A arte e a Ignez Fiuza são fontes inesgotáveis de minha referência criativa. A residência de minha avó era um ambiente em que se respirava arte. As obras clássicas se misturavam às pinturas contemporâneas; os artigos de artesanato e galhos secos contrastavam com peças de opalina em composição de variadas decorações.
Desde pequena era levada pelos meus pais, para ver as exposições de arte e conhecer os diversos artistas, os da terra e os de fora que faziam parte do vasto universo da Galeria Ignez Fiuza.
Sou arquiteta há 20 anos. Fui influenciada indiretamente por minha avó na escolha profissional. Não é por acaso que três de seus netos se tornaram arquitetos. No meu trabalho, aprendi com ela a acrescentar elementos da cultura popular como status de valorização dos ambientes.
Tornei-me também designer de peças e passei a desenvolver uma linha de móveis soltos exclusivos com pegada vintage inspirada na memória afetiva das cômodas e cadeiras de balanço com palhinha da casa de minha avó.
Nesse ano em que se celebra o seu centenário, fico a refletir na multiplicidade de talentos desenvolvidos ao longo de sua vida, como a de decoradora, antiquarista, galerista, proprietária de restaurante, e ouso acrescentar, para minha felicidade, que minha avó foi também uma designer.
Recordo o saudoso restaurante e bistrô La Bohème na Praia de Iracema aberto em 1993, reunindo arte e gastronomia. Ignez criou com o artista amigo Chico Filho 60 cadeiras em ferro tendo o encosto no formato de paleta de cores com muita personalidade e arte. As cadeiras fizeram tanto sucesso que ela teve a ideia de fazer em miniaturas como souvenirs do La Bohème.
Com o designer Cesio Júnior e o filho arquiteto Cesar Ignez criou um inesquecível lustre com enormes braços em formato orgânico na sala principal de seu restaurante. Isso sem falar no bar revestido de cobre com desenhos de folhas iluminadas para o qual Ignez palpitou do começo ao fim de sua execução.
Gostava de me contar do seu gosto para juntar 'trecos", que iam desde pedaços de ferro recolhidos em sucatas aos pedaços de madeira desprezadas. Estes viravam matérias primas para as futuras criações. Ao partir, deixou dois galpões entupidos de variadas quinquilharias, para desespero da família e alegria dos arquitetos.
Ela também me dizia que para se conhecer bem a cultura de um povo, deve se começar pelo mercado. Em Fortaleza, era frequentadora assídua do Mercado Central e do Mercado São Sebastião, onde não cansava de adquirir tigelas de madeira, cestaria, trabalhos de cerâmica, copinhos de barro, cordas, talheres de chifre, renda de bilro dentre outros.
Apesar de ter enfrentado muitos dissabores na sua trajetória, a começar pela viuvez precoce com 5 filhos pequenos, Ignez nunca parou de sonhar e de entusiasmar-se. Posso dizer que se algum dia fosse perguntado à minha avó como ela realmente viveu, teria dito: "belamente, corajosamente e impetuosamente." n