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Morre Jimmy Carter, ex-presidente dos EUA, aos 100 anos
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Morre Jimmy Carter, ex-presidente dos EUA, aos 100 anos

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EX-PRESIDENTE dos EUA Jimmy Carter (Foto: Emmanuel DUNAND / AFP)
Foto: Emmanuel DUNAND / AFP EX-PRESIDENTE dos EUA Jimmy Carter

Jimmy Carter, o ex-presidente democrata que governou os Estados Unidos de 1977 a 1981 e ganhou o Nobel da Paz, morreu neste domingo (29) aos 100 anos de idade, em sua casa em Plains, na Geórgia, seu estado natal, anunciou sua fundação.

Ele morreu "pacificamente [...] rodeado por sua família", disse o Centro Carter em um comunicado.

"Meu pai foi um herói, não só para mim, mas para todos que acreditam na paz, nos direitos humanos e no amor altruísta", afirmou Chip Carter, filho do ex-presidente, no comunicado.

O presidente mais longevo da história dos Estados Unidos, que sobreviveu vários anos após ser diagnosticado com câncer cerebral em 2015, recebia cuidados paliativos em sua casa desde fevereiro de 2023.

Jimmy Carter foi "um homem de princípios, fé e humildade", disse o presidente americano Joe Biden. "Os Estados Unidos e o mundo perderam um líder extraordinário, estadista e humanitário", afirmaram Biden e sua esposa Jill em um comunicado, no qual também anunciaram que haverá um funeral de Estado para Carter, democrata que governou de 1977 a 1981.

"Para qualquer pessoa em busca do que significa viver uma vida com propósito e significado — a boa vida — estude Jimmy Carter, um homem de princípios, fé e humildade."

O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, disse que os americanos têm uma "dívida de gratidão" com o ex-presidente democrata Jimmy Carter.

"Os desafios que Jimmy enfrentou como presidente ocorreram em um momento crucial para nosso país e ele fez tudo o que estava ao seu alcance para melhorar a vida de todos os americanos", declarou o republicano nas redes sociais. "Por isso, todos nós temos com ele uma dívida de gratidão."

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva lamentou o falecimento do ex-presidente norte-americano Jimmy Carter que, segundo ele, foi um "amante da democracia e defensor da paz". Carter, que governou os Estados Unidos entre 1977 e 1981, ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 2002.

"No fim dos anos 70, pressionou a ditadura brasileira pela libertação de presos políticos. Depois, como ex-presidente, continuou militando pela promoção dos direitos humanos, pela paz e pela erradicação de doenças na África e na América Latina. Carter conseguiu a façanha de ter um trabalho como ex-presidente, ao longo de décadas, tão ou mais importante que o seu mandato na Casa Branca. Criticou ações militares unilaterais de superpotências e o uso de drones assassinos", elencou o presidente brasileiro, em suas redes sociais.

Lula destacou ainda que Carter trabalhou junto com o Brasil na mediação de conflitos na Venezuela e na ajuda ao Haiti. O Centro Carter, acrescentou, é uma "referência mundial" em democracia, direitos humanos e diálogo.

"Será lembrado para sempre como um nome que defendeu que a paz é a mais importante condição para o desenvolvimento. Meus sentimentos aos seus familiares, amigos, correligionários e compatriotas nesse momento de despedida", concluiu Lula.

O ex-presidente  é lembrado como um mediador em conflitos globais, defensor dos direitos humanos e estadista, um papel que lhe rendeu o Nobel da Paz.

O presidente democrata, cujo mandato de 1977 a 1981 foi marcado pela crise dos reféns no Irã, deixou a Casa Branca após uma derrota esmagadora nas urnas para o republicano Ronald Reagan.

Considerado ingênuo e fraco nos círculos políticos de Washington, e até mesmo dentro de seu próprio partido, este fervoroso cristão evangélico da Geórgia, que deu aulas na escola dominical até os 90 anos, foi por muito tempo uma espécie de pária.

Porém, com o passar dos anos, sua imagem mudou, graças às suas atividades pós-presidência e aos seus feitos, como a negociação de um acordo de paz entre Israel e Egito.

Carter, conhecido por seu sorriso característico, focou seu mandato como o 39º presidente dos Estados Unidos nos direitos humanos, na justiça social e nos valores democráticos.

Sua política em relação à América Latina refletiu esses princípios. Sua administração denunciou os abusos das ditaduras militares no Cone Sul, retirou o apoio ao regime de Somoza na Nicarágua e comprometeu-se a devolver o Canal do Panamá aos panamenhos.

