Enquanto Jair Bolsonaro se recupera de nova intervenção cirúrgica, deixando-se fotografar convalescente e acamado, o PL da anistia está no centro de uma queda de braço para a qual convergem os três Poderes da República: Executivo, por meio da base de Lula e do próprio incumbente; Legislativo, pela ação de Hugo Motta (Republicanos-PB); e Judiciário, representado por membros do Supremo que se movimentam à socapa, nos bastidores, de modo a tentar evitar um acordão que beneficie não a "arraia-miúda" do golpismo, mas os "tubarões" - a exemplo do ex-presidente e dos militares que capitanearam a intentona antidemocrática naquele 8 de janeiro.
Ora, Motta, como já se disse, está no mato sem cachorro: de um lado o STF e do outro, o PL, cujos votos foram cruciais para elegê-lo comandante da Câmara, sucedendo a Arthur Lira. O que lhe resta? Ganhar tempo, claro, como esses dias sagrados da Semana Santa. Nesse intervalo, o deputado tenta costurar não um perdão sem critérios para a turba que foi às ruas defender que as forças armadas impedissem a posse do candidato eleito, mas um acerto entre as partes que compatibilize desejos inconciliáveis.
Afinal, à bancada do golpe não interessa a anistia para Débora Rodrigues e seu batom, tampouco para os desavisados vendedores de "pop corn" e de "ice cream" naquele domingo ensolarado. O objetivo do PL é tão somente livrar Bolsonaro da barra da Justiça. Daí que essa pauta não haja até agora entusiasmado sequer os bolsonaristas. Por uma razão: trata-se de artifício expressamente empregado para favorecer o ex-mandatário e seu grupo político.
Há, no entanto, muitos obstáculos pela frente, um dos quais é o próprio Motta, empoderado pelo Planalto e pelo STF, que vem assegurando retaguarda para que o parlamentar suporte a pressão. O outro é a fragilidade de qualquer matéria aprovada na Câmara e no Senado que contrarie decisões e princípios constitucionais. Nessa hipótese, o destino derradeiro de uma tal proposição, se bem-sucedida no Congresso, seria inevitavelmente o Supremo.