Quando Rênia Reis descobriu que estava com cancêr de mama, em novembro de 2023, ela havia recém iniciado no Triatlo. O diagnóstico a trouxe vários sentimentos, mas não tirou sua disposição. A cearense, atualmente com 45 anos, viu na espiritualidade e nas atividades físicas "alicerces" para superar a doença e hoje, amando ainda mais o corpo, usa sua história para inspirar e alertar outras mulheres.
Foi durante a infância que a advogada teve o primeiro contato com um esporte, iniciando no nado. Anos depois a corrida entrou na sua vida e permanece nela já há quase duas décadas. No entanto, foi no Triatlo (modalidade que combina natação, ciclismo e corrida) onde encontrou "seu lugar".
Ela começou a praticar o evento esportivo há pouco mais de um ano e estava no auge de sua disposição quando descobriu um nódulo ao tocar nos seios. O diagnóstico de cancêr foi um baque, principalmente quando soube que teria que retirar as mamas. Para ela foi a perda de um símbolo de feminilidade, sexualidade e do meio pelo qual amamentou seu filho, o pequeno Martin, hoje com quatro anos.
Mas nada foi capaz de tirar sua vontade de viver. Hoje ela está recuperada da doença, usa as redes sociais para incentivar outras mulheres e já se prepara para fazer o Ironman, prova que ocorre em agosto próximo. Em entrevista ao O POVO, Rênia conta como superou o momento difícil aliando esporte, espiritismo e uma rede de apoio feminina. Tudo sempre com um sorriso — cartão postal de seu rosto.
O POVO - Quando o esporte entrou em sua vida e qual sua ligação com ele?
Rênia Reis - Eu faço atividade física desde criança, sempre. Eu acho que porque minha mãe era sedentária e fumante, ela sempre, sempre me estimulou, eu e o meu irmão, a prática de atividades físicas. Minha mãe não nadava e eu nado super bem, desde bebê que eu nado. Minha mãe nunca correu, enfim, era fumante e sedentária. Então, o esporte sempre fez parte da minha vida e com a corrida isso se intensificou e com o triatlo é como se você finalmente encontrasse o seu lugar. É o meu lugar, eu me sinto super confortável fazendo as três modalidades. Eu corro há 18 anos, eu nado desde criança e o pedal é que está sendo o maior desafio nesse momento. Está sendo um desafio delicioso e fantástico.
OP - Você descobriu o câncer logo após entrar no triatlon. O que passou em sua cabeça no momento do diagnóstico? O que mudou em sua vida a partir dali?
Rênia Reis - Vários sentimentos surgem no momento que você recebe um diagnóstico desse, mas uma coisa que eu sempre mantive e eu tenho isso comigo até hoje é que, se tiver que enfrentar, eu vou enfrentar de cabeça erguida e com muita fé, eu tenho muita fé na espiritualidade, eu sou espírita, eu tenho isso muito forte na minha vida, a doutrina espírita faz parte e eu sempre fui uma pessoa positiva, mas não aquela positividade tóxica, entendeu? Uma positividade de que eu aceito o que a vida quer me proporcionar de aprendizado. Eu sei que não é fácil, mas eu sei que também passa.
Eu pensava, meu Deus, mas como é que eu posso estar com câncer se eu estou truando (indo bem) no Triatlo, se eu estou bombando, se eu estou, sabe, eu estou com energia, eu estou com muita disposição. Eu lembro muito bem disso, que ficou muito marcado. E aí no dia 23 de novembro, quando a minha mastologista disse que eu ia ter que tirar as mamas, aí eu senti a doença, eu acho que realmente. Até então eu estava só em exame, fechando diagnóstica e tudo mais.
E aí quando ela me disse que o protocolo de tratamento da gente começaria pela cirurgia e a adenomastectomia, no meu caso não serviria tirar só o quadrante, mas a mama por completo, aí eu senti um baque muito grande, porque as mamas representam a feminilidade da mulher, eu acho que no seu mais alto nível.
