Às vezes, me pego pensando em como me sentia antes da naturalização das tecnologias que temos hoje. Tento lembrar principalmente da sensação do ócio e procuro o ponto de ruptura em minha existência entre os tempos em que ainda ficava sem fazer nada, olhando para o teto apenas, e a realidade que se faz atual, em que é difícil ficar por alguns minutos sem qualquer tipo de informação. Acho que isso se deu no final da minha adolescência.
É raro ficarmos em casa sem telas e com a mente desligada do mundo digital. Atualmente, quase não consigo sentir mais a desocupação, porque logo me vejo rolando a tela do celular de baixo para cima, sem qualquer propósito. Um dia desses, buscando evitar isso, passei numa banca de revistas e tentei comprar um jornal do dia, mas não encontrei; ali só vendia capinhas de celular, carregadores e outros eletrônicos. Para minha surpresa, dias depois, vi um sujeito vendendo um periódico no sinal de trânsito. Não tive dúvidas e logo comprei o meu. Sem pensar, também registrei o raríssimo fato com meu telefone. Dois impulsos.
Hoje, sinto uma espécie de ressaca de tantos dados acessados, geralmente desnecessários. É uma vontade de desligar tudo e apenas parar, numa repulsa pela informação fácil e duvidosa. Para além de mim, percebi que a relação com as pessoas também mudou. Tento lembrar de quando ainda morava no interior e, no começo da noite, me reunia na calçada com os amigos da rua. Ainda não existiam os celulares, também não havia os intervalos silenciosos.
Por isso decidi que preciso encontrar novamente o processo, o prazer da busca. Já não quero mais rolar o dedo por uma tela lisa, brilhante e inodora; quero sentir a aspereza da folha de papel e o seu cheiro que traz a lembrança da infância. A simplicidade de tatear letras não me anima; necessito mesmo é da graça de desenhá-las no papel, em movimentos curvilíneos. Descarto completamente os pensamentos interrompidos em áudios de segundos e fico somente com as conexões das conversas completas. No lugar das centenas de fotos da viagem, perdidas em nuvens que ninguém vê, escolho o visível do álbum fotográfico de trinta e seis poses. Rejeito as vistas de quarenta e cinco graus à mesa e miro nos olhares penetráveis de horizonte.
Percebi que quero muito, então. Uma revolução às avessas. É do ócio e da mente desligada que sinto falta. É de olhar para a parede.