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30 anos sem Ayrton Senna: grandes corridas, rivalidade nas pistas e polêmicas na F-1
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30 anos sem Ayrton Senna: grandes corridas, rivalidade nas pistas e polêmicas na F-1

Brasileiro, tricampeão mundial, tive disputas acirradas com o francês Alain Prost dentro e fora das pistas e se envolveu em polêmicas e brigas com outros pilotos pela sua personalidade
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Pôster de Ayrton Senna em Imola, na Itália, em 2019 (Foto: ANDREAS SOLARO / AFP)
Foto: ANDREAS SOLARO / AFP Pôster de Ayrton Senna em Imola, na Itália, em 2019

Desde 1º de maio de 1994, os domingos não são mais os mesmos para os amantes de Fórmula 1. Em 2024, a data marca 30 anos da morte do maior ídolo brasileiro no esporte automobilístico: Ayrton Senna da Silva, que teve a carreira precocemente interrompida no auge, aos 34 anos, após se chocar contra um muro na Curva Tamburello, no Autódromo Enzo e Dino Ferrari, em Ímola, na Itália.

Ídolo para além do esporte, Senna viria a se tornar um dos maiores motivos de alegria para os brasileiros nas décadas de 1980 e 1990, vencendo 41 das suas 161 corridas disputadas e sendo campeão mundial três vezes — em 1988, 1990 e 1991. Por meio das corridas marcantes, ultrapassagens históricas e títulos memoráveis que Ayrton transformou o “país do futebol” no “país da Fórmula 1”.

No sol ou na chuva — principalmente na chuva —, o piloto paulista desfilava com seu carro buscando a primeira colocação, sem tempo ruim ou adversidades, mostrando perseverança e elevando ao máximo o ditado de que “brasileiro não desiste nunca”. Foi esse modo de dirigir — e também de viver —, sempre se superando, buscando a primeira colocação, que encantou o mundo.

Para o comentarista de automobilismo da Grupo Globo, Rafael Lopes, de 40 anos, “determinação” era a palavra que melhor descrevia Ayrton. “Não era só talento que ele tinha, né? Era um cara determinado, que lutava mesmo quando não tinha um carro tão bom nas mãos. As melhores corridas dele, por exemplo, foram quando ele tinha ou algum problema no carro, como no GP do Brasil de 1991, ou quando o carro não era melhor”, relembra.

“A temporada de 1993 não teve título, ele foi vice para o (Alain) Prost, mas foi a melhor temporada da carreira dele, a meu ver, em termos de pilotagem com carro pior do que o da Williams. (...) Ele potencializou o talento dele, mesmo sem ter um carro tão bom quanto do rival nas mãos, e conseguiu fazer corridas históricas”, completou o comentarista.

Rafael ainda conta sobre a importância do Senna na época de sua ascensão, em um contexto de crise financeira vivido no País e a fim da Ditadura Militar. A forma como Ayrton demonstrava o orgulho de ser brasileiro, mesmo em tempos tão difíceis, era o que fazia sua conexão com os compatriotas ficar cada vez mais forte, opina o comentarista.

A prova desta conexão inquebrável está justamente no legado deixado pelo piloto. Trinta anos após a morte, seu nome, sua música tema nas vitórias e sua imagem levantando a bandeira do Brasil seguem vivos até mesmo em quem nem o viu em ação. “Não sei ao certo o primeiro momento que o conheci, sempre soou como se saber sobre ele e ser orgulhosa da história dele fosse algo intrínseco a ser brasileiro”, disse Júlia Duarte, colunista de Fórmula 1 do O POVO.

Para a jornalista de 24 anos, Ayrton Senna foi o grande responsável por popularizar a Fórmula 1 no Brasil. “Ele fez o povo se sentir parte de um esporte tão distante, popularizou um esporte de ricos e para ricos”, avaliou.

Corridas marcantes

Uma de suas corridas mais marcantes viria juntamente de seu primeiro título mundial, em Suzuka, no Japão, em 1988. Naquela corrida, Senna, que era pole position, teve um problema na largada e acabou caindo 16 posições.

