Atualmente, o aborto não previsto em lei é punido com penas que variam de um a três anos, quando provocado pela gestante ou com seu consentimento, e de três a dez anos, quando feito sem o consentimento da gestante.
A lei permite o aborto nos casos de estupro, de risco de vida à mulher e de anencefalia fetal (quando não há formação do cérebro do feto). Atualmente, não há no Código Penal um prazo máximo para o aborto legal.
No cenário global, o Brasil integra a lista de 43 países nas quais o aborto é permitido somente em casos de vida ou morte. Em classificação da Organização das Nações Unidas, essa configuração é uma das mais conservadoras e está acima somente dos países nas quais o procedimento é totalmente proibido, cenário presente em 22 países, como Afeganistão, Síria e territórios palestinos (Cirjordânia e Faixa de Gaza).
A maior parte dos países, 77, permite a realização do procedimento, mediante solicitação. Outros 12, mediante motivos sociais ou econômicos. Além disso, 47 permitem por motivos de saúde e outros dois (Estados Unidos e México) contam com legislações variadas.
Segundo Irlena Malheiros, especialista em Saúde Pública, pesquisas nacionais e internacionais apontam para a legalização do aborto como a melhor solução para a saúde pública. A permissão, neste caso, não se refere a um incentivo ou uma obrigação, mas ao oferecimento de segurança nos procedimentos.
"O ideal seria criar todo um trabalho muito bem articulado que garanta os direitos sexuais e reprodutivos a meninas e mulheres. Isso impactaria na redução dos números de violência, de gestações e de abortos", diz profissional, graduada na Universidade Estadual do Ceará (Uece).
Irlena ainda cita o impacto do PL em casos de violência sexual contra menores de idade que, mesmo com o aborto legal nestes casos, ainda enfrentam dificuldades em interromper a gestão. "Se esse projeto passa, o Estado soltará de vez a mão dessas meninas, falhando na proteção antes da violência e negando proteção depois da violência", diz.
Já a equiparação ao crime de homicídio, para ela, tende a gerar "mais abortos na ilegalidade, sem a mínima segurança para meninas/mulheres". "Isso causará mais emergências e mais óbitos. Homens que abusam não terão mais o menor medo de abusar, afinal a vítima estará ainda mais amordaçada pelo Estado. Isso vai aumentar número de casos, consequentemente mais problemas para as áreas de saúde e segurança pública", afirma Irlena.
"Legalizar o aborto e criminalizar quem aborta são coisas diferentes. Quando você legaliza, você libera aborto nos termos da lei. Quando você criminaliza quem aborta, você responsabiliza criminalmente quem comete o aborto. Não precisa legalizar o aborto para descriminalizar quem aborta. No Brasil, o aborto não é livre. Essa pauta é uma desculpa moralista para manipular facilmente a opinião pública", acrescenta a especialista.
No último sábado, milhares de pessoas se reuniram em frente ao Museu de Arte de São Paulo (Masp), na Avenida Paulista, para protestar contra o projeto de lei que equipara o aborto legal ao crime de homicídio quando o procedimento é feito acima de 22 semanas de gestação. O ato fechou todas as faixas da avenida no sentido Consolação na altura do Masp por três quarteirões.
Entre os principais alvos da manifestação estavam o deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), autor do PL, e Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, responsável por conduzir a votação da tramitação de urgência, que ocorreu em apenas 23 segundos. O principal lema entoado pelos manifestantes foi "Criança não é mãe" e "Estuprador não é pai". (Ludmyla Barros, com Agência Estado)