No conclave de 2013, afirmei com toda descrença: o nome do eleito precisa ser Francisco. Era mais um desabafo do que uma profecia. Dizia mais da desconfiança, do que propriamente de alguma expectativa. Hoje, após a Páscoa de Francisco, preciso fazer meia culpa para emitir opinião sobre esse aggionarmento. Tomo emprestada a ideia de L. Boff, que ao escrever Jesus Cristo Libertador quis carregar toda humanidade de Jesus histórico na afirmação: "humano assim, só poderia ser mesmo Deus."
Respeitando as proporções repito: "humano assim, só podia ser mesmo um Papa." As tradições, medieval e moderna, transformaram o bispo de Roma num semideus, retirando-lhe a sagrada missão de ser o "servo dos servos". Das vestes esquisitas, às pompas diplomáticas, passando pelas circunstâncias políticas, tudo transformou o pescador num imperador.
Todavia, Francisco não se limitou em beijar o chão de onde pisava. Por onde passava, ele tocava os pobres e condenava a pobreza. Ficaria cansativo listar aqui os inúmeros exemplos de quando e como Francisco protagonizou um novo modelo de Igreja, mas há um imperativo: a pôs em saída para as periferias, devolvendo-a aos pobres.
Entretanto, uma pergunta sempre volta: qual é o legado de Francisco? Para mim, o principal foi escandalizar com o evangelho se pondo à serviço dos povos, sendo apenas um Papa. Foi o grande teólogo da libertação, o padre Francisco Aquino Junior quem me deu uma pista. Para ele, "Jesus e Francisco são tão parecidos que provoca uma confusão mental nos desavisados."
Aquino Junior sustenta que "as vezes não sabemos se é Francisco travestido de Jesus, ou se é Jesus travestido de Francisco." Mas isso, continua: "já não importa!" Porque "o importante é o evangelho sendo praticado." Francisco entendeu o outro Francisco, o santo, quando dizia aos seus: "pregai o evangelho, se precisar use palavras." O Papa Francisco até as usou, mas é sua profunda humanidade o grande legado que o fará ser lembrado: "humano assim, só poderia ser mesmo um Papa."
Se não quiser ficar falando sozinho, o conclave de 2025, terá que ouvir o "silêncio ensurdecedor" vindo da nave direita da basílica de Santa Maria Maior, onde Francisco descansando, continua a evangelizar com uma única inscrição: FRANCISCVS.