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Fóruns da Deep Web voltados ao abuso e à tortura de crianças são alvos da PF
Reportagem

Fóruns da Deep Web voltados ao abuso e à tortura de crianças são alvos da PF

Mídias registrando a prática conhecida como "hurtcore" atraem criminosos do mundo inteiro. Em março, brasileiro foi preso suspeito de criar e administrar site com essa temática
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CAPA - DEEP WEB (Foto: CAMILA PONTES/ADOBE STOCK)
Foto: CAMILA PONTES/ADOBE STOCK CAPA - DEEP WEB
ALERTA! Este texto contém informações sensíveis com cenas de crueldade - estupro, tortura e morte - envolvendo crianças. 

Hurtcore é como ficou conhecida uma forma extrema de pornografia, caracterizada pelo registro em vídeos e imagens de atos de violência extrema — agressões, torturas, humilhações etc.—, praticados sempre de forma não consensual. É, sobretudo, na chamada Dark Web que esse tipo de material é compartilhado, aproveitando-se do anonimato garantido por programas específicos e pelo fato de o conteúdo lá produzido não ser indexado por ferramentas comuns de busca na internet, como o Google.

Em todo o mundo, erigiram verdadeiras comunidades ou mesmo mercados destinados à produção e à distribuição desse tipo de material. Inclusive no Brasil, como mostrou a operação Dark Don, deflagrada em março deste ano pela Polícia Federal (PF).

Na ação, foi preso Igor Fortes Machado, de 29 anos, apontado como fundador e administrador de dois fóruns (ou bate-papos) na Deep Web voltados ao compartilhamento de arquivos e relatos de atos de sadismo, praticados, especialmente, contra crianças. O caso tramita em segredo de justiça, mas O POVO obteve documentos judiciais que ajudam a contar detalhes sobre os crimes praticados nos sites.

No “Hurtland” (Terra da Dor, na tradução do inglês) e no “Yomi-no-Kuni” (Terra dos Mortos, na tradução do japonês) eram compartilhados fotos e vídeos de “abuso sexual com o emprego de grave violência, tortura e crueldade contra menores impúberes”, diz uma das decisões que a reportagem teve acesso.

De acordo com a investigação da PF, os dois fóruns eram espaços bastante reservados: foram identificados 32 integrantes no HurtLand e 31 no Yomi-no-Kuni. Para ter acesso aos sites, era preciso compartilhar, pelo menos, dez arquivos de pornografia infantil, uma “medida de segurança”, conforme destacou a PF, a fim de evitar, sobretudo, infiltração policial.

Ainda de acordo com a investigação, somente de maio a julho de 2023, Igor publicou no HurtLand 337 mensagens, criando ainda 67 tópicos e publicando, ao menos, 142 arquivos de abuso sexual infantil.

A PF descreveu que os sites dispunham de uma estrutura hierarquicamente ordenada com super moderadores, moderadores, doadores e contribuintes. Com essa sistematização, também ficou caracterizado, de acordo com o entendimento da PF, o crime de constituição de organização criminosa.

Outros pontos de sofisticação destacados pela PF incluem menções feitas a um marketplace, existente nos próprios fóruns, para a compra e venda do conteúdo criminoso. Esse mercado era movimentado “aparentemente” por criptomoedas, que também seriam usadas em doações para a manutenção dos sites. Além disso, a PF afirmou que Igor destacou um programador para o desenvolvimento do sistema de seguranças dos ambientes.

As investigações da PF tiveram início após autoridades policiais do Reino Unido informarem que era do Brasil o IP de “Boss”, o nickname do proprietário e administrador do HurtLand — posteriormente identificado como sendo Igor. O caso, então, passou a ser acompanhado pela Força Tarefa de Investigações na DarkWeb (FTDW) da PF, que, após autorização judicial, infiltrou agentes na comunidade.

Os investigadores constataram que Boss também era “Lúcifer”, usuário ativo no Yomi-no-Kuni — este site que foi o sucessor do HurtLand, conforme mensagem publicada naquele primeiro fórum convidando à migração para o segundo.

No Yomi-no-Kuni, Lúcifer publicou, de acordo com a PF, sete mensagens, que continham 15 mídias de abuso sexual infantojuvenil, isso em um período que vai de agosto de 2023 a janeiro de 2024.

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