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Hélio Júnior Bezerra: um guarda municipal que transformou uma cidade com música
Farol

Hélio Júnior Bezerra: um guarda municipal que transformou uma cidade com música

Professor, maestro e servidor público municipal de Croatá, Hélio Júnior desenvolve projetos com crianças, jovens e adultos por meio da musicalização
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Hélio Júnior é  maestro da Orquestra Filarmônica Estrelas da Serra (Foto: Divulgação/ Andreia Santos )
Foto: Divulgação/ Andreia Santos Hélio Júnior é maestro da Orquestra Filarmônica Estrelas da Serra

Com o erguer da batuta o maestro alerta aos músicos que o show já vai começar. Com um estalar de dedos e um metrônomo, o professor alinha o ritmo dos instrumentos daqueles que estão aprendendo. Vestido de azul marinho e com botas pretas, o guarda municipal segue para mais um dia de trabalho.

Assim é a vida de Hélio Júnior Bezerra, natural de Croatá, na região da Ibiapaba. As paixões dele pelo ensino e pela música têm transformado a vida de inúmeras crianças, jovens e adultos. As aulas de educação musical são ofertadas gratuitamente no ponto de cultura "Vamos Fazer Arte", no Centro do Município.

Além da idealização do ponto de cultura, Hélio é regente da Orquestra Filarmônica Estrelas da Serra, em exercício desde 2009. O time de músicos viaja pelo Brasil junto à empresa de transporte Expresso Guanabara, levando cultura, autenticidade e, acima de tudo, amor em notas musicais. Ao O POVO, o maestro fala de seus projetos, parcerias e de como a cultura pode mudar vidas.

O POVO - De onde surgiu o seu gosto pelo trabalho com musicalização e desenvolvimento das competências artísticas dos meninos que você acompanha?

Hélio Júnior Bezerra - O gosto pelo ensino surgiu da experiência que vivia antes de ser guarda municipal, com alunos particulares, de modo que eu percebia que muitas crianças ficavam curiosas quando viam meus alunos tocarem, ou viam a banda de música tocando, mas essas crianças não tinham condição de pagarem pelo ensino. Logo, quando me estabilizei financeiramente como funcionário público, tive a condição de planejar e colocar em prática a disponibilização de ensino gratuito.

OP- Como surgiu o ponto de cultura Vamos Fazer Arte?

Hélio Júnior Bezerra - O ponto de cultura Vamos Fazer Arte surgiu da parceria com o Silvério Oliveira (músico da banda de música municipal João Otaviano), que já ensinava flauta doce para um grupo de 15 crianças. O mesmo passava por dificuldades de apoio para desenvolver as atividades e me uni a ele para ajudar no processo de ensino. Institucionalizamos o projeto que se chamava Vamos Fazer Arte, e a partir daí iniciei os trabalhos de formação musical, objetivando a formação da Orquestra Filarmônica Estrelas da Serra.

OP - Você além de musicista é guarda municipal. Enxerga os projetos desenvolvidos no ponto de cultura - no caso o grupo de flauta doce, a camerata e a orquestra - como uma forma de afastar seus alunos de situações de vulnerabilidade?

Hélio Júnior Bezerra - Sim, sem sombra de dúvidas. Esse foi o maior motivo que me fez querer trabalhar com o ensino de música para crianças e adolescentes. Sempre estive na linha de frente da guarda em parceria com a Polícia do município, com ações ostensivas de combate às drogas em Croatá. Nunca concordei com as abordagens truculentas e percebi que aquilo não era o que resolveria o problema. Via que o município precisava de uma intervenção com trabalho de prevenção desde muito cedo. Foi aí que procurei o Silvério, que já fazia esse trabalho, e propus ajudá-lo para podermos buscar condições de ampliar as ações e atender cada vez mais crianças. Visto que neste período Silvério não tinha apoio e já pensava em parar com o projeto. Silvério topou, e, em menos de dois anos, já atendíamos quase 100 crianças e já tínhamos formado a Orquestra Filarmônica Estrelas da Serra.

