Com aumento de 39,97%, somente entre janeiro e novembro deste ano, o preço do café moído deve sofrer novos reajustes nos próximos 60 dias. É o que apontam empresas que atuam em diferentes partes da cadeia produtiva do insumo, que atingiu a maior cotação internacional desde 1977, no fim do mês passado.
Além das questões relacionadas em grande parte às quebras de safras causadas pelas mudanças climáticas, a alta do dólar frente ao real também compõe uma cesta indigesta de motivos para deixar a matéria-prima de uma das bebidas mais consumidas pelo brasileiro “amarga”, na hora da ida ao supermercado ou a uma cafeteria por exemplo.
Conforme nota enviada a O POVO pelo Grupo 3corações, cuja sede fica em Eusébio, na Grande Fortaleza, a empresa, que é líder nacional no segmento, “monitora atentamente as projeções de safra e as oscilações históricas nas cotações dos grãos, amplamente influenciadas pelas mudanças climáticas e pelas quebras de safra, fatores que pressionam fortemente os custos do café verde, nossa principal matéria-prima”.
“Apesar de termos absorvido essas variações ao máximo, a persistência desse cenário tornou necessária uma revisão de nossos custos operacionais, resultando em um ajuste nos preços”, prossegue o comunicado do grupo.
“Reiteramos, entretanto, nosso compromisso em implementar esse ajuste de forma gradual e responsável, sempre com o objetivo de minimizar o impacto para o consumidor e preservar a sustentabilidade de toda a cadeia produtiva”, conclui a nota, que não confirmou, contudo, especulação sobre aumento imediato da ordem de 20% no valor do produto.
O POVO ouviu também a empresária Isabelly Giffony, sócia-fundadora do Atelier 1913, uma das principais cafeterias a trabalhar com cafés especiais no Ceará (notadamente a variedade Typica do café-arábica) sobre as perspectivas para o consumidor e para quem trabalha com o produto. A empresa tem como fornecedor único, o Sítio São Roque, outra empresa da família, cuja sede fica no município de Mulungu (a 120 km de Fortaleza).
“Torramos apenas o nosso café, então não sentimos tanto a alta do preço. Óbvio que, comparando a safra que produzimos no ano passado com a safra deste ano, sentimos o impacto. Mas, para torrefações que compram cafés de outros produtores, o impacto foi bem mais significativo”, relata Isabelly. Apesar de sofrer menos com o problema que outras empresas do segmento, ela afirma que o cenário é preocupante.
“A oferta de café no Brasil está muito baixa, principalmente porque as grandes regiões produtoras, como o Sul de Minas, o Paraná e o Espírito Santo, tiveram muitos problemas com geadas, chuvas fora de época e o café caindo antes da colheita. Tudo isso reduziu o aporte de café disponível no mercado. Essa alta de preços é algo que, infelizmente, vai se agravar”, projeta.
“Para a gente, no mercado interno, a situação é preocupante, porque não há uma perspectiva clara de como a produção vai melhorar na próxima safra. Continuamos enfrentando os mesmos problemas, digamos assim”, acrescenta a empresária.
“Realmente é algo que, para a gente, enquanto compramos em maior escala, já é difícil. Imagine para quem vai ao supermercado e encontra o cafezinho lá. Isso vai se tornar ainda mais difícil e, infelizmente, um pouco mais caro também”, pontua.
Mercado se equilibra entre preço e exportação recordes
Na esfera nacional, a cadeia produtiva do café tenta se equilibrar entre o preço recorde no mercado internacional e um volume de exportação também recorde, enquanto se prepara para uma possível queda na produção entre 2025 e 2026, com eventual agravamento da situação climática nas principais regiões produtoras.
O preço do café arábica atingiu o maior nível em quase 50 anos devido à preocupação com as colheitas no Brasil, afetado este ano por importantes secas e também por fatores geopolíticos, como as interrupções no transporte no Mar Vermelho, as possíveis tarifas norte-americanas após a eleição de Donald Trump e a futura regulamentação da União Europeia sobre o desmatamento.
Além disso, a produção de café pelo Brasil na temporada 2025/26 deve cair 0,4%, para 65,6 milhões de sacas, de acordo com a primeira estimativa da StoneX para o próximo ano-safra. O volume é resultado de uma queda de 10,5% na produção do café arábica, estimada em 40 milhões de sacas. Os resultados refletem os efeitos climáticos distintos nas principais regiões produtoras. No Sul de Minas, maior região produtora de arábica, a fabricação deve recuar 5,1%, para 15,8 milhões de toneladas de sacas. Já no Cerrado Mineiro o aumento projetado é de 11,5%, para 6 milhões de toneladas de sacas.
A despeito desses problemas, em novembro deste ano, o Brasil exportou 4,66 milhões de sacas de 60 quilos (kg) de café, um resultado, 5,4% superior ao do mesmo mês de 2023. Com essas vendas, o setor cafeicultor estabeleceu um novo recorde, superando em 3,78%, no ano de 2024, o maior volume registrado até então, que era de 44,707 milhões de sacas em 2020.