Se o ano começa depois do Carnaval, a semana que passou acelerou movimentos do ano pré-eleitoral de olho em 2026. Líderes da oposição no Ceará já fazem os primeiros cálculos e movimentos para as disputas majoritárias pelos cargos de governador e senador. Com o bloco governista no controle das máquinas federal, estadual e da quase totalidade das prefeituras cearenses, a formação de aliança é condição para alguma competitividade.
Ex-adversários falam em bloco único, apesar de interesses múltiplos. Há uma distância entre desejo e realidade e a eventual união dependerá de articulações e costuras anteriores ao início do processo eleitoral.
A tentativa de unificar a oposição tem um objetivo comum: fazer frente ao projeto encabeçado pelo PT, que completará 12 anos à frente do Palácio da Abolição em 2026. O grupo conta com personagens como Capitão Wagner (União Brasil) e Roberto Cláudio (PDT). O PL, que tem como líderes locais os deputados André Fernandes (federal) e Carmelo Neto (estadual), terá peso importante na definição.
Entra na conta também o PSDB, que apesar do dilema interno para atingir a cláusula de barreira nas próximas eleições, ainda atua na oposição no Ceará. Os tucanos contam com o ex-senador Tasso Jereissati, outro crítico da atual gestão petista.
No decorrer do processo eleitoral de 2024 em Fortaleza, a oposição sinalizou intenção de se aglutinar já no primeiro turno, mas acabou se dividindo, com embates entre parte de seus líderes políticos. Em 2026, tentarão novamente superar as diferenças ainda no 1° turno, tendo em vista que no pleito de 2022, o então candidato a governador Elmano de Freitas (PT) venceu o pleito em um turno só.
O POVO ouviu líderes e dirigentes partidários da oposição, a fim de entender a viabilidade da proposta de unificar o bloco, e conversou com cientistas políticos que projetaram certa dificuldade em administrar interesses diversos dentro do grupo opositor.
Capitão Wagner defendeu que o projeto deve estar acima das pretensões pessoais. “Se isso estiver em primeiro lugar, sem dúvida nenhuma podemos ter um único candidato. É um grupo forte que tem condição de disputar em pé de igualdade”, afirma. Capitão se dispôs a representar o grupo ou a abrir mão de eventual candidatura ao governo, caso o entendimento comum seja por outro indicado.
“Estou à disposição, se o grupo chegar a um denominador comum e esse denominador for que eu seja o candidato, eu serei. Se for diferente, se for outro nome, vou apoiar da mesma forma, até por coerência (…) É possível estarmos juntos já em primeiro turno. São muitas posições: Governador, vice, duas vagas de senador, formar chapas de deputados federais e estaduais; então fica mais fácil acomodar interesses partidários e individuais”, projeta.
Wagner, que preside o União Brasil no Ceará, comentou ainda que espera que todos os correligionários abracem o projeto da oposição. Se porventura, algum quadro partidário opte por caminho distinto, destacou que a porta de saída é uma opção.
“O União vai unido, defendendo a mesma chapa majoritária, todos defendendo o mesmo projeto. Entendemos que o processo eleitoral é onde o partido se fortalece. Se alguém, porventura, não quiser estar no projeto, deixa as fileiras do partido sem mágoa, sem rusga. É tanto que já iniciaremos conversas na próxima semana, com as bancadas para nos organizarmos”, relata.
A deputada federal Fernanda Pessoa (União Brasil) tem grupo político local próximo do governo do Estado, com o pai e prefeito de Maracanaú, Roberto Pessoa (União), tendo boa relação com o governo do PT no Ceará. Fernanda defendeu a pluralidade e que a atuação deve ser pautada pelo desenvolvimento.
“O União Brasil é um partido que tem diversidade de pensamentos e posições em diferentes estados do Brasil. No Ceará, nossa atuação sempre foi pautada pelo compromisso com a população e pelo desenvolvimento. O presidente Lula tem um histórico de políticas sociais que trouxeram avanços para o país, além de uma presença consolidada no cenário internacional. Diante disso, qualquer discussão sobre 2026 deve levar em consideração não apenas as questões partidárias, mas principalmente o que for melhor para o povo e para o nosso estado. O diálogo é fundamental”, argumentou a parlamentar.
No PL, tem se falado em manter a mesma postura vista em 2024, fortalecendo nomes do próprio partido na Capital e no Interior do Estado. O presidente estadual da sigla, Carmelo Neto, sinalizou à coluna Vertical, do O POVO, que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) deverá vir ao Ceará com essa missão. A ideia seria percorrer diversas regiões do Estado, ao longo do ano, acompanhado de aliados locais.
"Para 2026, não tenho dúvidas de que o PL Ceará será protagonista, até pelo tamanho de nossas lideranças. Na eleição municipal tivemos adesões importantes, e meu trabalho será para manter e ampliar esta unidade", disse Carmelo, em declaração similar ao que vem falando André Fernandes, que defendeu "protagonismo" do PL e até mesmo chapa pura em 2026.
