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Quem depende de quem: Relação comercial entre EUA e Brasil movimenta US$ 80 bilhões em 2024
Reportagem

Quem depende de quem: Relação comercial entre EUA e Brasil movimenta US$ 80 bilhões em 2024

Nunca o comércio entre Brasil e Estados Unidos esteve tão equilibrado. Brasil vendeu para os Estados Unidos mais de US$ 40,3 bilhões, enquanto comprou aproximadamente US$ 40,5 bilhões, o que representa um saldo pró-estadunidense. Setores exportadores acompanham com apreensão discursos de Donald Trump
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Donald Trump se mostrou avesso a aprimorar relação comercial com países da América Latina, como o Brasil (Foto: Jim WATSON / POOL / AFP)
Foto: Jim WATSON / POOL / AFP Donald Trump se mostrou avesso a aprimorar relação comercial com países da América Latina, como o Brasil

"Eles precisam de nós mais do que precisamos deles", afirmou o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A declaração, contudo, não encontra respaldo nos dados da balança comercial entre os países, que em 2024 apresentou o melhor saldo pró-Brasil em uma década.

De acordo com informações consolidadas pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic), a troca comercial entre Brasil e Estados Unidos superou US$ 80 bilhões. No entanto, a série histórica recente revela que, apesar dos EUA serem o segundo maior parceiro comercial do Brasil, seu peso no comércio exterior brasileiro caiu nos últimos 20 anos.

Foram exportados US$ 40,3 bilhões em bens brasileiros para o mercado norte-americano, enquanto US$ 40,5 bilhões em produtos estrangeiros ingressaram no Brasil.

Embora o saldo tenha sido favorável aos Estados Unidos, com US$ 253,3 milhões, esse resultado representa o desempenho mais positivo para o Brasil nos últimos dez anos.

Nos últimos dez anos, o déficit médio da balança comercial brasileira com os Estados Unidos foi de US$ 4,63 bilhões. O pior registro ocorreu em 2022, quando o saldo negativo chegou a US$ 13,86 bilhões.

A partir de então, a dinâmica entre os dois países começou a mudar. As exportações brasileiras cresceram significativamente nos dois anos seguintes, reduzindo o déficit para US$ 1,04 bilhão em 2023 e para apenas US$ 253 milhões em 2024.

Em suma, existe uma interdependência. E mesmo que entre janeiro e outubro do ano passado houve alta no volume exportado dos EUA para o Brasil de 11%, em 20 anos, a participação dos Estados Unidos para nossas terras caiu acima de 10 pontos percentuais, quando saiu de 24% em 2001 a 12% em 2024.

Vale mencionar que a pauta exportadora brasileira ainda é composta, majoritariamente, por produtos primários, enquanto os itens norte-americanos que chegam ao Brasil são majoritariamente industrializados. 

Ainda assim, há maior demanda dos Estados Unidos por itens como derivados de petróleo, aço, celulose e café brasileiros, em comparação aos lubrificantes, óleos brutos e betumes norte-americanos, que enfrentaram queda na procura no mercado brasileiro. Sendo assim, o País fica em 16º dentre as nações que mais exportam para lá é o 27º em importação de mercadorias norte-americanas.

Para César Augusto Bergo, economista e integrante do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF), a economia brasileira não é irrelevante, como sugere Donald Trump.

Segundo Bergo, as declarações refletem a postura de um líder apressado em implementar sua agenda e projetar força. Entretanto, o histórico de seu governo com o Brasil demonstra uma relação pragmática e, em alguns momentos, até de rejeição, apesar das tentativas de aproximação por parte de Jair Bolsonaro.

"Em relação à América Latina, ele trata a região com desdém, como se fosse um quintal dos Estados Unidos. No entanto, é impossível desprezar o Brasil, que tem o oitavo maior PIB do mundo", afirma.

No contexto do relacionamento bilateral, Bergo avalia que o Brasil mantém uma posição favorável no comércio com os Estados Unidos, especialmente pela presença de multinacionais que operam no país há décadas.

"Embora a balança comercial seja desfavorável ao Brasil, há benefícios mútuos, especialmente na área industrial e em produtos de maior valor agregado", avalia.

