Com as eleições municipais se aproximando, é comum ver uma presença maior dos pré-candidatos em todos os lugares possíveis. Anedotas famosas são as do político aparecendo até "na feira, comendo pastel", e na casa de eleitores, fazendo uma visita, por exemplo.
Nas eleições deste ano para a Prefeitura Fortaleza, mais do que a presença física, os postulantes intensificam uma tendência de pleitos anteriores: a de ampla divulgação virtual, por meio das redes sociais. Em alguns casos, há uma utilização em grande quantidade dos ditos "memes" e das "trends", que geralmente vão para o lado humorístico e descontraído.
Dos nove postulantes em Fortaleza, três deles abordaram "memes e trends" em ao menos uma publicação: Eduardo Girão (Novo), Evandro Leitão (PT) e Técio Nunes (Psol). Nos casos deles, a quantidade de postagens irreverentes é menor e as referências aparecem de forma mais discreta.
No caso de Célio Studart (PSD), as publicações seguem focadas na pauta de proteção animal, sem grandes alterações recentes. Já Haroldo Neto (UP) mantém uma conta fechada e Zé Batista (PSTU) não tem perfil no Instagram.
Uma maior gama de postagens "descontraídas" está nos perfis de André Fernandes (PL), Capitão Wagner e, especialmente, do atual prefeito José Sarto (PDT). Os três têm apostado em vídeos e imagens nas quais eles reproduzem "memes", frases engraçadas, ou participam das "trends", série de vídeos virais, dos mais variados estilos, mas com uma característica em comum que os torna identificáveis.
Por exemplo, no perfil de André, em uma postagem, o deputado participa de uma entrevista estilo "bate-pronto", cujas respostas fazem referência ao apelido "caneco" popularizado pelo deputado estadual Osmar Baquit (PDT), visando depreciar Fernandes.
No caso de Wagner, pode-se encontrar vídeos no estilo "quem sou eu?", em alguns casos com a presença também da esposa do ex-deputado, a atual deputada federal, Dayany Bittencourt (União Brasil-CE). Há ainda imagens com referências a filmes, a frases e, em um dos vídeos, o deputado faz uma "dancinha para o Instagram" no final. Fora das redes, Wagner chegou a participar de um show de humor, como convidado.
Já Sarto apresenta a maior gama de publicações do tipo. A maior parte é formada por vídeos, nos quais o prefeito compartilha obras, rotina, fala de características da própria vida e responde perguntas. Nos conteúdos, ele dança, reproduz "memes", fala gírias, usa óculos do estilo ‘juliet’, dentre outras ações.
"Aloha, galera! Tô aqui fiscalizando a urbanização da obra do Titanzinho. São mais de R$ 20 milhões investidos aqui no Titanzinho que é o pico da galera do surfe. E hoje, galera, aqui, tá crowdeado", diz o prefeito, em uma das publicações. Crowdear significa que "está cheio de gente", enquanto "pico" é uma gíria do surfe para um local especial para pegar ondas.
As publicações que buscam ser engraçadas são uma maneira de desviar do "tom professoral' e aproximar a imagem do político ao público em geral, segundo a professora Monalisa Torres, da Universidade Federal do Ceará (Uece). As redes sociais são, em suma, o meio escolhido pela força em atingir a maior gama de perfis diferentes.
De acordo com Torres, há diferentes estratégias de utilização do humor para fins políticos. Uma delas é angariar novas bases e conquistar novos públicos, como os mais jovens - o que ela relaciona ao prefeito José Sarto, por exemplo.
Outra intenção é a de fragilizar o discurso do opositor, rebatendo críticas - o que seria o caso do vídeo de André Fernandes e de publicações do espectro da direita, no geral. Característica se apresenta em números, nos quais os candidatos mais à direita são os que possuem maior número de seguidores. A exceção em Fortaleza é Célio Studart que, apesar de não ter esse alinhamento à direita, possui muitos seguidores.
“Há uma comunicação que consegue captar o eleitor, porque ela fala aquilo que o incomoda, então utilizando de memes, fazendo piadas, em alguma medida até desmoralizando algumas falas e alguns episódios de alguns candidatos. Isso é uma forma de crítica à política tradicional e foi muito bem aceita neste campo mais à direita”, explica Monalisa.
Apesar de parecer promissora, a estratégia pode ter aspectos negativos. No caso de Sarto, Torres cita o fato de que ele está tentando uma reeleição e, portanto, críticas à gestão podem se somar a críticas à postura nas redes, o que pode ser prejudicial para a campanha dele.
“Pode ser um risco, considerando que os problemas de Fortaleza são complexos e a oposição, em diferentes campos, vai vir apontando para isso. Wagner e o Fernandes já responderam a esta postura, também por meio de vídeos. Isso mostra a forma como eles vão atribuindo sentidos positivos e negativos à mesma situação, a de se utilizar das redes”, disse a especialista.
Este padrão de utilização das redes, não apenas como humor, mas na campanha como um todo, não é novidade e remonta à eleição de Barack Obama, em 2008, segundo Monalisa Torres. A partir daí, a importância das redes na política foram aumentando e se expandindo mundialmente.
No pleito municipal de 2020, o cenário já estava bem estabelecido e situações "descontraídas" foram utilizadas na campanha, como a associação do prefeito José Sarto à cadela dele, Marion, como forma de aproximá-lo do eleitor.
“A estratégia era adoçar a figura do Sarto. Acho que essa tentativa de imagem de 'zoeiro' é uma tentativa de adoçar essa imagem dele. Mas insisto, pra um incumbente, que precisa recuperar a confiança, que precisa mostrar que fez e que entregou obras, pode ser uma estratégia arriscada. Mas precisamos observar”, diz Monalisa.
As estratégias dos que mais se utilizam do humor nas redes - André Fernandes, Capitão Wagner e José Sarto - variam, segundo a cientista política Monalisa Torres.
Sarto estaria tentando produzir a imagem de “zoeiro”, para desmontar uma imagem de distanciamento, ou de distância do povo, colocando-o como alguém “como os outros”. Ao mesmo tempo, Monalisa Torres elenca uma aproximação com o espectro da direita, como um dos intuitos do prefeito.
“Acho que é um pouco da estratégia dele, caminhando um pouco mais para a direita para cativar um outro público, que tem outra visão. Se vai dar certo ou não, acho que só o tempo dirá, mas acho arriscado considerando que o Sarto é incumbente”, reforçou Monalisa.
Já Capitão Wagner e André vêm de um contexto de mais afinidade com redes, o que é característico de figuras políticas mais de centro-direita, e especialmente, de direita.
“O Wagner, por exemplo, tem hábitos de fazer trends de ‘eu sim, eu nunca’, de perguntas sobre a vida, ele sempre faz, a Dayany (deputada federal e esposa do pré-candidato) tem participado, talvez pelo fato de ela ser uma figura política. Ele já tem esse histórico de postagens neste sentido há muito tempo”, explica Monalisa.
André Fernandes seria o que mais possui afinidade com as redes e com a linguagem de humor, tendo construído a trajetória e a imagem pública rodeando-as. “Para ele é mais fácil e não soa como algo superficial ou falso neste sentido. É diferente quando você tem um candidato que tenta forçar uma imagem que ele não é”, disse. Ao mesmo tempo, acrescentou: “Embora o Fernandes precise furar a bolha, se ele quiser ser competitivo, e mostrar que ele é viável para outros públicos, para além das redes.”