O presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, protagonizou ontem uma tentativa frustrada de golpe de Estado. Ele chegou a decretar lei marcial e mandou o Exército cercar o Parlamento, mas acabou recuando após uma onda de protestos e revogou o decreto.
O golpe frustrado mostra como a democracia é frágil, mesmo em países onde ela parece consolidada. A Coreia do Sul viveu um regime autoritário até 1988 - mesmo ano que o Brasil aprovou sua Constituição democrática. Durante a ditadura sul-coreana, o regime incentivou o crescimento de conglomerados industriais familiares, como Daewoo, LG, Hyundai e Samsung, que transformaram o país em uma das maiores economias do mundo.
A democracia foi estabelecida após vários protestos populares, incluindo alguns violentos, como a Revolta de Gwangju, de 1980, que terminou com 2,3 mil mortos. A lei marcial decretada ontem por Yoon fez muitos sul-coreanos se lembrarem dos anos de chumbo.
Algumas cenas vistas ontem em Seul, quando manifestantes se colocaram à frente de veículos blindados, também evocaram outros protestos populares históricos, como o Massacre da Paz Celestial, em 1989, na China.
O presidente sul-coreano declarou lei marcial após acusar a oposição de tentar derrubar a democracia e se alinhar aos interesses da Coreia do Norte, ao não aprovar o orçamento de 2025 e por votar o impeachment de membros de seu gabinete. Imediatamente, a oposição convocou a reunião de emergência para derrubar o decreto de Yoon.
Barricadas
Os deputados, no entanto, precisaram passar por barricadas montadas por policiais e soldados, que isolavam o Parlamento por ordem do presidente. Alguns entraram pelas janelas, de acordo com relatos da mídia sul-coreana. A lei marcial acabou sendo rejeitada por unanimidade.
Depois da votação, os soldados deixaram o prédio da Assembleia Nacional. Os militares, contudo, afirmavam que a lei marcial continuaria em vigor enquanto Yoon não a revogasse - o que acabou acontecendo hoje (horário local).
O impasse é resultado de um governo com viés autoritário sem maioria no Parlamento. Yoon foi eleito por menos de 250 mil votos (0,73%), em 2022. Sua legenda, o Partido do Poder Popular (PPP), trava uma queda de braço no Parlamento com o Partido Democrata (PD), de caráter liberal.
Além de divergências sobre o orçamento, Yoon também tem rejeitado pedidos de investigações de escândalos envolvendo sua mulher e altos funcionários de seu governo, o que vem destruindo seus índices de popularidade.
O líder de seu partido no Parlamento, Choo Kyung-ho, disse que não foi informado do decreto e ficou sabendo da lei marcial por meio da imprensa. Ele afirmou que integrantes do próprio PPP foram impedidos de entrar no Parlamento para votar contra o decreto de Yoon.
Em uma dramática transmissão ao vivo pelo YouTube, Lee Jae-myung, líder da oposição, pediu aos sul-coreanos que se reunissem diante do Parlamento, enquanto ele estava a caminho. "Não há razão para declarar lei marcial. Não podemos deixar que os militares governem de novo este país", disse. "Yoon Seok Yeol traiu o povo. A partir deste momento, ele não é mais o presidente da Coreia do Sul."
Repressão
A Constituição da Coreia do Sul afirma que o presidente pode decretar a lei marcial "para lidar com uma necessidade militar ou manter a segurança e a ordem por meio da mobilização de forças militares, em tempo de guerra ou emergência nacional". Se tivesse vingado, ela proibiria todas as atividades políticas, colocaria a imprensa sob controle do Estado e vetaria greves e protestos. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)