Após semanas de intensa turbulência no mercado financeiro, o Congresso concluiu ontem a votação de três propostas que compõem o chamado pacote de corte de gastos do governo federal.
A mais polêmica delas foi a aprovação do Projeto de Lei (PL) 4614/24 que altera as regras de reajustes do salário mínimo e também do Benefício de Prestação Continuada (BPC), que ainda vai à sanção presidencial. Foi também a votação, entre as três propostas apresentadas, em que o governo teve sua margem mais apertada com 42 votos favoráveis e 31 contrários.
Pelo texto aprovado, o crescimento real do salário mínimo, ou seja, descontada a inflação, deverá ser de no mínimo 0,6% e de no máximo 2,5% ao ano, conforme parâmetros estabelecidos pelo arcabouço fiscal aprovado em agosto de 2023.
Vale lembrar que o pagamento de aposentadorias, pensões e alguns dos benefícios sociais, incluindo o BPC, são vinculados ao salário mínimo e qualquer alteração nessas regras traz impacto para quem os recebe.
Para o presidente do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE), Wandemberg Almeida, “isso tem um impacto significativo, pois a cada real aumentado no valor do mínimo, há uma pressão sobre as contas públicas. Sabemos que, em momentos como esse, às vezes é necessário tomar medidas mais amargas, mas com o intuito de evitar consequências graves no futuro”.
Por sua vez, o economista Davi Azim admite que “o salário mínimo ainda é algo muito aquém das condições ideais para que o trabalhador tenha uma vida digna. Porém, também há o outro lado, que é o empresário que paga muitos impostos e está lidando com um ambiente de negócios difícil no País. Então, ambos os lados são prejudicados por uma administração que, na minha opinião, carece de um pouco mais de organização financeira. Isso não é algo exclusivo deste governo”.
Outro ponto polêmico do projeto foram as mudanças para a concessão do BPC, especialmente para pessoas com deficiência. O texto aprovado pelo Congresso aponta, a priori, que a concessão do benefício fica sujeita à avaliação que conclua que o beneficiário tem deficiência de grau moderado ou grave, mas tal trecho deve ser vetado pelo presidente da República, segundo acordo costurado no Senado, após forte reação negativa quanto à medida expressada nas redes sociais.
Além do PL 4614/24, foram aprovados pelo Congresso nesta semana um projeto de lei complementar, que cria "reforços" ao arcabouço fiscal e traz regras para emendas parlamentares; e uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que traz alterações no abono salarial e no Fundeb, disciplina os chamados "supersalários", entre outros pontos.
A PEC foi promulgada ontem pelo Congresso. Já os projetos precisam ainda ser sancionados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O cálculo é que tal como aprovados os três projetos aprovados representem uma economia de R$ 70 bilhões em dois anos, ou cerca de R$ R$ 1,6 bilhão a menos que o estimado inicialmente pelo governo. (Com Agência Estado)
AJUSTE FISCAL X RENDA
Salário mínimo
As novas regras continuam prevendo reajuste acima da inflação, mais precisamente usando o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), e tendo relação com o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) registrado dois anos antes, mas trazem uma espécie de piso e de teto para o aumento anual do salário mínimo.
A medida visa limitar o crescimento das despesas dentro dos padrões estabelecidos pelo arcabouço fiscal. Com isso, descontada a inflação, o crescimento do salário mínimo deverá ser de, pelo menos 0,6%, ao ano, mas sem poder ultrapassar os 2,5% de aumento real. O governo calcula que a nova regra pode gerar uma economia de R$109,8 bilhões entre 2025 e 2030.
O impacto se dará, principalmente, para aposentados, pensionistas e pessoas beneficiadas por programas sociais vinculados ao salário mínimo.
Benefício de Prestação Continuada
O BPC é um direito da pessoa com deficiência e do idoso com 65 anos ou mais de receber um salário mínimo por mês se não tiver condição de se sustentar ou ser sustentado pela sua família e cuja renda familiar mensal per capita seja igual ou inferior a um quarto do salário-mínimo.
O texto aprovado pelo Congresso aponta, a priori, que a concessão do BPC fica sujeita à avaliação que conclua que o beneficiário tem deficiência de grau moderado ou grave, mas tal trecho deve ser vetado pelo presidente da República, segundo acordo costurado entre Senado e Governo.
Por outro lado, o Congresso entendeu que a renda do cônjuge e "companheiro não coabitante" — aquele que não mora junto — deixa de entrar no cálculo de renda familiar para ter acesso ao benefício, como na proposta inicial, o que na prática deixaria menos pessoas elegíveis ao BPC.
Foi mantida no texto, contudo, a obrigação de que o cálculo de renda familiar para a concessão do benefício deve considerar a soma dos rendimentos brutos mensais dos membros da família que vivem na mesma casa, o que hoje não é previsto.
Porém, eventual renda recebida por outro idoso a título de aposentadoria ou BPC não será considerada no cálculo. Isso permitirá que duas pessoas da mesma família continuem recebendo o benefício, por exemplo.