Especialista ouvido pela reportagem destaca que a vereadora Priscila Costa (PL) é peça importante do PL para a próxima eleição. Com votações crescentes nos últimos anos, Priscila é cotada para ser um dos nomes do partido na disputa pelo Senado.
"Ela não tem nada a perder, sempre teve votações crescentes. Tem um bom recall, crescimento de votação impressionante, já foi deputada federal e não tem nada a perder porque já tem o mandato de vereadora", destaca Emanuel Freitas, professor de Teoria Política da Uece.
O ex-prefeito Roberto Cláudio (PDT) é outro nome importante dentro do grupo opositor. RC apoiou André Fernandes no segundo turno das eleições em Fortaleza, colocando-se na linha de frente da oposição à “hegemonia petista” que atualmente está à frente dos governos estadual e de Fortaleza.
Apesar disso, o PDT ainda está em processo de definição interna sobre como vai atuar no Ceará. No âmbito federal, o partido é base do governo Lula (PT). No Ceará, RC quer permanecer na oposição, mas outros dirigentes como o ministro Carlos Lupi (Previdência) e o deputado federal André Figueiredo têm falado em tom de construir "parceria" com os governos locais.
O partido não descarta candidatura própria com o próprio RC. Roberto também tem mantido discurso similar ao de Wagner, pregando união de todas as siglas de oposição, o que somaria o tempo de rádio e TV e outros recursos partidários para fazer frente ao PT, que detém à máquina estadual.
Girão quer ser o candidato de uma oposição unificada
O senador Eduardo Girão (Novo) defendeu a união das forças de oposição para 2026, e anunciou que é pré-candidato ao governo do Ceará no ano que vem. A informação foi antecipada pelo senador, ao O POVO, na última quarta-feira, 5.
"Penso que a união deve sempre ser buscada no limite das forças de todos da oposição pois o governo petista joga bruto e sujo, usando a força da máquina para se perpetuar no poder. Cada deve um deixar vaidades e projetos pessoais e partidários de lado para fazer a redenção do Ceará desta ditadura da cooptação implantada pelo PT", disse Girão ao ser perguntado sobre se a união era possível.
Em seguida, ele confirmou a pré-candidatura. "Naturalmente já sou um pré-candidato ao Governo do Ceará, pois por princípio, antes mesmo do mandato de senador, já me posicionava contra o instrumento de reeleição e por minha experiência em gestão durante boa parte de minha vida", declarou.
Girão revelou ainda já ter conversado com alguns integrantes do grupo opositor e projetou que "no momento certo" (2026) as definições serão tomadas de fato. "Estou pronto e à disposição para servir dando o melhor de mim visando colocar o Ceará no topo do Brasil com os melhores indicadores na saúde, segurança, educação e geração de empregos. É o que os cearenses merecem".
O desafio para oposição de chegar ao consenso
Emanuel Freitas, professor de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídias (Lepem-UFC), prevê alguns empecilhos a serem superados por um eventual bloco de oposição. Dentre eles, os múltiplos interesses e o perfil de integrantes do eventual bloco, que desejam protagonismo.
"Há algumas particularidades nessa aliança. Houve um supervencedor em 2024, que é o André, e outros dois derrotados, que foram Wagner e RC/Sarto. O movimento natural é o André tentar capitanear essa oposição. Num lugar que ele sempre esteve, de oposição ao PT e ao Ferreiragomismo, lugares esses que em algum momento de sua trajetória o Wagner já flertou e o RC esteve aliançado", explana.
"Há um uma certa dificuldade, até pelo próprio ethos do André. Um bolsonarista local, disruptivo, que soube aceitar devidamente a aliança em 2024, sem se comprometer, com movimentos mais de apoio a ele do que ele solicitando apoio. Os outros dois são figuras importantes, embora venham de derrotas eleitorais. É uma aliança com alguns problemas a serem resolvidos internamente".
O professor avalia que tanto o governismo quanto a oposição enfrentam cenários desafiadores, mas com contextos distintos. "Para a oposição o maior deles é que ela não estando no governo, não detém cargos e verbas e só tem para administrar seu capital político de ser oposição. Fica então um jogo de cintura que traz mais dificuldades para RC e Wagner, porque eles não têm mandatos. O André, por outro lado, tem o mandato dele, do pai, das pessoas do PL próximas a ele e tem a figura do Bolsonaro. O que Wagner e RC têm a oferecer? Um capital politico com certa corrosão. O jogo fica mais difícil
para eles".
Ao PL, Emanuel projeta que caberá fechar a decisão sobre a chapa majoritária. "Talvez seja mais rentável para o André que esse candidato seja do PL e um nome novo, sobre o qual ele teria maior controle. Isso porque qualquer um dos outros ganhando, em tese, haveria um certo muro que o PL precisaria transpor".