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Concentração de renda em alta expõe urgência da reforma tributária
Reportagem

Concentração de renda em alta expõe urgência da reforma tributária

| Desigualdade social| Os 5% mais ricos já detêm 40% da renda nacional e a renda da elite cresceu três vezes mais que a do restante dos brasileiros. Fortunas aumentam enquanto população empobrece e tributos tiram mais de quem menos tem, mostra estudo
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FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 17-05-2023: Extrema pobreza entre crianças, adolescente e pessoas em situação de rua. (Foto: Samuel Setubal) (Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 17-05-2023: Extrema pobreza entre crianças, adolescente e pessoas em situação de rua. (Foto: Samuel Setubal)

 

 


Você sabe por que um trabalhador autônomo, ao comprar uma moto popular para fazer entregas por aplicativo, gasta a mesma quantidade de dinheiro com impostos que uma pessoa rica ao comprar uma moto de luxo para lazer? Ou, ainda, por que os tributos que incidem sobre os custos de um aparelho celular comprometem quase 20% da renda de uma diarista e apenas 2,5% da renda de um gerente de banco?

Um dito popular resume que a corda arrebenta sempre do lado mais fraco, mas esses e outros exemplos também estão relacionados com a forma como o sistema tributário funciona no Brasil — um modelo que acentua as desigualdades sociais já existentes no País e que está em discussão com a reforma tributária.

Para arrecadar o suficiente ao custeio da máquina estatal e dos serviços públicos que devem ser prestados à população, como os de saúde, educação e segurança, os tributos incidem sobre as bases do consumo, da renda e do patrimônio dos cidadãos e das empresas a níveis federal, estadual e municipal — e, em todos esses pilares, existem distorções que beneficiam os ricos e penalizam os pobres.

Isso porque a tributação sobre o consumo — aquela que aparece na nota fiscal embutida no preço de produtos e serviços — é a mesma para qualquer consumidor, independente do salário dele. Mas a solução para equilibrar as contas, segundo especialistas, não é cobrar tributos que variem de acordo com o poder aquisitivo do comprador, uma vez que isso não seria exequível; e sim diminuir as alíquotas para que a fatia da tributação sobre o consumo seja menor dentro do bolo tributário — já que atualmente ela responde por quase metade da arrecadação nacional (43%).

Ao comparar a divisão tributária brasileira com a de outros países, é possível entender um dos motivos pelos quais fazer compras no exterior pode ser mais vantajoso do que comprar determinados produtos no Brasil. Naqueles que integram a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), por exemplo, o peso da tributação do consumo é de 33%.

Em nações desenvolvidas como Estados Unidos e Canadá, a média dessa fatia no total da arrecadação pública é de 17,5% e 23,5%, respectivamente.

Já em relação à tributação sobre renda, desde 1996 o Brasil faz parte de um pequeno grupo de países que não tributam sócios e acionistas que recebem lucros e dividendos de empresas.

Além disso, estudiosos apontam que a tabela de cobrança do Imposto de Renda também contribui para o aumento de desigualdades, principalmente ao se observar que o teto salarial que garante a isenção está defasado e isso faz com que pessoas de baixa renda tenham de pagar o IR.

A tributação sobre patrimônio, por sua vez, possui distorções próprias como o imposto sobre grandes fortunas, que está previsto na Constituição desde 1988 mas ainda não foi regulamentado pelo Poder Público — o que é necessário para determinar o que são as grandes fortunas e qual o valor dos impostos a serem cobrados.

No Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), outro exemplo. Enquanto o imposto incide sobre motos e carros, por outro lado, jatinhos, helicópteros, iates e lanchas não são taxados.

Uma pesquisa publicada pelo Observatório de Finanças Públicas do Ceará (Ofice) analisa a Emenda Constitucional Nº. 132/2023 e propõe alternativas para garantir uma reforma tributária que reduza a concentração de renda no Brasil com o objetivo de atingir a justiça fiscal.

O estudo detalha por que o sistema tributário do Brasil é injusto ao acentuar essa concentração e expõe o papel do Fisco como um meio de superação das desigualdades não apenas no momento em que é aplicado nas políticas públicas, mas também no momento em que é recolhido.

De acordo com o professor Lúcio Maia, que é auditor fiscal da Receita Estadual do Ceará e pesquisador sênior do Observatório, “somente com a progressividade na cobrança dos tributos é que poderemos ter justiça fiscal com distribuição de renda, beneficiando principalmente a população mais vulnerável”.

 
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