Da fazenda à Casa Branca

James Earl Carter Jr. - seu nome completo que raramente usava - nasceu em 1º de outubro de 1924 em Plains, Geórgia, ao sul de Atlanta, uma pequena cidade onde viveu a maior parte de sua vida.

Após sete anos na Marinha, onde trabalhou no programa de submarinos nucleares e chegou ao posto de tenente, Carter voltou para casa para administrar a fazenda de cultivo de amendoim da família.

Mas a política logo chamou sua atenção. Ele foi senador estadual na Geórgia nos anos 1960 e, em 1971, tornou-se governador. Poucos anos depois, lançou sua candidatura à presidência.

Carter chegou a Washington em 1977 para liderar um país que precisava de um líder capaz de dissipar o pessimismo deixado pela guerra do Vietnã, o escândalo de Watergate e uma profunda recessão. 

Sua chegada foi cheia de promessas, e seu Partido Democrata controlava tanto a Casa Branca quanto o Congresso pela primeira vez desde 1968. Ele desfrutou de dois primeiros anos com altos índices de aprovação.

Foi quando conseguiu convencer o Senado, em 1978, a ratificar os tratados assinados um ano antes com o líder panamenho, general Omar Torrijos, para devolver o Canal do Panamá ao país latino-americano. Carter descreveu essa conquista como "a batalha política mais difícil” que já enfrentou.

"Extraordinariamente difíceis"

Entre os momentos de destaque de seu mandato estão os históricos Acordos de Camp David de 1978, assinados por Menachem Begin, de Israel, e Anwar Sadat, do Egito, que resultaram em um tratado de paz no ano seguinte.  

Carter também estabeleceu relações diplomáticas com a China, após uma aproximação iniciada pelo governo de Richard Nixon, e negociou com o regime de Fidel Castro, em Cuba, a reabertura das sedes diplomáticas na forma de Seções de Interesses.  

No entanto, o final de seu mandato foi marcado pela ocupação da embaixada americana em Teerã por islamistas radicais em novembro de 1979, e pelo fracasso da operação de resgate de cerca de 50 reféns americanos em 1980. Eles só foram libertados em 20 de janeiro de 1981, mesmo dia da posse de Reagan.  

Sua gestão durante a segunda crise do petróleo, entre 1979 e 1980, também foi alvo de críticas. Imagens de filas de carros nos postos de gasolina ficaram associadas por muito tempo aos "anos Carter".  

Após sua derrota eleitoral, os republicanos permaneceram 12 anos na Casa Branca, com Reagan e, em seguida, George H.W. Bush. Até hoje, poucos líderes democratas reivindicam o legado de Carter.  

Em uma biografia de 2010, o historiador Julian Zelizer afirmou que Carter foi vítima de "uma série de circunstâncias extraordinariamente difíceis que desafiariam qualquer presidente".  

"Ser um 'outsider' em Washington foi tanto uma bênção quanto uma maldição", escreveu Zelizer, professor da Universidade de Princeton.  

"O melhor ex-presidente"

Mas Carter conseguiu se reinventar e ganhou o apelido de "melhor ex-presidente" dos Estados Unidos.  Ao deixar o poder, aos 56 anos, iniciou um novo capítulo como líder do Centro Carter, fundado em Atlanta.  

Ele supervisionou dezenas de eleições em todo o mundo, em países como México, Peru, Nicarágua, Haiti e Timor-Leste, e viajou a Cuba em 2002, onde discursou em espanhol sob o olhar atento de Castro.  

Em 2002, recebeu o prêmio Nobel da Paz por "suas décadas de esforços incansáveis em favor da resolução pacífica de conflitos internacionais, do avanço da democracia e dos direitos humanos".  

Carter manteve uma agenda intensa até os 90 anos. Ele e sua esposa Rosalynn ajudaram a construir casas para a organização beneficente Habitat for Humanity por décadas. O casal teve três filhos e uma filha.  

Em agosto de 2015, Carter revelou que tinha câncer no cérebro e estava passando por radioterapia.  

Na ocasião, refletiu sobre sua vida: "A presidência foi, sem dúvida, o auge da minha carreira política [...], mas minha vida após deixar a Casa Branca foi mais gratificante no plano pessoal", afirmou.  

Quatro anos depois, durante uma celebração em 2019 em sua igreja batista em Plains, compartilhou que pensava que morreria rapidamente.  

"Eu não pedi a Deus para viver mais, mas pedi para ter uma atitude digna diante da morte. E percebi que estava completamente em paz com ela", disse.  

Carter foi o primeiro ex-presidente dos Estados Unidos a alcançar 100 anos de idade.

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