Em resumo, Bergo defende que o Brasil adote uma postura neutra, mantendo boas relações não apenas com os Estados Unidos, mas também com outros grandes mercados, como Europa e China, fortalecidos pelo acordo entre Mercosul e União Europeia e pelo crescimento do Brics.

Isso porque, vale ressaltar que, apesar de os países terem uma relação global e uns dependerem dos outros, retaliação norte-americana seria prejudicial a qualquer nação, sobretudo para as em desenvolvimento

"A diplomacia brasileira tem habilidade para buscar caminhos equilibrados. Um exemplo foi a manifestação recente do presidente Lula, que desejou sucesso ao governo americano. Uma resposta moderada, porém eficaz. O Brasil deve focar no seu potencial e evitar conflitos desnecessários", conclui.

 

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BRICS GANHA FORÇA

As exportações brasileiras para os países do Brics superaram, em volume, as destinadas aos Estados Unidos. Em 2018, o bloco demandou US$ 70 bilhões, 2,5 vezes mais que os US$ 28 bilhões enviados aos EUA. Em 2023, o total chegou a US$ 123 bilhões, 3,3 vezes superior aos US$ 36,9 bilhões norte-americanos.

200 ANOS DE RELAÇÕES

Em maio de 2024, Brasil e Estados Unidos celebraram o bicentenário de suas relações diplomáticas. O país é o segundo maior comprador de produtos brasileiros, atrás da China, e o terceiro maior fornecedor internacional. A presença dos EUA no Brasil também se destaca nos setores de serviços e investimentos, com US$ 10 bilhões em aportes diretos em 2023, segundo o Banco Central.

FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 12-11-2024: Governo certifica  jovens que concluíram o primeiro ciclo de formação de multiplicadores do Projeto H-TEC. A cerimônia no Senai da Barra do Ceará, com a presença do governador Elmano de Freitas e o Presidente da FIEC, Ricardo Cavalcante. (Foto: Samuel Setubal/ O Povo)
FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 12-11-2024: Governo certifica jovens que concluíram o primeiro ciclo de formação de multiplicadores do Projeto H-TEC. A cerimônia no Senai da Barra do Ceará, com a presença do governador Elmano de Freitas e o Presidente da FIEC, Ricardo Cavalcante. (Foto: Samuel Setubal/ O Povo)

Relação com EUA é vantajosa, diz Fiec

A relação comercial entre Brasil e Ceará com os Estados Unidos tende a permanecer sólida, avalia Ricardo Cavalcante, presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec). Para o executivo, o momento político atual é "peculiar" e reflete a urgência do novo governo americano, mas não compromete os esforços brasileiros por um diálogo positivo.

"O presidente dos EUA tem prazos curtos para atender às demandas do eleitorado, especialmente na área energética", explica. Cavalcante observa que os Estados Unidos enfrentam desafios imediatos nesse setor. "Enquanto a China consome 51% da energia global, os EUA consomem 19%. Nesse cenário, esperar por novas fontes energéticas é inviável para atender à necessidade atual."

Sobre o comércio entre Ceará e EUA, ele destaca: "Metade das nossas exportações é destinada aos norte-americanos, incluindo produtos como aço, amplamente consumido por eles. Apesar das incertezas, mantemos uma relação estável e vantajosa."

Dados da balança comercial apontam que o Ceará tem historicamente saldos positivos no comércio com os EUA. Desde 2018, apenas 2022 apresentou saldo negativo (US$ 845,1 milhões). Em 2024, o Estado alcançou um saldo positivo de US$ 235,9 milhões. Do total exportado de US$ 1,468 bilhão, US$ 659 milhões (45,2%) tiveram como destino os Estados Unidos.

Rogério Sobreira, economista-chefe do Banco do Nordeste (BNB), alerta que as falas de Trump alimentam incertezas econômicas, especialmente quanto à possibilidade de tarifas adicionais na relação comercial. "O ano de 2025 traz um cenário internacional mais incerto. A chegada do novo governo americano, por exemplo, gera preocupações sobre a implementação de tarifas comerciais. Não sabemos como isso será conduzido, o que adiciona instabilidade", pontua.

Sobreira observa que as projeções para o PIB global são mais otimistas do que inicialmente esperado. Ele ressalta que economias como a dos Estados Unidos e da China têm demonstrado resiliência e até sinais de leve aceleração, afastando, ao menos por ora, o risco de uma recessão global.

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