O Congresso também manteve a obrigatoriedade de atualização para cadastros a cada 24 meses e incluiu um dispositivo vinculando o pagamento do benefício às regras estabelecidas.
Haddad estima perdas em torno de R$ 1 bi com mudanças em pacote
As mudanças do Congresso no pacote de corte de gastos farão o governo deixar de economizar cerca de R$ 1 bilhão de recursos previstos, disse ontem o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O ministro apresentou a estimativa em café da manhã de fim de ano com jornalistas.
Ao apresentar o pacote de corte de gastos no fim de novembro, o governo projetava economia de R$ 71,9 bilhões em 2025 e 2026. Mesmo com mudanças significativas em alguns pontos das propostas, Haddad disse que a economia ficará em pouco mais de R$ 70 bilhões, com uma diferença "em torno de R$ 1 bilhão", ao desconsiderar as casas decimais.
De acordo com o ministro, a economia com a limitação dos supersalários no serviço público, desidratada nas votações, não afetou a estimativa porque o projeto não atinge o resultado primário do Poder Executivo, mas de outros Poderes.
Segundo Haddad, o maior impacto decorreu da retirada das mudanças previstas para o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) do pacote. Ele não deu um número sobre essa perda. O governo queria que o fundo fosse corrigido pela inflação oficial pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), em vez da correção atual pela receita corrente líquida da União, que permite reajustes acima da inflação.
O ministro justificou a proposta para mudar a correção do FCDF com base na reforma tributária do consumo recém-regulamentada pelo Congresso. Segundo Haddad, o Distrito Federal terá ganhos expressivos com a mudança da cobrança do futuro Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) no destino (local de consumo das mercadorias).
"Entendemos que a medida [mudança no FCDF] era justa por razão simples. O GDF [Governo do Distrito Federal] é o ente que mais ganha com reforma tributária. A partir do momento em que o imposto vai para o destino, o DF, local de alto consumo, terá ganhado com a reforma tributária. Entendemos que esse fundo teria de ficar dentro do arcabouço fiscal", declarou Haddad.
Também reforçou que o pacote de corte de gastos aprovado pelo Congresso representa apenas a "primeira leva" de medidas do ajuste fiscal do governo.
Ele afirmou que a revisão de despesas será permanente e que decidiu enviar as propostas agora, perto do fim do ano, para reduzir as incertezas em relação ao arcabouço fiscal.
"Apenas esse pacote não é o suficiente. Estamos chegando ao último dia do ano legislativo. Ou eu mandava agora para aprovar uma primeira leva de ajustes, ou deixava um pacote mais robusto para o próximo ano, o que geraria mais incerteza. Melhor submeter ao Congresso o que está pacificado entre os ministérios, o Legislativo, os deputados e senadores da base, do que esperar para ter uma coisa [economia de gastos] mais robusta, mais vistosa."(Agência Brasil)
ENTENDA AS PRINCIPAIS MUDANÇAS
Salário mínimo
As novas regras continuam prevendo reajuste acima da inflação, mais precisamente usando o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), e tendo relação com o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) registrado dois anos antes, mas trazem uma espécie de piso e de teto para o aumento anual do salário mínimo.
A medida visa limitar o crescimento das despesas dentro dos padrões estabelecidos pelo arcabouço fiscal. Com isso, descontada a inflação, o crescimento do salário mínimo deverá ser de, pelo menos 0,6%, ao ano, mas sem poder ultrapassar os 2,5% de aumento real. O governo calcula que a nova regra pode gerar uma economia de R$109,8 bilhões entre 2025 e 2030.
O impacto se dará, principalmente, para aposentados, pensionistas e pessoas beneficiadas por programas sociais vinculados ao salário mínimo.
Benefício de Prestação Continuada
O BPC é um direito da pessoa com deficiência e do idoso com 65 anos ou mais de receber um salário mínimo por mês se não tiver condição de se sustentar ou ser sustentado pela sua família e cuja renda familiar mensal per capita seja igual ou inferior a um quarto do salário-mínimo.
O texto aprovado pelo Congresso aponta, a priori, que a concessão do BPC fica sujeita à avaliação que conclua que o beneficiário tem deficiência de grau moderado ou grave, mas tal trecho deve ser vetado pelo presidente da República, segundo acordo costurado entre Senado e Governo.
Por outro lado, o Congresso entendeu que a renda do cônjuge e "companheiro não coabitante" — aquele que não mora junto — deixa de entrar no cálculo de renda familiar para ter acesso ao benefício, como na proposta inicial, o que na prática deixaria menos pessoas elegíveis ao BPC.
Foi mantida no texto, contudo, a obrigação de que o cálculo de renda familiar para a concessão do benefício deve considerar a soma dos rendimentos brutos mensais dos membros da família que vivem na mesma casa, o que hoje não é previsto.
Porém, eventual renda recebida por outro idoso a título de aposentadoria ou BPC não será considerada no cálculo. Isso permitirá que duas pessoas da mesma família continuem recebendo o benefício, por exemplo.
O Congresso também manteve a obrigatoriedade de atualização para cadastros a cada 24 meses e incluiu um dispositivo vinculando o pagamento do benefício às regras estabelecidas.