E para mim, elas eram muito caras, muito queridas, porque eu amamentei meu filho por dois anos e cinco meses. Eu sempre fui uma mulher que tive muito prazer, eu gosto do meu corpo, eu amo o meu corpo e sexualmente falando, era uma parte do meu corpo que eu sentia muito prazer, eram lindos (...) Mas eu vi também, na maneira como eu vejo as coisas. Chorei, sofri, passei um dia chorando, um dia inteiro, lembro demais, aí no outro dia eu olhei assim (e disse) 'quer saber? Eu vou virar uma paniquete aos 45 anos, o universo está me dando essa oportunidade, a espiritualidade, de crescer, de me transformar e ainda renovar o meu corpo, e é assim que eu levo, até hoje é assim que eu levo.
OP - Chegou a continuar com a prática de atividades físicas durante o tratamento?
Rênia Reis - Eu parei uns sete dias (pós cirurgia) (...) Mas acho que com uns 10 dias, 15 dias mais ou menos, eu já estava caminhando, fazendo caminhadas bem leves, porque eu preciso muito da atividade física na minha vida, e com 30 dias eu já estava na musculação. (...) Voltei com 30 dias para musculação e 60 dias contadinho ali no relógio, marcando no calendário desesperada, eu voltei para corrida e para natação muito suave ainda claro, mas voltei muito rápido.
OP - Considera que o esporte foi um aliado nesse momento? Em que sentido?
Rênia Reis - Eu sempre falo que o esporte e a minha espiritualidade me salvaram. A minha espiritualidade, porque eu sabia que aquilo ali tudo estava dentro de um plano maior, de um propósito, que hoje é um propósito que eu vivo. (...) O esporte, ele não foi um aliado, ele foi um alicerce. O esporte, a minha espiritualidade, a rede de apoio feminina que foi criada ao redor de mim, muitas amigas, muitas mulheres, principalmente no esporte, na corrida, através do esporte também eu tive essa rede de apoio, então o esporte não foi um aliado, foi um alicerce, eu estou viva hoje graças à espiritualidade e ao esporte.
E eu te digo isso não só por conta do tratamento, durante o tratamento. Mas quando eu tava fazendo o diagnóstico, descobrindo, investigando se era câncer mesmo, quando fechou o diagnóstico, meu nutricionista oncológico, a minha mastologista, a minha oncologista, meu fisioterapeuta oncológico, meus cirurgião plástico também, todos eles foram categóricos em dizer que o que me salvou foi a atividade física, foi o esporte, porque o meu sistema imunológico estava trabalhando contra o câncer, tanto é que não se espalhou, eu não tive esvaziamento de axila, eu não tive perda do mamilo, eu só tirei o tumor, fiz uma químio e fiz uma rádio. Então o esporte, ele fez com que o meu corpo não desistisse, e é o que eu sempre falo, eu nunca desisti de mim, e o esporte me ajudou nisso.
OP - Hoje você tem usado o Instagram para incentivar a prática de exercícios. Que mensagem deseja passar por meio da rede social?
Rênia Reis - Eu não estou no Instagram (...) para ser mais uma blogueirinha, né, que é muito de moda. As redes sociais criaram esse universo, mas eu estou aproveitando as redes sociais, a oportunidade de divulgar a maneira como eu lidei com o câncer, a maneira como eu levo o esporte na minha vida, para que outras pessoas percebam antes que aconteçam com elas, principalmente as mulheres. Eu sou feminista, eu estudo sobre, a gente tem uma carga muito grande nas nossas costas e hoje a gente discute mais (sobre isso). Eu estou emocionadíssima porque todas as mulheres passaram por algum tipo de desafio, dificuldade na vida, todas nós, e a ideia é colocar um holofote nisso para que outras se percebam nessas histórias, se reconheçam como mulheres que também tiveram suas dificuldades mas que nunca desistiram de si mesmas