Além de sancionar dois projetos de lei e ampliar o programa Pé-de-Meia, a quarta visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Ceará foi marcada por choro, defesa da educação, incentivo à participação política de jovens, alfinetada no antecessor e críticas à violência doméstica.
O chefe do Executivo brasileiro iniciou o discurso durante o anúncio da expansão do programa do Ministério da Educação (MEC), evento realizado em Fortaleza, na tarde dessa sexta-feira, 2, expressando emoção pela ocasião. "Eu pensei que ao chegar aos 70 anos, nada pudesse me emocionar, mas estava enganado".
Nos primeiros sinais da voz embargada de Lula, o governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT), se levantou e entregou uma garrafa de água para ele. O presidente lembrava da própria trajetória pessoal, quando interrompeu o discurso, lacrimenjando.
"Eu não esqueço nunca. Sou o primeiro filho, de oito irmãos, a ter um diploma primário. Sou o primeiro filho da dona Lindu a ter um diploma técnico. Sou o primeiro que tive uma televisão, uma geladeira, um carro", disse Lula ao mencionar ser o pioneiro da família a conquistar tais feitos.
O petista confessou que outrora tinha vergonha de chorar. "Hoje eu penso, feliz o País que tem um presidente capaz de chorar de emoção diante de seu povo. Por conta de um curso técnico eu consegui galgar o que os outros não conseguiram", reforçou Lula.
Em seguida, ele elogiou o ministro da Educação, Camilo Santana (PT), e o governador Elmano. "Por isso vocês têm de valorizar. Vocês, se tiverem vontade, quando terminarem o ensino, agradecerão pelo resto da vida a persistência de quem quer que vocês estudem", projetou Lula.
Emocionado, o presidente defendeu a educação como forma de contornar quadros de pobreza, de instabilidade profissional, mas também de violência doméstica.
“Uma mulher que não tem profissão vai casar, e se não tomar cuidado, o marido irá agredi-la, e ela ficará com o marido agressor porque precisa dar comida para os filhos”, iniciou. “Ninguém pode viver com alguém que seja violento com mulher, por isso, é importante uma profissão”, continuou. “Se você tiver marido, você vai ter o que você quiser, porque você ama e não porque você precisa de um prato de comida ou um pedaço de chão para morar”.
O presidente usou novamente a mãe como exemplo. Segundo ele, dona Lindu, apesar de não ter tido formação acadêmica, teve “a coragem de se separar” do pai do presidente, criando os oito filhos sozinha.
“Eu tinha sete anos. A minha mãe se separou, criou oito filhos. A gente vendia o que tivesse que vender, mas a minha mãe nunca mais aceitou sequer olhar pra cara do meu pai”, disse Lula. E completou, brincando: “Ela cuidou tão bem de nós que o caçulinha virou presidente da República."
Apesar dessas colocações, um dos filhos do presidente, Luís Cláudio Lula da Silva, recebeu determinação do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) para cumprir medida protetiva solicitada pela ex-companheira, Natália Schincariol, após denúncia de violência doméstica feita por ela.
Luís Cláudio teve de deixar o apartamento onde morava com ela e recebeu ordem para manter distância mínima de 200 metros dela. Em julho, a Polícia Civil do Estado de São Paulo concluiu a investigação e considerou não haver indícios contundentes que corroborem alegação da médica. Sem provas suficientes para embasar a suspeita, Luís Cláudio não foi indiciado pela Polícia Civil, ou seja, nenhum crime foi atribuído a ele.
A agenda de Lula com os estudantes cearenses, por fim, foi toda marcada por incentivo à participação política. Em dado momento do encontro, ele chegou a rechaçar candidatos que se afastam da ideia de "ser político".
"Toda vez que vocês virem na televisão um político dizendo: 'Eu não sou político, eu preciso ser prefeito, deputado, governador, porque eu não sou político, eu não sei o que das quantas'. Esse cara é mentiroso. Por que sabe o que acontece? O ser humano, seja homem ou mulher, a gente nasce fazendo política", explicou.
Além disso, o presidente ponderou que os jovens "não têm razão para estarem desmotivados" e aproveitou para orientar o público no engajamento político.
"Se alguém disser pra vocês: 'não gostem de política, porque todo político é ladrão' - e vocês têm hora de ver isso na televisão. Eu queria fazer um apelo pra vocês, quando vocês estiverem desanimados, quando vocês não quiserem acreditar no Lula, no Camilo, no Elmano, no Guimarães e nos deputados, ainda que vocês não acreditem mais em ninguém, pelo amor de Deus, não desista da política, porque o político honesto, decente, competente está dentro de cada um de vocês”, orientou o presidente, pedindo para que o público “exercite a inteligência”.
Mesmo sem ter sido citado nominalmente, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi lembrado. Lula rechaçou a ideia de figuras consideradas "mito" ou "neutra".
"O que a gente não pode é ser um mito, é ser neutro, porque se a gente for mito ou for neutro, quem vai governar esse País são aqueles de sempre, que falam e que nunca fazem nada", considerou Lula. Em seguida, o presidente se direcionou a Elmano, instigando-o a promover uma premiação a quem apresentasse "uma obra que o governo passado fez" no Estado.
"Poderia prometer que, se alguém trouxer aqui uma obra que o governo passado fez, um tijolo aqui do Ceará, você daria um prêmio para a pessoa. Pode prometer. Pode fazer um sorteio. Mas dizer uma obra, uma obra de educação, uma de saúde, uma de rodoviária, uma de ferroviária. Nada. Porque tem gente que acha que governar é mentir. Tem gente que acha que governar é ofender", desabafou Lula, enquanto Elmano balançou a cabeça em afirmativa e disse que “está prometido”.
Colaborou a repórter Ludmyla Barros/Especial para O POVO