PROTEÇÃO O Brasil assistiu estarrecido a um filme de terror imposto de forma cruel, interesseira, hipócrita e inescrupulosa. A Câmara dos Deputados aprovou regime de urgência para votação de um Projeto de Lei (PL) que equipara o aborto legal após 22 semanas ao crime de homicídio. A criança ou a mulher que for vítima de um estupro poderá ter pena maior do que a do próprio estuprador. É uma das maiores ameaças às meninas brasileiras dentro de um cenário epidêmico de abuso sexual infantil.
Os argumentos que justificam tal barbaridade são dos mais diversos, passam por religião, conservadorismo, preservação à vida e, principalmente, pura politicagem. Mas claramente é, mais uma vez, o modus operandi de um sistema social no qual as mulheres e seus corpos simplesmente não importam. E isso, desde antes de aquele corpo completar um ano de vida.
No Ceará, em 2024, de acordo com dados da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), dos 712 crimes sexuais registrados (estupro, estupro de vulnerável e exploração sexual de menores), 78% têm como vítimas meninas de até 17 anos. Foram 11 bebês de um ano, 30 casos envolvendo crianças de três anos, 83 registros com meninas de 12 anos, 82 casos com meninas de 13 anos…
Ainda não faz parte dessa estatística, mas outra menina de 13 anos, em Catunda, a 256km de Fortaleza, era dopada pelo pai para que ele a estuprasse. Preso na última sexta-feira, 14, o homem de 48 anos dizia à filha que a medicação era para cólica menstrual, mas na verdade, de acordo com a Polícia, era sonífero. O crime de estupro de vulnerável só foi denunciado pela família com o auxílio do Conselho Tutelar.
O caminho até que um estupro vire caso de Polícia é longo. A criança precisa denunciar, alguém acreditar nela, levar à delegacia, fazer exames... 22 semanas de uma gestação após um estupro passam voando. O maior crime que este Projeto de Lei representa é aquele em que o Estado brasileiro, em seus diferentes entes e atores, não consegue proteger nem as suas crianças.