A perda de colocações, no entanto, na pareceu abalar o brasileiro, que inclusive contou com uma velha amiga sua: a chuva. Em uma volta melhor que a outra, Senna conseguiu ultrapassar Prost, companheiro de equipe na McLaren e grande rival na carreira, na volta 28, em uma ultrapassagem histórica para tomar a primeira posição e conquistar seu primeiro título na categoria.

Em 1991, ocorrera, talvez, a sua corrida mais emblemática na carreira, justamente em um dos palcos que faltavam em sua estante de vitórias na F1: o Grande Prêmio do Brasil. Em Interlagos, Ayrton Senna enfrentou outra adversidade quando, na reta final da corrida, o piloto brasileiro perdeu todas as cincos primeiras marchas do seu carro e teve de dirigir usando apenas a sexta, exigindo um esforço físico extremo.

O esforço feito por Senna para vencer a prova foi nítido no final da corrida. No rádio, o piloto brasileiro gritava em comemoração à vitória e por causa da dor física causada pelo esforço fora do comum. A cena marcante de Ayrton levantando, com muita dificuldade, o troféu ao final da prova está marcado na mente de milhões de brasileiros até os dias de hoje.

Rafael conta que ainda lembra de alguns detalhes dessa corrida, mesmo que ainda criança. “Foi impressionante que o que aconteceu naquele dia. (...) acho que matéria de torcedor, de emoção, essa corrida foi a mais emocionante”, relembrou.

Outra corrida marcante é a de Donington, em 1993. O narrador do Grupo Globo Bruno Fonseca, de 35 anos, conta em entrevista ao O POVO que ainda se impressiona ao assistir. “Eu acho que é ali onde ele mostra todo o talento dele. Claro que tem as provas de Mônaco, a capacidade que ele tinha de correr ali que é um circuito super técnico, apertado e difícil. Mas essa corrida (Donington, 1993), se eu tivesse que citar uma, seria essa”, pontuou o narrador.

A rivalidade Senna x Prost

Quando se pensa em rivalidade nos esportes é impossível não lembrar da relação de extrema competição entre Ayrton Senna e Alain Prost. Corridas marcantes, relacionamento nada amistoso e, literalmente, colisões entre os dois rivais marcaram as carreiras dos dois pilotos.

Tudo começou em 1984, ano de estreia do brasileiro na Fórmula 1, na sexta corrida daquela temporada, no circuito de Mônaco. Naquela pista, Senna vinha ganhando posições, até chegar próximo de Prost. Ayrton até tentou ultrapassar o francês, mas o diretor de provas da época, Jacky Ickx, encerrou a corrida, que acontecia sob forte chuva.

A decisão veio a partir de um pedido do francês Jean Marie Balestre, presidente da Federação Internacional de Automobilismo (FIA). Com a interrupção polêmica da corrida, Prost, compatriota de Jean Balestre, foi declarado campeão. Esta corrida marcaria apenas o primeiro de muitos embate entre os dois.

Os dois viriam a ser companheiros na McLaren, em 1988 e 1989. Apesar de defenderem a mesma equipe, a relação entre os dois não parecia tomar um rumo de amizade. Pelo contrário, a “novela” entre Senna e Prost ia ficando cada vez mais tensa.

Na segunda temporada juntos, em 1989, o primeiro sinal conflito direto aconteceu no GP de San Marino. A desavença ocorreu após o brasileiro ultrapassar o francês ainda na primeira volta da corrida, quebrando um acordo para que isso não fosse feito por nenhum dos dois na largada, buscando evitar um acidente.

Para “burlar” o trato, Ayrton Senna realizou a manobra numa segunda largada, após um problema na primeira. No final da prova, o piloto brasileiro venceu a corrida e esquentou ainda mais a relação com europeu.

Um novo episódio aconteceria em 1989, no Grande Prêmio do Japão, em Suzuka. Com título a ser disputado entre os dois rivais, eles colidiram durante uma ultrapassagem do brasileiro.

Após o acidente, o Senna gesticulou para que os técnicos de pista empurrassem o carro, fazendo-o voltar para a corrida após cortar caminho pela chicane, um desvio na pista. Já Prost abandonou o carro e a prova, mas seguiu caminho para sala dos comissários, acusando o adversário de realizar uma manobra ilegal.

