“O poder é afrodisíaco", dizia o velho Ulysses Guimarães — que conhecia tudo do assunto, a política, digo. E não se entenda "afrodisíaco", apenas no sentido sexual. Uma vez perguntaram a Fernando Henrique Cardoso do que ele mais sentia falta, depois de ter deixado a Presidência da República. Sociólogo de formação, ele deu uma resposta simples e certeira: “Enquanto fui presidente nunca tive de abrir portas” (cito de memória). E, aqui, “porta” é no sentido literal, pois os salamaleques que acompanham o cargo também enlevam o coração dos poderosos.
Joe Biden insistia em não desistir. Afirmava ainda ter muito a oferecer ao povo americano, dizia ele, apresentando números para destacar sua administração.
Talvez essa mistura de sensações tenham levado o presidente dos Estados Unidos a demorar tanto a renunciar à reeleição. Por fim, tomou a decisão mais acertada para o seu partido, para os americanos, e para o mundo. Um novo mandato de Donald Trump seria um desastre de amplas proporções.
Logo após a desistência de Biden, o New York Times publicou um editorial elogiando o presidente. O jornal escreveu que “Biden fez agora o que Trump nunca fará: colocou o interesse nacional acima de seu próprio orgulho e ambição".
Para o candidato republicano o jornal nova-iorquino reservou as seguintes palavras: “Trump é um criminoso que desrespeita a lei e a Constituição, um mentiroso inveterado que não tem nenhuma causa maior do que seu interesse próprio e um político imprudente e indiferente ao bem-estar do povo americano”. Em seguida, anotou um dos perigos caso Trump volte à Presidência: “Em um segundo mandato, ele operaria com menos restrições, e ele e seus assessores deixaram claro que pretendem exercer o poder impiedosamente".
O jornal traçou um roteiro, comum aos populistas, que agem usando um segundo mandato para consolidar a implementação de um regime autocrata. A desistência de Biden pode dar um novo fôlego aos setores democráticos dos Estados Unidos para derrotar a extrema direita, como aconteceu na França.