A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) anulou algumas das regras dos direitos dos consumidores, aprovadas em novembro de 2023. Entre elas, estão mudanças de preço durante a vigência do contrato, data de reajuste e migração automática. Entenda mais abaixo cada uma das decisões.
A decisão foi aprovada por maioria no Conselho Diretor da Anatel na última quinta-feira, 5. Por outro lado, mantiveram outras disposições, tais como aquelas relacionadas à comunicação ao usuário sobre a extinção de ofertas, combate a fraudes e medidas assimétricas.
Pelas novas regras, que começam a valer a partir de setembro de 2025, as prestadoras de serviços de telecomunicações, como planos de celular, internet e TV por assinatura, poderão mudar características da oferta, incluindo o preço e acesso, durante a vigência do contrato.
O reajuste também não fica mais restrito à data de contratação do plano. Ou seja, a operadora poderá definir uma outra data-base para o plano desde que isso esteja previsto no contrato.
O funcionamento dos serviços em caso de inadimplência foi outro ponto modificado. Hoje a operadora é obrigada a manter sem cobrança o recebimento de chamadas e de mensagens de texto pelo prazo de 30 dias contados a partir do início da suspensão. Esta regra foi anulada e as operadoras poderão cobrar pelos serviços prestados.
A Anatel também retirou o trecho que previa que, nos casos de migração automática, a transferência deveria ser feita para um plano que fosse de igual ou menor valor, sem prazo de permanência. A partir de setembro de 2025, as operadoras precisam de autorização do cliente para fazer alterações do tipo.
Segundo o Conselheiro Diretor Alexandre Freire, que proferiu o voto-vista, “o equilíbrio entre a preservação da segurança jurídica e a proteção dos direitos dos consumidores é a pedra de toque desta decisão."
"Nosso compromisso é assegurar que as regulamentações sejam justas e transparentes, buscando harmonizar os interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, tal como preconizado no Código de Defesa do Consumidor", complementa.
No entanto, conforme explica a presidente da Comissão de Defesa do Consumidor (CDC) da Ordem dos Advogados do Ceará (OAB-CE), Cláudia Santos, as resoluções propostas não podem se sobrepor ao Código de Defesa do Consumidor, lei federal que regula as relações de consumo.
"Quero dizer com isso que, qualquer resolução da Anatel que contrarie as normas e as regras do Código de Defesa do Consumidor, são passíveis de nulidade. Então, o consumidor pode questionar judicialmente com base na lei caso não sejam cumpridas", afirma.
Na mesma linha, Airton Melo, coordenador jurídico do Programa de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon) Fortaleza, pontua que eventuais abusos por parte das operadoras, baseados nessas novas regras, devem ser denunciados ao órgão.
"Isso é essencial para que o órgão atue na proteção do consumidor e combata práticas que violem o Código de Defesa do Consumidor. A decisão da Anatel não pode, de forma alguma, infringir os direitos já garantidos aos consumidores. É importante que todos fiquem atentos às informações fornecidas pelas operadoras e denunciem qualquer irregularidade."
Ainda, determinou-se ao Grupo de Implantação que proceda às devidas conformações no Manual Operacional, com objetivo de garantir clareza e objetividade nas regras aplicáveis.
Em nota, a Anatel informou que, como ente público, tem uma trajetória sólida de proteção aos direitos dos consumidores. "Isso é evidente tanto na regulamentação — o Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC) estabelece prerrogativas e salvaguardas que vão além do Código de Defesa do Consumidor (CDC) — quanto em ações concretas, como as que enfrentam problemas como chamadas abusivas"
Reforça ainda que, ao avaliar os pedidos de anulação de dispositivos do novo RGC, a Agência reconheceu a intenção inicial de reforçar as medidas de proteção ao consumidor. "No entanto, identificou que algumas regras, como apresentadas, poderiam limitar direitos garantidos pelo CDC, contrariando o princípio da liberdade de escolha dos consumidores, essencial na legislação consumerista. Conforme disposto no Voto nº 15/2024/AF, o Conselho Diretor verificou que determinados artigos do novo RGC não apenas estavam desalinhados do CDC, mas também poderiam gerar interpretações contrárias à legislação. Por essa razão, optou-se por anulá-los, medida necessária para assegurar a coerência com os princípios e comandos do CDC."
Também informa que os pontos abordados nos dispositivos anulados serão aprofundados pelo grupo responsável pela implementação do novo RGC. "Esse processo será conduzido com transparência e ampla participação social."
Mudança do contrato não pode ser unilateral, diz Procon
Uma das medidas que foram anuladas pela Anatel é a proibição de alteração de características da oferta durante a vigência do contrato. Ou seja, as operadoras poderão modificar o preço e o acesso aos serviços dos planos durante o período de contrato.
No entanto, Airton Melo, coordenador jurídico do Procon Fortaleza, reforça que a mudança não pode ser unilateral, ou seja, depende de autorização do consumidor.
"Agora, as operadoras podem alterar produtos e serviços, promover mudanças contratuais e até realizar exclusões de itens. Por exemplo, se hoje eu assino apenas um serviço de internet, amanhã posso ser ofertado um pacote com internet, e o contrato poderia ser ajustado para incluir essa mudança. No entanto, é fundamental que o consumidor seja devidamente informado e consultado antes de qualquer alteração. Ele tem a palavra final para aceitar ou não."
Sobre preços, reforça que as alterações podem ocorrer, contudo, as operadoras precisam informar o consumidor com antecedência e garantir a transparência sobre os reajustes. "Não é permitido impor um aumento de preço de forma unilateral e abusiva durante o contrato. Na prática, reajustes geralmente são aplicados no momento da renovação do contrato ou quando há um novo com outras condições. Mas, se houver alterações no meio da vigência, elas precisam ser previamente comunicadas e dependerão da anuência do consumidor."