Se, apesar de todas as lutas e conquistas sociais e políticas das mulheres através da história, alguém ainda tinha dúvidas sobre a importância feminina na sociedade de hoje, os Jogos Olímpicos de Paris 2024 provaram o quanto o desempenho delas foi determinante para o Brasil ser a 20ª maior potência do esporte mundial, a terceira maior das Américas e a maior da América do Sul.
Das 20 medalhas brasileiras, dez foram conquistadas por mulheres ou contaram com a participação feminina, no caso do judô por equipes mistas. Sem esses três ouros, duas pratas e cinco bronzes, o Brasil mudaria 44 lugares no ranking, despencando à 64ª posição. Mas há um adendo. A maioria dessas mulheres é negra.
Quando colocamos uma lupa sobre o processo eleitoral que se desenha em Fortaleza, a política nos informa o contrário. Nenhuma mulher foi confirmada candidata à Prefeitura da cidade, que é uma das maiores do país em termos populacionais. Nessa disputa, é relegado às mulheres o papel de coadjuvante. Ser vice? Sim. E só. Porque o protagonismo é branco-masculino. Tem sido assim. Basta fazer o exercício de olhar pra trás.
E é exatamente por me propor a isso que digo: a presença feminina - sobretudo a negra - na política nacional precisa se espelhar no esporte. Só assim teremos alguma possibilidade de viver o que a filósofa norte-americana Angela Davis prega: "quando uma mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela". Porque somos nós, mulheres pretas, que estamos na base de tudo: das famílias, das instituições e dos afetos.
Quando as políticas públicas nos alcançam e nos oportunizam alguma qualidade de vida, o mesmo acontece em outros estratos sociais. É um efeito crescente. Se posso fazer uma analogia: é regar a raiz para alcançar o topo. E isso deve valer para todos os espaços sociais, incluindo o educacional, no qual atuo como professora da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira (Unilab) e coordeno o Uniculturas, o maior projeto de extensão da instituição.
Lidar com a diversidade das alunas e dos alunos me põe frente a frente com inúmeras vulnerabilidades e, consequentemente, os desafios para superá-las. Como pessoa negra e africana no Brasil, me enxergo em muitas(os) dessas(es) jovens. Somos gêmeos de muitas dores, mas também de sonhos. A começar pelas tecnologias de sobrevivência que nós, mulheres, temos criado para revolucionar o mundo por dentro. Podemos. Devemos. Em todos os lugares. Sigamos!