Natal sempre me leva a refletir sobre o que passou e o que ainda pode vir. Talvez seja esse espírito de renovação que me inspirou a olhar para o ano paralímpico com olhos que vão além das competições e dos pódios. Afinal, cada atleta traz uma história, e a minha, aos 64 anos, tem sido escrita com o arco e flecha em mãos e a esperança como guia.
Sempre fui enfermeiro, cuidando de crianças que enfrentavam a dura realidade de perderem partes do corpo. Eu dizia a elas que ainda havia muito o que viver e fazer, mas nem sempre minhas palavras bastavam. Então, comecei a gravar vídeos de arco e flecha, mostrando o que era possível. Apresentei a elas imagens de Matt Stutzman, um atleta que me inspirou profundamente. Anos depois, tive o privilégio de mostrar meus próprios vídeos. Não era apenas sobre mim, mas sobre como renascer, mesmo quando o mundo parece estar desabando.
Minha vida mudou quando a espondilite anquilosante me levou a necessitar de uma cadeira de rodas. Foi um processo lento e doloroso, que exigiu bengalas, muletas e, finalmente, a aceitação de uma nova realidade. Diagnósticos de diabetes, hipertensão, doença de Parkinson e um aneurisma cardíaco apenas adicionaram novos desafios. Ainda assim, não me deixei abater. Meu trabalho com pacientes me ensinou que a vida é imprevisível, mas sempre podemos escolher como reagir. E eu escolhi sorrir e mirar para frente.
Foi em 2014, vivendo na Europa, que o arco e flecha se tornou mais do que um passatempo de inverno. Ele se transformou na minha âncora, no esporte que me conectava às possibilidades. Naquele mesmo ano, assisti à final da Copa do Mundo de tiro com arco em Paris pela TV. Algo em mim despertou. "Eu quero estar ali. Eu vou competir em Paris", prometi a mim mesmo. Agora, aqui estou eu, tendo realizado esse sonho na Paralimpíada de 2024.
Competições me motivam, mas o que realmente me move é a ideia de inspirar outros. Mesmo aposentado da enfermagem, encontro tempo para compartilhar minha história com pacientes e mostrar que as fronteiras existem apenas na mente. O arco e flecha mudou minha vida e a de muitos outros. Ele é inclusivo, acolhedor, e prova que sempre há um lugar para todos — sejam atletas com deficiência, sejam pessoas mais velhas que buscam algo novo.
Neste Natal, é isso que desejo: que todos encontrem o que os faz renascer, o que os faz olhar para o futuro com esperança. No esporte, na arte, na vida — onde for. Que o próximo ano traga não apenas conquistas, mas novos começos. Se um enfermeiro em cadeira de rodas pode almejar Paris e alcançá-la, o que mais nós, juntos, não podemos conquistar? Que venha 2025, com todo o seu brilho e suas promessas.