Poucas atividades são tão inatas à civilização como o ato de projetar, moldando o legado de uma época: o projeto de casas, vilas, palácios, cidades, portos e estradas, na busca de suprir os objetivos pretendidos, otimizar recursos e melhorar o conforto dos povos. Quando pensamos no contexto atual do Brasil, vemos uma nação que se urbanizou numa velocidade alucinante – quase 87% da população brasileira vive em regiões urbanas, segundo o último censo do IBGE!
Dessa forma, o campo esvaziou e as cidades brasileiras explodiram na última geração, com todas as mazelas decorrentes: caos urbano, falta de lotes e habitação, insuficiência de infraestrutura e equipamentos públicos, violência...
Mas a boa notícia é que esse êxodo estancou juntamente com a curva demográfica brasileira, trazendo a possibilidade de reparar nossas cidades através de políticas públicas e de ferramentas de projeto e planejamento urbano – esse é o grande desafio para o estado brasileiro nesse século, e poucas categorias terão papel tão capital nesse processo como a dos arquitetos.
Aproximando-se o início de uma nova administração em Fortaleza, nos cabe apelar ao prefeito eleito para que interrompa o absurdo processo de terceirização que dizimou o serviço público municipal – e o planejamento urbano não escapou desse sumidouro. Iniciada timidamente nos anos 70, a terceirização no serviço público logo virou um filão empresarial com profundas conexões na política, garantindo a ampliação desses contratos na esfera pública.
A questão é que logo o processo extrapolou o âmbito inicial de serviços de zeladoria e segurança, passando a incluir mão de obra de nível superior, como médicos, advogados, engenheiros e arquitetos, provocando aumentos bilionários dos valores desses contratos - e dos lucros decorrentes. Assim, a cada início de gestão, milhares de profissionais são trocados na estrutura municipal sem qualquer concurso, preparo ou comprometimento, num vínculo frágil e transitório, sem qualquer memória dos processos, e do que deve ou não ser feito.
Impossível pensar em planejamento com esse cenário: é crucial que a nova administração reconstrua um arcabouço permanente de controle urbano com a estruturação dos órgãos relacionados, realizando concursos para centenas de arquitetos, de modo que esses órgãos possam atravessar incólumes outras administrações. Só assim teremos diretrizes permanentes de políticas urbanas que possam recuperar Fortaleza e transformá-la na cidade que todos desejamos!