A Prefeitura de Fortaleza se posicionou contra a proposta da União para o reordenamento da Praia do Futuro de limitar o tamanho das barracas para até 800 m². No plano apresentado pela Superintendência do Patrimônio da União (SPU) do Ceará, é proposto utilizar um projeto de 2017 produzido pelo Instituto de Planejamento de Fortaleza (Iplanfor) hoje, Instituto de Pesquisa e Planejamento de Fortaleza (Ipplan Fortaleza), no âmbito do Plano Fortaleza 2040.
Mas, segundo ofício assinado pelo prefeito José Sarto (PDT), o plano está em revisão e esses dados não devem ser levados em consideração, pois mudanças devem ocorrer no Plano até o fim deste processo, em 2025.
O ofício assinado pelo prefeito e encaminhado ao procurador federal Alessander Sales, coordenador do Fórum Permanente da Praia do Futuro, ocorre após o novo impasse entre União e a deliberação do colegiado.
Conforme O POVO publicou no último dia 11/11, os empresários rejeitam a proposta da Superintendência de Patrimônio da União (SPU) de reduzir o tamanho dos empreendimentos para até 800 metros quadrados (m²) com ampliação do calçadão para o espaço onde atualmente estão as estruturas físicas na praia.
O novo calçadão teria 44 metros, sendo que em 30 metros destes ficariam as novas edificações. A União também prevê, entre outros pontos, cancelar os Registros Imobiliários Patrimoniais (RIPs) e passaria a realizar licitação para cessão onerosa por 20 anos para um limite de 60 empreendimentos.
Ao O POVO, o coordenador do Fórum destaca que, além do posicionamento oficial da Associação dos Empresários da Praia do Futuro (AEPF), a posição do Município de Fortaleza é oficial, reafirmando o compromisso com o que foi decidido no colegiado.
Segundo o ofício, o prefeito defende que, apesar da SPU lembrar de projeto do Iplanfor, a execução deve ocorrer "de uma forma estratégica e a longo prazo".
Enfatiza ainda que o Plano Fortaleza 2040 está em processo de revisão, que deve ser consolidado no ano de 2025. "Após sua finalização em 2016, foi sugerido um detalhamento de uma 'ideia' ou 'visão' sobre o reordenamento das barracas."
O documento ainda pontua que o Plano 2040 é uma ideia que, em uma cidade em constante transformação, necessita de readequações, "especialmente na área da Praia do Futuro", não tendo, portanto, o peso de um plano diretor para a região, nem vincula obrigação à Prefeitura.
O POVO apurou que, além dos empresários das barracas de praia e a Prefeitura, outras entidades se mostram contra a proposta da SPU no âmbito do Fórum Permanente da Praia do Futuro, capitaneado pelo Ministério Público Federal (MPF).
O entendimento é de que os planos da SPU não levam em consideração os avanços que o colegiado havia conseguido ao longo de anos de negociações entre as partes.
No próprio ofício da Prefeitura de Fortaleza, há menção ao posicionamento da gestão municipal, de estar sempre em consonância com o que foi acordado por todas as instituições participantes.
"Há o entendimento de que as barracas cumprem uma função ambiental, social e cultural bastante relevante para a Cidade de Fortaleza".
Sarto ainda diz no ofício que, embora a proposta da SPU se fundamente no Plano Fortaleza 2040, "a administração municipal destaca que a proposta não reflete a intenção da Prefeitura para o novo reordenamento da Praia do Futuro".
"Acreditamos que a proposta do Fórum Permanente é a mais viável, eficiente, menos onerosa e traz mais benefícios públicos", finaliza.
Fábio Galvão, superintendente estadual da SPU-CE, revela que na próxima semana haverá nova reunião do Fórum, em que os empresários poderão apresentar uma contraproposta à União, que será analisada.
Ele ainda destaca que a intenção da União é aguardar e tentar um acordo antes de qualquer medida via judicial. "Estamos aguardando as tratativas do Fórum e tentando acordo. Caso não haja, informaremos ao Poder Judiciário e cumpriremos o determinado", afirma.
Os entraves que impedem o acordo
Um dos pontos mais complexos no entendimento entre o Fórum e a União envolve o tamanho dos empreendimentos. A proposta anterior propôs três opções: 500 m², 1.000 m² ou 1.500 m², dependendo das áreas de Registro de Imóveis Públicos (RIP) já existentes, mantendo no atual formato de barracas de praia.
Após análise técnica, a União aprova as dimensões de 200 m², 400 m² ou 800 m², considerando os limites técnicos e a necessidade de preservação da infraestrutura local. Ao O POVO, o Ministério da Gestão e Inovação (MGI) destaca que "essas dimensões já representam as maiores barracas permitidas no País".
