Domingo, 27 de outubro, fim de tarde. Minutos após o encerramento do segundo turno, as telas da grande imprensa foram tomadas por análises acerca do saldo das eleições de 2024. Em meio à polifonia, um eixo comum se destacava: com discursos envelhecidos, as esquerdas foram rechaçadas pelos eleitores e saíram derrotadas das urnas.
Gostaria de defender que, ao reduzir o resultado do pleito ao quantitativo de prefeituras conquistadas por siglas partidárias, essas análises não enfrentam o principal problema político de nossa época. Hackeando a democracia, forças antidemocráticas têm chegado ao poder por meio de disputas eleitorais.
Foi pelo voto que, em 2018, um governo com esse perfil chegou ao Executivo e, enquanto se dedicava a retóricas golpistas e ataques a instituições, terceirizou a governança ao parlamento via orçamento secreto. Será com votos que planejam retomar o poder. É neste circuito de fragilização institucional que, como sócios minoritários, partidos e personagens que agora logram sucesso eleitoral tem se forjado.
A clareza desse processo é fulcral para a compreensão do lugar que as esquerdas ocupam no tabuleiro político. Principal pivô de reação ao avanço das extremas-direitas, o que observamos no Brasil é um deslocamento dos partidos de esquerda ao centro, formando frentes amplas e à procura da estabilização democrática. E não poderia ser diferente. Ao entenderem, desde o fim da ditadura civil-militar, o autoritarismo como matriz originária da política nacional, tornou-se um consenso entre as esquerdas brasileiras que a democracia é o único ambiente possível para seu desenvolvimento. Se seu destino está abraçado ao da democracia, nesta quadra da história o inverso também é verdadeiro: o destino da democracia também está abraçado ao das esquerdas.
Portanto, se as eleições de 2024 indicam alguma derrota, esta não é apenas das esquerdas, mas sim da própria democracia brasileira. Não há como pensar os desafios políticos que se colocam ao futuro do país sem considerar a centralidade desta questão.