Em 2024, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa 34 anos, entre avanços e retrocessos legais, além do abismo existente entre a lei e a realidade. Sem dúvida, o ECA é o instrumento legal mais atacado da história democrática brasileira: redução da maioridade penal e toque de recolher são temas constantemente pautados no Congresso Nacional, denotando o eterno retorno à cultura menorista.
Ao mesmo tempo, obtivemos avanços importantes na proteção desses sujeitos de direitos, como a Lei Henry Borel, que estabelece medidas protetivas de urgência para crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica e familiar, além da criação do sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, que estabelece o procedimento de escuta especializada no âmbito dos órgãos da rede de proteção, fundamental para evitar os danos causados pela revitimização, e o depoimento especial, perante a autoridade policial e judiciária.
Instrumento ainda pouco mencionado, mas fundamental para interromper o ciclo da violência é a revelação espontânea, também prevista na lei supra, que consiste em um relato feito pela vítima ou testemunha da violência, de forma espontânea, a qualquer pessoa ou profissional de sua confiança, informando que foi ou que está sendo vítima de violência, ou que presenciou algum ato dessa natureza.
A cada hora, 180 casos de violência contra crianças e adolescentes são registrados no Brasil. Esta foi a média calculada entre todas as notificações recebidas de 1º de janeiro a 28 de abril de 2024. Dados do Datasus de 2022 confirmam que mais de 74 mil pessoas foram vítimas de estupro no Brasil. Desse total, 88,7% das vítimas eram do gênero feminino, das quais 60% tinham menos de 13 anos de idade.
Fazer uma escuta sensível e acolher o relato sem ar de espanto, corrobora para que a criança se sinta confiante e confortável. Ampliar esse debate nos canais de comunicação e capacitar, de forma permanente, profissionais da rede socioassistencial, da saúde e, sobretudo, da educação, principal porta de entrada, sobre a forma correta de acolhê-las é crucial para garantir a proteção integral de crianças e adolescentes.