Caso não haja acordo com a União, existe o risco de que todos os empreendimentos sejam demolidos. Em entrevista à Rádio O POVO CBN, o superintendente da SPU-CE, Fábio Galvão, confirmou que se o acordo não for firmado, prevalecerá a decisão judicial, de 2017.
Ele lembrou que atualmente existem barracas que ocupam áreas de até 4 mil m², outras menores, algumas sem RIP que permanecem ativas economicamente. "Está muito desordenado. O intuito da União é regularizar esses espaços."
A proposta da SPU apresentada ao Fórum Permanente para a Requalificação da Praia do Futuro em setembro deste ano prevê ainda, dentre outros pontos, a permanência de até 60 barracas.
Ainda segundo a proposta, as barracas que se instalaram no local sem qualquer registro, não terão direito ao novo espaço. Já as que possuem RIP e estão inadimplentes, devem regularizar sua situação. "Das 43 barracas sem RIP, somente serão beneficiadas aquelas que manejaram Recursos Especial e Extraordinário (STJ e STF). As demais serão demolidas, às expensas dos barraqueiros".
MGI: Decisão na Praia do Futuro possui implicações para todo litoral brasileiro
O Ministério da Gestão e Inovação (MGI), pasta a qual a SPU está vinculada, acompanha de Brasília a situação na Praia do Futuro e enfatiza que a decisão possui implicações para todo o litoral brasileiro.
Ao O POVO, o MGI reforça Nota Técnica encaminhada ao Fórum para esclarecer as autorizações concedidas pela União para o uso de áreas no litoral brasileiro, cujo objetivo é não gerar insegurança jurídica para outros casos no litoral brasileiro.
"As autorizações são baseadas em legislações ambientais e de planejamento urbano que devem ser rigorosamente cumpridas. A decisão, que possui implicações para todo o litoral do país, tem como objetivo garantir a preservação e o ordenamento adequado dos espaços públicos, respeitando os limites estabelecidos pelas normas vigentes", diz.
O MGI ainda ressalta que as mudanças propostas pela SPU considera os limites máximos de intervenção urbana permitidos pela legislação vigente, buscando equilibrar a expansão e manutenção da infraestrutura com a preservação ambiental e a ordem pública, "estabelecendo um padrão que poderá ser seguido em todo o litoral brasileiro".
Questionado pelo O POVO sobre a agenda da ministra titular do MGI, Esther Dweck, e se há previsão para a realização da reunião com os empresários da Praia do Futuro, a equipe do ministério não respondeu.
Reordenamento da Praia do Futuro
Existem 153 empreendimentos na faixa de areia sem licenciamento ambiental e quase todos cerceando o livre acesso da população à praia e ao mar.
Do total, 110 possuem cadastro na SPU, possuindo Registro Imobiliário Patrimonial (RIP). Destes, 98 excedem as dimensões previstas pelo RIP e nunca recolheram qualquer valor aos cofres públicos pela área excedente (até 14 mil m²).
Existem também 43 empreendimentos sem registro RIP na SPU e que não recolhem qualquer valor aos cofres públicos (instalados há muitos anos).
HISTÓRICO DE CONFLITO
Decisão da Justiça Federal de 2017, a partir de ação impetrada em 2005, autorizou a demolição das 43 barracas sem RIP e não autorizadas pela SPU. Também foi determinada a redução das demais barracas às dimensões dos RIPs, à data do Agravo de Instrumento (2006) e a remoção dos obstáculos que impedissem o acesso à praia e ao mar.
O prazo dado pela Justiça para cumprimento da decisão era até o dia 4 de abril de 2019. Mas as determinações não foram cumpridas, mas chegou-se a um acordo com a criação do Fórum Permanente da Praia do Futuro pelo MPF, em 2017, para reunir entidades que são impactadas direta e indiretamente sobre a questão.
Em abril de 2019, o Fórum apresentou uma proposta de Termo de Referência para a requalificação prevendo um concurso nacional e outras medidas, que são encaradas pela União como contraposições à decisão da Justiça, como a manutenção das 43 barracas sem RIP, a permanência na faixa de areia dos empreendimentos existentes sem redução de tamanho conforme a documentação, com a remoção dos obstáculos sob as expensas da União e não dos barraqueiros.
Outros pontos que não são aceitos pela União é a anistia de valores devidos, além do pedido de concessão de novos RIPs entre 500 m² e 1.500 m², além de conceder RIP para as barracas que não possuem documentação.
A SPU lembra que a legislação sobre ocupação da zona costeira brasileira diz que as praias marítimas são bens da União. E que ao aceitar a proposta do Fórum estaria com o ônus ao abrir precedente prejudicial de manutenção de ocupações em praias, além da renúncia a receitas federais.
"Não é o caso. São empreendimentos milionários, que há anos vêm privatizando e se utilizando de enormes extensões de nobres áreas de uso comum do povo, sem pagar", completa a SPU em proposta apresentada ao Fórum.