de Fortaleza (Iplanfor), hoje, Instituto de Pesquisa e Planejamento de Fortaleza (Ipplan Fortaleza).
Haveria também também o alargamento do calçadão para 44 metros (14 metros do calçadão existente + 30 metros para edificações) do limite do meio-fio da pista de rolamento da avenida. Sobraria ainda espaço para 40 metros de mesas e guarda-sóis e pelo menos 65 metros de praia (atualmente existem trechos em que existem menos de 20 metros de praia livres).
Seria cancelado o Registro Imobiliário Patrimonial (RIP) das barracas que se encontram em situação de inadimplência, nos termos da lei. “Pois a decisão judicial não dá o direito de os barraqueiros ocuparem áreas públicas gratuitamente. É uma nova situação, não protegida pela Ação Judicial”, afirmou.
Ainda segundo a proposta, as barracas que se instalaram no local sem qualquer registro, não terão direito ao novo espaço. Já as que possuem RIP e estão inadimplentes, devem regularizar sua situação. "Das 43 barracas sem RIP, somente serão beneficiadas aquelas que manejaram Recursos Especial e Extraordinário (STJ e STF). As demais, que não oferecem risco jurídico, serão demolidas, às expensas dos barraqueiros".
O Fórum Permanente para a Requalificação da Praia do Futuro, reúne sob a liderança do Ministério Público Federal (MPF) órgãos como a Prefeitura de Fortaleza, União, Governo do Ceará e a Associação dos Empresários da Praia do Futuro (AEPF).
Ao O POVO, a Associação dos Empresários da Praia do Futuro (AEPF) reclama, destacando que a União passou anos sem se pronunciar sobre a questão, mas agora busca emplacar um projeto em que quer “transformar as barracas de praia em quiosques”, parecidos com as praias de Balneário Camboriú-SC ou Copacabana, no Rio de Janeiro.
A ideia maturada anteriormente no âmbito do Fórum era de que as barracas - que hoje chegam a ter até 4 mil m² de área ocupada - tivessem tamanhos de 500 metros quadrados (m²), 1.000 m² e 1.500 m². No entanto, a proposta da União é de reduzir ainda mais o tamanho das barracas permitidas, para modelos de 200 m², 400 m² e 800 m², sendo 40% do espaço de área construída.
O Fórum foi criado em 2017 após uma decisão da Justiça Federal sobre ação de 2005 determinar a demolição e liberação de todo espaço da faixa de praia. A ideia era reunir as diversas partes para buscar um meio termo para que fosse possível a revitalização do espaço. O colegiado é composto por 24 entidades públicas e privadas que, em 2019, aprovaram um termo de referência para que fosse realizado um concurso nacional de ideias para reurbanização da área.
Entre as propostas já pactuadas além do concurso, estaria a previsão de intervenção na Praia do Futuro - desde a Rua Ismael Pordeus, incluindo o Titanzinho, até a foz do Rio Cocó, na Sabiaguaba.
O estudo da SPU destaca um relatório que aponta uma série de irregularidades, como 153 empreendimentos instalados na faixa de areia sem licenciamento ambiental e quase todos "cerceando o livre acesso da população à praia e ao mar", além de 98 casos excedendo as dimensões previstas e que nunca recolheram qualquer valor aos cofres públicos pela área excedente.
Fátima Queiroz, presidente da AEPF, afirma que a proposta apresentada pela União foi como um "balde de água gelada", pois não leva em consideração a cultura cearense de gosto pelas barracas de praia.
Agora, os empresários buscam uma reunião diretamente com a titular do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, em Brasília, até o fim do mês.
"As barracas da Praia do Futuro são um patrimônio de Fortaleza. É difícil imaginar essa praia sem elas, pois representam a cultura e a identidade local", pontua.
Colaborou Fabiana Melo
MPF: Mudança de gestão da União para a Prefeitura só será possível após acordo
Outro ponto de discussão dentro desse contexto reordenamento da Praia do Futuro é a ideia de transferir a gestão da faixa de areia da União para a Prefeitura de Fortaleza a partir de 2025.
Atualmente, toda faixa de praia entre a Barra do Ceará e o Mucuripe já está sob a gestão da Prefeitura de Fortaleza. Apenas o trecho da Praia do Futuro, desde o Titanzinho até a foz do Rio Cocó, na Sabiaguaba, tem gestão da União.
