Existem aspectos na disputa envolvendo o Supremo Tribunal Federal e a Rede X que precisam ser enfrentados. O primeiro deles é que a lei não autoriza a Justiça, notadamente sem garantia do direito de defesa, a derrubar um perfil. O que a lei autoriza, no marco regulatório da internet, é que eventuais expressões, cujo teor esteja transgredindo as regras do marco regulatório, sejam retiradas do perfil. O problema é que a retirada de determinadas expressões de um perfil não é um assunto a ser tratado apenas entre a Justiça e a plataforma, como somos induzidos a pensar. O principal interessado, o usuário, precisa ser ouvido no âmbito de um processo regular. A liberdade de expressão existe exatamente para assegurar que as pessoas digam o que os detentores do poder não querem ouvir.
Não foi isso que se viu. Um Ministro do STF mandou derrubar contas sem ouvir a parte contrária, e em alguns casos, em procedimento sigiloso. Quando a Justiça age assim, está sendo injusta. O correto seria mandar tirar aquilo apontado como ofensivo ou calunioso, depois de ouvidas as manifestações contrárias, a fim de que não se coloque sob um pedestal um conceito individual e discutível de fake news. Aliás, não é porque uma afirmação ou interpretação de um fato não coincide com o pensamento da maioria que deve ser tida como falsa. Pelo contrário, é aí que deve intervir o direito à liberdade de expressão, devendo o Judiciário assegurar a sua veiculação.
Dito isto, para o bem do funcionamento democrático, é preciso também registrar que ordem judicial deve ser cumprida. Não compete ao X nem a qualquer outra empresa, por maior que seja seu poder, deixar de atendê-la. O Estado não se sustenta dentro de um contexto de desobediência ao Judiciário.
O Brasil precisa se reconciliar e, certamente, ordens judiciais de duvidosa legalidade não ajudam neste momento da vida nacional. De outro lado, é impensável que alguém, sob qualquer pretexto, resolva escolher que ordens judiciais serão ou não cumpridas. O Brasil não precisa ser recivilizado, mas certamente o Senado da República, eleito diretamente pelo povo, poderia assumir a sua missão de poder moderador.