Aeleição que se avizinha em Fortaleza ganha ares de ser das mais duras dos últimos anos. Num cenário em que candidatos da direita à esquerda se colocam como opção, um recorte se destaca na balança eleitoral: as máquinas públicas envolvidas na disputa. De um lado a Prefeitura, que deve confirmar o prefeito José Sarto (PDT) para tentar a reeleição. Do outro, o Governo do Estado, liderado pelo PT, definirá no dia 21 o nome do candidato do Palácio da Abolição; ao que tudo indica Evandro Leitão.
Rivalidade entre as duas principais máquinas administrativas do Ceará não é novidade. Pelo contrário, pode-se dizer até que foi tradição ao longo dos anos. A ex-prefeita Maria Luiza Fontenele (1986-1989) teve rusgas com o governador Gonzaga Mota (1983-1987) e ainda mais com Tasso Jereissati (1987-1991). Após um ano de alinhamento com Tasso governador e Ciro Gomes prefeito (1989-1990), seguiu-se uma década e meio de disputas.
Juraci Magalhães (1990-1992) e Ciro Gomes (1991-1994) e Juraci e Tasso rivalizariam ao longo da década de 1990. Da mesma forma Luizianne Lins (2005-2012) e Lucio Alcântara (2003-2007) teriam seus próprios embates.
Um alinhamento só voltaria a ser visto quando Cid Gomes (PSB) era governador e Luizianne (PT) prefeita. Entretanto, perto do fim da gestão da petista houve rompimento, gerando o marco mais recente da disputa entre máquinas, em 2012, quando Luizianne lançou Elmano de Freitas (PT) como representante à sucessão e Cid lançou o então deputado Roberto Cláudio. Em 2016 e 2020 houve novo alinhamento das máquinas, com Camilo Santana e RC no comando. Embora possuam semelhança, os pleitos de 2012 e 2024 guardam algumas diferenças entre si.
Monalisa Torres, professora vinculada ao Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia da Universidade Federal do Ceará (Lepem-UFC), aponta que em qualquer eleição a máquina pública é um ativo que não pode ser desprezado, mas analisa a questão, primeiro, sob a ótica da avaliação da gestão.
"É preciso olhar para a avaliação de cada governo. Há uma ideia de que Fortaleza é uma cidade insurgente, que não obedece a lógica do Governo do Estado, que tem dinâmica própria, mas antes disso tudo é preciso olhar para a avaliação. Em 2012, Luizianne vinha num desgaste e o governo Cid vinha numa crescente e conseguiu vencer", relembra a professora.
O cenário de 2012 não se repete agora. Pesquisas mostram que embora Elmano tenha mais aprovação do que reprovação, os índices de "ruim ou péssimo" são elevados para um governo com pouco mais de um ano de estrada. Já Sarto, no último ano de mandato, conseguiu reduzir a faixa que considera sua gestão "ruim ou péssima", embora esta ainda esteja próxima da faixa de aprovação.
As máquinas atraem investimentos, verbas e aliados. Positivamente para a máquina do Estado pesam ações como o Ceará sem Fome e a redução de filas de Cirurgia Eletiva. O alinhamento com outra máquina, a da União, trará ainda para Fortaleza uma sede do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e outras duas unidades do Instituto Federal (IFCE), já anunciados pelo ministro Camilo Santana (Educação).
Negativamente, a segurança pública é o calcanhar de Aquiles desse grupo. Entre janeiro e fevereiro deste ano foram 148 Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI) em Fortaleza, que incluem crimes como homicídio e latrocínio.
Para a base da Prefeitura, o passe-livre estudantil é um dos grandes trunfos da gestão, com milhares de estudantes — e as famílias —, beneficiados com duas gratuidades no transporte coletivo em dias úteis. Em contrapartida, a Taxa do Lixo é um ônus que será usado para desgastar o prefeito.
Já as candidaturas de oposição a ambas as máquinas tentarão evitar a polarização entre governantes. No campo conservador, o ex-deputado federal Capitão Wagner (União Brasil), o deputado federal André Fernandes (PL) e o senador Eduardo Girão (Novo) devem disputar espaço e preferência nas urnas.
Todos compõem um grupo que costumava sair junto em eleições anteriores, com André e Girão apoiando Wagner em pleitos recentes como 2022 e 2020.
Monalisa aponta como desafio superar a divisão. "Fernandes não parece muito disposto a se unir. Então eles estão disputando o mesmo perfil de eleitores. São muito próximos os perfis".
A especialista aponta que pesquisas recentes mostram que Wagner tem atingido um teto de eleitorado, enquanto André apresenta certo nível de crescimento. "Será que esse crescimento (de André) não é um derretimento do Wagner?", pondera. A segunda tarefa da oposição é dialogar com o maior número de atores possível.
"Se por um lado Wagner tenta se descolar de Bolsonaro, mostrando que ele não é só isso, pode até se encontrar espaço para o bolsonarismo dentro do seu guarda-chuva, mas não é só isso. Por outro, ele tenta também não desagradar tanto essa parte mais radical do eleitorado".
E segue: "Já Fernandes, é completamente dependente do bolsonarismo. Ele cresce na esteira do bolsonarismo, pelo contrário, não pode se desvincular disso".