O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic) anunciou que o Brasil buscará defender os interesses dos produtores nacionais junto aos Estados Unidos na Organização Mundial do Comércio (OMC). O anúncio ocorre após confirmação de sobretaxa de 25% às importações de aço e alumínio dos Estados Unidos.
O esforço ocorrerá em coordenação junto ao setor privado e já existem reuniões previstas no ministério para as próximas semanas. A intenção é avaliar todas as possibilidades de ação no campo do comércio exterior e não há possibilidade de retaliar com imposição de sobretaxas aos produtos dos Estados Unidos, conforme anunciou o ministro da Economia, Fernando Haddad.
A taxação definida por Trump é uma forma de protecionismo às siderúrgicas americanas, que passam a concorrer em vantagem com produtos importados que chegarão mais caros aos Estados Unidos.
A indústria brasileira é uma das principais afetadas, por ser grande exportador de metal para os americanos. Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), os Estados Unidos são o destino de 54% das exportações de ferro e aço brasileiros.
Em nota conjunta publicada pelos ministérios das Relações Exteriores e do Mdic na tarde desta quarta-feira, o governo brasileiro lamenta a decisão.
“Tais medidas terão impacto significativo sobre as exportações brasileiras de aço e alumínio para os EUA, que, em 2024, foram da ordem de US$ 3,2 bilhões”.
O impacto da medida alcança o Ceará. As placas de aço produzidas no Complexo do Pecém são hoje o principal item da pauta de exportação e os Estados Unidos o principal destino. Em 2024, foram US$ 441,2 milhões em vendas de ferro fundido, ferro e aço, o que representa 79% do total exportado pelo setor no Estado, segundo levantamento do Observatório da Indústria.
Apesar da representatividade, o setor já sofreu com queda na demanda norte-americana no ano passado, de 40,2%. Além da ArcelorMittal Pecém, outras empresas nacionais, como Ternium, CSN e Usiminas também serão afetadas pela sobretaxa.
O governo brasileiro demonstra apoio ao sistema multilateral de comércio e considera “injustificável e equivocada” a imposição de barreiras unilaterais.
A OMC é uma instituição multilateral cuja função é regular o comércio internacional, negociar regras, gerir acordos comerciais e resolver disputas. Brasil e Estados Unidos são dois dos 166 países-membros da OMC, que abarca 98% do comércio mundial.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a ideia principal do governo é buscar negociação. A determinação de não retaliar as exportações vindas dos Estados Unidos foi dada pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Neste momento inicial, Lula quer "calma" e que a Fazenda prepare uma nota técnica sobre as propostas das siderúrgicas brasileiras, a fim de orientar as negociações com o governo americano.
"O presidente Lula falou ‘muita calma nessa hora’. Já negociamos outras vezes em condições até muito mais desfavoráveis do que essa”, disse a jornalistas após reunião com representantes do setor.
O Instituto Aço Brasil, organismo setorial que representa a indústria, afirma que mantém a expectativa de que o governo brasileiro consiga prosseguir com as negociações para restabelecer as bases do sistema de importação construído no primeiro governo de Donald Trump, em 2018, que vigorou até a terça-feira, 11.
Pelo mecanismo anterior, importações de aço brasileiras mantiveram-se isentas de imposto de importação, desde que respeitadas as cotas de entrada de 3,5 milhões de toneladas de semiacabados e 687 mil toneladas de laminados por ano.
"Durante todo o período de vigência do acordo, na modalidade "Hard Quota", os volumes estabelecidos pelas cotas foram rigorosamente respeitados", afirma o Aço Brasil. "Ressalte-se, como já dito, que a negociação de 2018 atendeu não somente o interesse do Brasil em preservar o acesso a seu principal mercado externo do aço, mas também o da indústria de aço dos Estados Unidos", diz ainda o instituto. (Com agências)
Ipea estima queda de 11,27% nas exportações de aço e alumínio; impacto de US$ 1,5 bi
A taxação de 25% dos Estados Unidos para a importação de aço e alumínio pode gerar queda de 11,27% das exportações brasileiras, estima o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O impacto seria de US$ 1,5 bilhão em exportação.
Uma nota técnica detalha que a sobretaxa "poderá ter impacto importante sobre o setor de metais ferrosos no Brasil". O Ipea ainda afirma que quedas na produção e nas importações, de 2,19% e 1,09%, respectivamente, devem ocorrer com a queda da demanda a partir da decisão de Donald Trump.
Em termos absolutos, a tarifa de 25% tem potencial de causar a perda de US$ 1,5 bilhão nas exportações, o equivalente a quase R$ 8,7 bilhões.
O impacto calculado em termos de volume comercializado na relação comercial entre os países pode chegar a 1,6 milhão de toneladas de aço e alumínio.
"O mercado norte-americano afeta diretamente mais de 10% do faturamento do setor (de ferro, aço e alumínio). E a dependência deste mercado é ainda maior no caso dos produtos semiacabados (placas e lingotes), visto que cerca de 90% das vendas brasileiras para os EUA concentram-se nesses produtos", assinala o Ipea.
Segundo o Instituto Aço Brasil, em 2024, o Brasil respondeu por quase 60% da demanda das usinas dos Estados Unidos por placas, de 5,6 milhões de toneladas. O Instituto reafirma que o não restabelecimento do acordo trará perdas não só para a indústria de aço brasileira, mas também para a indústria do aço norte-americana.
Tendo em vista o cenário, o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec) e vice-presidente executivo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Cavalcante, avalia que a implementação já era esperada e entende que é necessário aguardar o próximo passo dos Estados Unidos, visto que eles continuarão necessitando do produto brasileiro.
"O nosso aço é vendido para que a indústria americana o finalize e revenda. Não vejo essa medida como algo direcionado especificamente ao Brasil, mas trata-se de um movimento dentro do contexto global".
Para Ricardo, a grande questão é de onde os EUA passarão a demandar o aço a partir de agora. Por isso, entende que há espaço para abertura de diálogo.
"Acredito que essa questão será resolvida. Hoje, a indústria siderúrgica no Ceará faz parte de uma multinacional (a ArcelorMittal), e não está isolada. É uma filial da maior siderúrgica do mundo, que certamente saberá lidar com essa situação". (Com Agência Brasil)
CNI
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) informou que segue trabalhando para fortalecer as relações entre os dois países e que acredita em alternativas consensuais