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Rodrigo Chaves de Mello: Ainda Estou Aqui e o tempo de reabrir as janelas
Opinião

Rodrigo Chaves de Mello: Ainda Estou Aqui e o tempo de reabrir as janelas

Das telas à nossa nada trivial realidade, o filme nos convida a refletir sobre a aversão à democracia de parte das elites brasileiras, sempre inclinadas a quarteladas e dispostas a mobilizar seus podres poderes para relançar a sociedade ao breu da história
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Rodrigo Chaves De Mello

Articulista

Não é comum que um país vá ao cinema enfrentar seus traumas. Mas, em 2024, o Brasil encontra essa oportunidade com Ainda Estou Aqui. Por meio da história de luto, luta e reconstrução emocional de uma família atropelada pela ditadura militar, a obra tece conexões com desafios candentes da vida política e social contemporânea. Icônica nas telas, Fernanda Torres tem insistido nos festivais de lançamento do filme: Não se trata de uma obra sobre o passado do Brasil, mas sobre seu presente.

Nesse exercício de tomar o passado como lente para encarar o agora, destaco uma cena em particular. É o ponto de virada da trama: Cientes de que a luz do sol não guarnece a infâmia, segundos após o terrorismo de Estado bater à porta da família Paiva, os agentes da repressão ordenam que as janelas e cortinas sejam fechadas. A partir dali, a atmosfera solar e festiva da história dá lugar ao breu dos porões da ditadura. Os sorrisos cedem aos gritos de tortura e a musicalidade se dissipa em meio a uma espiral de silenciamentos.

A cena não apenas divide o antes e o depois do filme, mas, em um salto de que só a arte é capaz, faz da tragédia da família Paiva a metáfora de um país que insiste em renovar sua história por meio de uma dialética perversa, na qual o autoritarismo ativa a democracia apenas para bloqueá-la. Ou como ensinou o sociólogo Luiz Werneck Vianna: "a tese parece estar sempre se autonomeando como representação da antítese."

Das telas à nossa nada trivial realidade, a cena nos convida a refletir sobre a aversão à democracia de parte das elites brasileiras, sempre inclinadas a quarteladas e dispostas a mobilizar seus podres poderes para relançar a sociedade ao breu da história.

Mas há momentos em que as cortinas, de tão gastas, já não se prestam a fechar. Enquanto escrevo estas linhas, leio que 25 militares, incluindo sete generais, em breve enfrentarão a justiça civil por tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito. Um feito inédito em nossa história que, se bem aproveitado, talvez sinalize o tempo de escancarar as janelas, acertar contas com o passado e enunciar outros futuros.

Sem anistia! n

 

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