A acusação foi acatada, e Senna foi desclassificado, decisão que consagrou o francês como campeão mundial daquele ano e gerou uma multa de 100 mil dólares e seis meses de suspensão para o brasileiro, que acusou o então presidente da Federação Internacional do Automóvel (FIA), Jean Balestre, de favorecer o compatriota.

Mas como em um filme roteirizado, os rivais decidiriam novamente um campeonato mundial no ano seguinte, também no Japão. Contudo, no dia 21 de outubro de 1990, foi a vez de Ayrton sair com a vitória.

Largando na pole position, o ídolo brasileiro viu uma troca estranha, que o fez largar no “lado sujo” da pista de Suzuka, dando vantagem para Prost, que saía logo atrás, em segundo. A vantagem realmente aconteceu e o francês partiu na frente, tomando a liderança de Senna.

O posto não durou muito, já que Senna acertou o carro do francês, impossibilitando os dois de prosseguirem a corrida e garantindo o bicampeonato do brasileiro. Encerrava-se ali um dos capítulos mais emblemáticos da rivalidade.

Para Nathalia De Vivo, editora do site F1Mania, a rivalidade entre Prost e Senna foi uma das mais icônicas e memoráveis da F1, servindo também para impulsionar os dois. “Acho que uma rivalidade assim acaba tendo uma importância para a carreira do piloto, porque ele ganha a motivação extra de querer superar aquele adversário”, ponderou.

A jornalista de 31 anos acredita ainda que a disputa contra o francês também serviu para aumentar a admiração dos fãs, que viam Ayrton Senna vencer um oponente declarado. “Acho que isso também acabou atraindo muita gente para acompanhar as corridas na época, acho que fez o Senna ser ainda maior aos olhos dos brasileiros”, complementou.

Polêmicas, brigas e controvérsias de Senna

O “troco” contra Alain Prost foi apenas um dos episódios que mostravam a personalidade forte e controversa de Ayrton Senna da Silva, tanto dentro quanto fora das pistas. Falas polêmicas, brigas físicas e uma competitividade única estavam ligadas à imagem do ídolo brasileiro.

Ainda sobre o acidente com o rival francês em 1990, no Japão, Ayrton deu uma de suas repostas mais marcantes, em entrevista para o ex-automobilista Jackie Stewart. “Se você não busca uma lacuna que existe, você não é mais um piloto de corrida. Nós estamos competindo para vencer”, disse o brasileiro, ao ser questionado se não deveria ter abdicado da ultrapassagem para evitar o acidente.

A forma “agressiva” de pilotar não rendeu abraços. Elio de Angelis, em 1985, e Nigel Mansell, em 1987, foram alguns dos que partiram para as vias de fato com o piloto brasileiro após discussão sobre manobras nas pistas.

Em 1992 e 1993, foi a vez de Senna perder a paciência com manobras dos iniciantes Michael Schumacher e Eddie Irvine, respectivamente. No conflito com o primeiro, “apenas” uma puxada pelo colarinho foi o suficiente para a briga ser separada, em Hockenheim, na Alemanha.

Já o segundo não teve a mesma “sorte”. O brasileiro reclamou da forma agressiva como o norte-irlandês dirigia e, após discussão nos boxes do GP do Japão, acertou um soco em Irvine.

Tratado como arrogante e prepotente por alguns, Ayrton, no entanto, conseguia aproximar mais pessoas para acompanhá-lo pilotando, sempre na narrativa de “Senna x rival”. Nathalia De Vivo afirma que o comportamento também mostrava um lado humano de Senna, um lado imperfeito.

A jornalista diz que as atitudes serviam para as pessoas verem que “ele é 'gente como a gente', tem os mesmos comportamentos, sentimentos, não é aquela pessoa distante e que acaba sendo meio robotizada”. “Acho que isso dava ainda mais personalidade ao ídolo, que não era aquele cara que colocava capacete, corria e acabou”, completou a editora da F1Mania.

E se, para alguns, Senna era arrogante, prepotente e agressivo na pista, pouco importava para os brasileiros, que viam em Ayrton mais do que um piloto: era a imagem de ídolo. Um ídolo que virou lenda pela forma como morreu, pilotando, fazendo o que fazia de melhor — e era considerado o melhor por muitos. Para sempre na memória dos brasileiros, tendo-o visto ou não, estará marcado o nome de Ayrton Senna Silva. Ayrton Senna, do Brasil.

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