Nas últimas duas semanas, uma intensa mobilização vem tomando conta das ruas e das redes sociais. Cidadãos comuns, movimentos de mulheres, direitos humanos, entidades de classe, políticos, estudiosos, artistas e influenciadores têm se posicionado vigorosamente contra o Projeto de Lei 1904/2024, que equipara a punição de abortos realizados após as 22 semanas de gestação em casos de estupro a pena por homicídio.
É importante balizar opiniões em dados. O Atlas da Violência, produzido pelo Ipea e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública revela que, no Brasil, 1 mulher é violentada sexualmente a cada 46 minutos. Meninas de até 14 anos são as principais vítimas. Estamos de falando de crianças que sofrem violência perpetrada, em geral, por pessoas próximas de seu convívio. Mas isso parece dizer nada àqueles homens de bem que nos representam no Congresso.
Quem busca o aborto legal após as 22 semanas de gestação são, na maioria dos casos, meninas e mulheres, negras e pobres, em situação de vulnerabilidade que encontram dificuldades de acessar o serviço público, além de terem que lidar com aspectos psicológicos associados ao ardor e ao trauma da violência, como a dor, o medo, a vergonha, a impotência e às vezes até o sentimento de culpa. É um somatório de aspectos que leva à demora em solicitar a interrupção da gravidez.
Quem se posiciona contra esse PL não está dizendo que as mulheres devem abortar. Ir contra esse descalabro visa não deixar desamparadas pessoas que já sofreram uma violência absurda. Se aprovada, esta lei é mais uma carga de agressão sobre essas mulheres.
Com a repercussão negativa e o recuo da bancada evangélica, a proposta será avaliada apenas após as eleições municipais, o que nos faz pensar que este Projeto de Lei se baseia muito mais numa questão de poder do que de um debate sobre legalidade. Voltando à mobilização da sociedade, fica o recado para a direita conservadora deste país: quem não pode com a formiga não atiça o formigueiro.