O POVO procurou o superintendente do Patrimônio da União no Ceará, Fábio Galvão, para falar sobre o assunto, mas não houve retorno até o fechamento desta edição.
Já o procurador do MPF Alessander Sales, responsável pelo Fórum, destacou que qualquer repasse de gestão da faixa de cerca de 6 km deve ocorrer somente após decisão acordada.
"Nossa posição é clara: A gestão deve ser repassada ao Município, mas só depois de firmado o acordo sobre os equipamentos já existentes", diz ao O POVO.
O secretário do Desenvolvimento Econômico (SDE) de Fortaleza, Rodrigo Nogueira, revela ao O POVO que há anos existe a intenção da Prefeitura de assumir a gestão da faixa de areia da Praia do Futuro.
Pelo menos desde a gestão Roberto Cláudio, quando já havia a decisão da Justiça Federal de que as barracas de praia deveriam desocupar a faixa de areia, foi desenhado acordo com o SPU para que aquela área seria repassada para gestão da Prefeitura para que fizesse parte do projeto de renovação da orla, similar ao que ocorreu com a Beira-Mar de Fortaleza, que também já foi gerida pela União.
Para Rodrigo, caso a ideia se concretize para 2025 será positivo para a Praia do Futuro, mas não deve ser uma mudança significativa em relação ao que já existe no local.
"Na prática, não muda muito. Os hotéis não são afetados neste sentido, pois a gestão seria da área de praia", destaca o secretário.
Quem também falou ao O POVO sobre a questão foi o ex-secretário do Turismo do Ceará, Arialdo Pinho. Na sua avaliação, o principal ganho possível com a transição da gestão da faixa de praia é a melhor organização.
Arialdo entende que o grande objetivo da Prefeitura com a posse da gestão do espaço deveria ser de "respeitar os empreendedores que estão em operação e deixar a praia livre dos escombros de construções e barracas da orla, deixando a praia livre".
O ex-secretário do Turismo ainda aponta que os moradores de comunidades, como o Titanzinho, devem ser respeitados nesse processo.
No seu entendimento, o foco da revitalização deve ser diferente do que foi feito na Avenida Beira Mar, "em que prevaleceu a construção civil e os negócios". Em relação à atração de investimentos, Arialdo acha que será um processo natural, decorrente da revitalização do espaço.
Na visão de Ivana Bezerra, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Ceará (ABIH-CE), o contraponto, pois entende que apenas a mudança não deve atrair novos investimentos para o setor hoteleiro.
Isso porque incentivos fiscais já foram dados para a Prefeitura e, nem por isso, houve um movimento maior de hotéis para a área.
"O Gran Mareiro está sendo construído lá, mas não só pelo benefício. Eles tiveram, logicamente, uma ajuda maravilhosa, mas já tinham esse plano de ter um hotel lá. O terreno já tinha sido comprado antes do benefício. Então, o problema da Praia do Futuro é mais a infraestrutura, a segurança, a distância, a maresia. Os hotéis ficam receosos de ir para lá", ressalta.
Sobre a possibilidade de uma nova gestão na Praia do Futuro, a Secretaria do Turismo (Setur) informa que seguirá atuando em parceria com os órgãos competentes, visando à promoção do turismo na região e à melhoria da experiência dos visitantes.
ENTENDA O QUE ENVOLVE A SITUAÇÃO DA PRAIA DO FUTURO
A atual determinação da Justiça Federal é a de liberação total da faixa de areia da Praia do Futuro, com retirada de barracas de praia e demais empreendimentos.
A proposta da União no colegiado reunido para resolver a questão é de que haja uma readequação dos tamanhos dos empreendimentos, de forma a diminuir o tamanho dos espaços ocupados na faixa de areia. As barracas que descumprissem os requisitos, seriam multadas em R$ 110 a cada metro quadrado (m²) fora do padrão.
O POVO entrou em contato com a equipe do prefeito eleito, Evandro Leitão, que preferiu não comentar sobre a possibilidade de repasse da gestão da faixa de areia da Praia do Futuro.
Estudo
O estudo da SPU destaca uma série de irregularidades, como 153 empreendimentos instalados na faixa de areia sem licenciamento ambiental e quase todos "cerceando o livre acesso da população à praia e ao mar"