OP - Você é o maestro regente da Orquestra Filarmônica Estrelas da Serra, que faz inúmeros concertos a nível municipal, estadual e nacional. O que o projeto da filarmônica significa para você?

Hélio Júnior Bezerra - Significa a sensação de dever cumprido. Através da filarmônica, que é uma das maiores referências, se não a maior da música instrumental do interior do Estado, foi que tivemos a oportunidade de levar nossa arte por muitas cidades e estados do Brasil e por meio dela conseguimos admiradores e apoiadores disposto a acreditar e fazer investimentos em um projeto localizado em uma pequena cidade distante de tudo. Como a política de apoio a projetos pelas empresas é pautada em patrocinar quem está em seu entorno, a chance de uma grande empresa apoiar nossa causa era “zero”, pois estamos bem distantes de tudo e de todos, sem falar que nossa cidade não tem atrativo comercial e nem de alcance que chame a atenção de algum apoiador empresarial. No entanto, graças a algumas reportagens de nossa orquestra pelos veículos de comunicação como o jornal O POVO foi que o gerente de marketing da Expresso Guanabara conheceu nosso projeto e se interessou em conhecer, de modo que ela se tornou nossa primeira empresa patrocinadora. Até hoje patrocina e apoia nossos projetos e fomentou o crescimento e o desenvolvimento de nossas ações, que atraíram outras empresas como a Enel e a Grendene, que graças às leis de incentivo à cultura como mecenato estadual e Lei Rouanet, nossa instituição hoje é quem gera mais emprego dentro do município de Croatá depois da Prefeitura. A palavra que resume isto é gratidão e orgulho do que foi construído em parceria.

OP - Além do ponto de cultura e da orquestra, você trabalha também com a Associação Arte em Pauta. Qual o intuito da associação e quais projetos vocês desenvolvem lá?

Hélio Júnior Bezerra - A Associação Arte em Pauta é a instituição que criamos para respaldar o Projeto Vamos Fazer Arte, que foi reconhecido pelo MinC [Ministério da Cultura] e pela Secult-CE [Secretaria da Cultura do Ceará] como ponto de cultura. Como falei, foi uma das medidas de institucionalização que adotei para que pudéssemos buscar apoio e patrocínio financeiro para custeio das atividades. Funciona assim: a associação é a instituição que legaliza e rege todos os projetos, como ponto de cultura Vamos Fazer Arte, que é a escola de música, a Orquestra Filarmônica Estrelas da Serra, que é o fruto das atividades de ensino de música do ponto de cultura, assim como também tem os outros grupos, como a Camerata de Violões, cordas que cantam, e o grupo de flauta “Doce Melodia”. Os grupos musicais são os frutos do ensino de música. Outras atividades e projetos também são realizados, como cursos profissionalizantes na área do audiovisual, com cursos de técnico de som; técnico de iluminação; fotografia; edição de vídeo; mixagem e produção de áudio em homestudio. A entidade ainda realiza projetos voltados para a infância nas escolas, ações de salas de cinema e também realiza sempre que consegue patrocínio do Festival Mostra de Arte na Ibiapaba (Festmais).

OP - Alguns alunos seus foram aprovados como sargentos músicos no Exército e na Marinha do Brasil. Como o ponto de cultura auxilia na preparação dos alunos para a seleção?

Hélio Júnior Bezerra - Já foram quatro músicos aprovados como sargentos músicos da Marinha, bem como um aprovado como sargento músico do Exército e outros sete músicos cursando graduação em licenciatura e bacharelado em música nas Universidades Federais do Cariri e do Rio Grande do Norte. Nossa instituição faz um trabalho de preparação dando apoio na formação musical e intelectual para as provas teóricas e práticas, além de auxiliar com custeio de exames médicos, tratamentos dentários e, em parceira com a Expresso Guanabara, concede as passagens dos músicos para realização das provas em todas as fases dos testes que ocorrem durante todo o ano.

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