Lucas Azevedo, promotor de Justiça do MPCE e coordenador do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude (CAOPIJ) informa que, em 2023, Fortaleza teve um avanço em relação aos processos de adoção com a implantação do Programa Municipal de Entrega Voluntária de Criança para Adoção, o "Entrega Legal à Adoção".
Ele está vinculado à Fundação da Criança e da Família Cidadã (Funci) e é responsável por ações que assistem, acompanham e atendem gestantes e parturientes que desejam entregar a criança para adoção logo após o nascimento.
Tudo isso para garantir a ambos, mulher e bebê, tratamento humanitário e direitos fundamentais. O programa partiu de uma resolução do Conselho Nacional de Justiça, que detalhou como todo o procedimento deve ser feito.
"De 2016 para cá, poucas cidades no Brasil implementaram de fato esse procedimento. E Fortaleza foi uma delas, estando entre as mais avançadas", explica Azevedo, acrescentando que, no Ceará, a Capital é a única cidade que já está com uma política bem implementada e em pleno funcionamento.
Segundo a Funci, foram realizados 247 atendimentos em 2023, sendo 62 mulheres assistidas. Ao todo, 23 crianças foram entregues para adoção. No primeiro semestre de 2024, foram 39 mulheres assistidas e 13 crianças entregues para adoção. Ao todo, foram 111 atendimentos.
Azevedo diz que o processo de adoção começa com um comunicado do nascimento da criança ao juiz e aos promotores de Justiça responsáveis. Em seguida, a criança é encaminhada a uma unidade de acolhimento do município, permanecendo por um ou dois meses até ser encaminhada à família pretendente, listada no Sistema Nacional de Adoção (SNA).
"Queremos, em um futuro próximo, melhorar esse fluxo, encaminhando parte dessas crianças ao serviço de família acolhedora, ao invés de esperarem na unidade de acolhimento. É muito melhor, porque elas são cuidadas por uma família individualizada antes de ser entregue à família que pretende adotá-la definitivamente", descreve o promotor.
A entrega de recém-nascidos para adoção é um direito da mulher, mas na maioria das cidades o processo ainda é lento, sem fluxos pré-definidos e com tempo de resposta do Judiciário maior.
"E aí você perde o benefício da entrega legal, porque seu grande valor é a rapidez com que essa criança vai ser entregue diretamente para a família que deseja adotá-la", explica Lucas. O objetivo é ampliar o Programa para uma gama maior de municípios cearenses.
"Eu não desejava ficar com o bebê desde quando soube da gestação, então foi uma decisão bem certa e segura que eu tinha na minha cabeça". Foi através de uma pesquisa pela internet que Mariana*, de 23 anos, ficou sabendo do Entrega Legal.
Ela explica que, ao pesquisar sobre orfanatos, o Google sugeriu um site que descrevia o programa e informava um e-mail para mais informações. Mariana entrou em contato e recebeu, depois, mais informações por WhatsApp, definindo a sua escolha.
Outro ponto que Mariana destaca é a atenção que recebeu da equipe médica. Segundo a mulher, ela foi tranquilizada e respeitada.
"Eu não consigo sequer resumir (a importância da Entrega legal). Eu tinha em mente a minha decisão, mas todo o resto era uma 'bagunça', então todo o acompanhamento, todo o cuidado me tranquilizou muito, me fez ter calma, me sentir amparada, segura e compreendida. Eu sou imensamente grata", finaliza.
Quem também descobriu o programa Entrega Legal por meio da internet foi Gabriela*, de 32 anos. As buscas a levaram para o programa, mas as informações mais detalhadas ela obteve na própria maternidade.
Para Gabriela, a decisão foi tomada quando descobriu que não seria capaz de fazer o aborto, entre o terceiro e quarto mês de gestação. Porém, só procurou o programa já no momento do parto.
"A equipe (médica) que me atendeu foi maravilhosa, me senti segura e acolhida. Não percebi em nenhum momento julgamento ou coisa do tipo. Todos me trataram muito bem, e com muita humanidade", declara.
E completa: "O fato é que essa criança terá a oportunidade de viver com uma família que realmente a quer e que tem condições para cuidar e amar".
*Nomes fictícios, para preservar a identidade das entrevistadas