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Raquel Nepomuceno: É assim que acaba o SUS
Opinião

Raquel Nepomuceno: É assim que acaba o SUS

Como ativista e integrante da ESF, vivencio o desmonte na pele e alma. Perderei minha ACS da equipe. Quando entrei, tínhamos 16 ACS para 4 equipes e uma população de 13 a 14 mil habitantes. Hoje, temos 5 ACS
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Raquel Nepomuceno

Articulista

Sou dentista da Estratégia Saúde da Família (ESF) há 18 anos e testemunho grande retrocesso na saúde de Fortaleza. Em 2006, a cobertura da ESF triplicou com a inserção de médicos, enfermeiros e odontólogos através de um concurso público. Também ingressaram na rede, 2.700 agentes comunitários saúde (ACS), profissional importante para a construção de vínculos com as famílias do território.

Após o impeachment de Dilma Rousseff, desencadeou o avanço das forças neoliberais, repercutindo diretamente na ESF. A Política Nacional da Atenção Básica (PNAB, 2017) reduziu o número mínimo de agentes de saúde na equipe de 4 para 1. Como não houve mais seleção, fomos sobrevivendo, trabalhando arduamente nas adversidades cotidianas, cada dia com menos ACS na equipe, fragilizando o nosso elo com a comunidade, consequentemente, o cuidado com ela.

Nesta época, organizamos um Seminário com o tema A Estratégia Saúde da Família e a nova PNAB: desafios para o próximo período. Já debatíamos nossa preocupação com o futuro. Na fase crítica da pandemia, 19 postos de saúde passaram a ser gerenciados por Organizações Sociais em Saúde (OSS), modelo de gerência privatista. Agora todo novo equipamento estará sob a condução da OSS, inclusive, a contratação dos profissionais.

Como ativista e integrante da ESF, vivencio o desmonte na pele e alma. Perderei minha ACS da equipe. Quando entrei, tínhamos 16 ACS para 4 equipes e uma população de 13 a 14 mil habitantes. Hoje, temos 5 ACS para o mesmo quantitativo de habitantes e equipe, sendo que uma totalmente sem ACS. Três deles estão sendo transferidos para um novo posto, porque a OSS não contrata ACS e a gestão municipal encontrou um jeito fácil, tirando de onde já é insuficiente.

Quando reclamam da saúde, compreendam que estamos colapsando, por isso também, filas de esperas para consultas especializadas e cirurgias. Precisamos ampliar a cobertura da ESF com concurso público e questionar o avanço dessas OSS na saúde. O SUS que queremos é público, tem vínculo sólido com as famílias, e compromisso com a qualidade e a equidade no cuidado à saúde.

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