A contragosto da indústria, do comércio e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), por unanimidade, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) aumentou a taxa Selic em 0,25 ponto percentual, para 10,75% ao ano.
Foi a primeira alta em mais de dois anos e também a única que houve no terceiro governo Lula. A última foi em agosto de 2022, quando os juros básicos da economia saíram de 13,25% para 13,75% ao ano.
Após passar desse nível aconteceram seis cortes de 0,5 ponto e um de 0,25 ponto, entre agosto do ano passado e maio deste ano. E nas reuniões de junho e julho passados, manteve a taxa em 10,5% ao ano.
O resultado de ontem foi sem surpresas para o mercado. Em comunicado, o Copom justificou a alta dos juros baseada na resiliência da atividade econômica, pressões no mercado de trabalho, hiato do produto positivo (economia caminhando para consumir mais que a capacidade de produção), alta das estimativas para a inflação e desancoragem das expectativas de inflação. Em relação ao futuro, o texto foi vago sobre a intensidade e a duração do ciclo de alta dos juros.
Da parte do governo, Fernando Haddad, ministro da Fazenda, reiterou que não foi surpreendido pela decisão, mas evitou comentar o teor da decisão unânime tomada pelo Banco Central brasileiro. Ele disse que fará uma avaliação apenas após a divulgação da ata, na semana que vem. "Vou dar uma olhada, vou conversar internamente, vou verificar o que esperar para o futuro próximo."
Na avaliação do resultado, Alexandre Espírito Santo, coordenador de economia e finanças da ESPM e economista da Way Investimentos, diz que há indícios que o colegiado do BC irá permanecer nesse passo na próxima reunião. "Sendo nossa projeção que a Selic encerre o ano em 11,25%."
Sidney Lima, analista CNPI da Ouro Preto Investimentos, acrescenta que a decisão do Copom sinaliza uma estratégia mais voltada para o combate à inflação, mantendo o controle sobre a demanda doméstica e tentando estabilizar o real. "Essa decisão reforçaria o compromisso do Brasil com uma política monetária mais rígida, diante de pressões inflacionárias. No entanto, com o corte nos EUA, o aumento da Selic pode acabar gerando uma maior atração de capital estrangeiro, fortalecendo o real temporariamente, mas com o risco de enfraquecer o crescimento econômico", diz ele, citando justamente a redução da taxa básica norte-americana em 50 pontos-base, para a faixa de 4,75% e 5% ao ano.
Para Alex Andrade, CEO da Swiss Capital Invest, a mudança é "bem-vinda". "Embora tenha contrariado a visão do governo, foi amplamente reconhecida como uma medida necessária pelos representantes do Banco Central."
Já Fábio Murad, sócio da Ipê Avaliações, faz a ressalva que a alta da Selic também pode desacelerar o crescimento econômico e aumentar o custo do crédito para empresas e consumidores. E a decisão do Fed de cortar os juros, para ele, pode influenciar positivamente, pois o diferencial de juros entre Brasil e EUA se amplia, "tornando os ativos brasileiros mais atrativos para investidores internacionais." (Com Agência Brasil e Agência Estado)
Políticos e entidades criticam decisão do Copom
Também não surpreendeu a reação de parte dos políticos e de entidades contra o aumento da taxa básica de juros. "Quem paga a conta da alta na Selic são os pequenos negócios e as famílias mais pobres", declara Décio Lima, presidente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) nacional, acrescentando que a medida é um "retrocesso".
Recentemente, com a taxa Selic em 10,5% ao ano, o Sebrae apresentou um estudo em que a média das taxas cobradas dos pequenos negócios nas instituições financeiras era quatro vezes maior (44%), atingindo o patamar de 51% para os microempreendedores individuais (MEI) da Região Nordeste.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) se manifestou, em nota, frisando ter recebido a decisão "com total indignação". "Até que ponto a especulação do mercado futuro de juros influencia as narrativas da expectativa de inflação futura?", questiona o presidente da CNI, Ricardo Alban. A entidade destaca que a elevação mantém o Brasil em 3º lugar entre as maiores taxas de juros do mundo, atrás apenas da Turquia e Rússia. "Juntamente com o nosso problema de elevado spread bancário - também o 3º maior do mundo -, esse fator empurra o País para fora da disputa mundial pela produção", diz.
Já a Central Única dos Trabalhadores (CUT) citou um estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), segundo o qual a elevação de 0,25 ponto aumentará em R$ 13 bilhões os gastos da União com os juros dos títulos públicos. Cada 1% de aumento na Selic, informou o estudo, eleva em R$ 40 bilhões os custos com os títulos. E a Força Sindical classificou a decisão de "prêmio aos especuladores". O presidente da entidade, Miguel Torres, disse que o Banco Central vai na contramão do desenvolvimento do País. (Com Agência Brasil)