O que você pensou quando viu a primeira notícia sobre o chamado, à época, novo coronavírus? E agora, cinco anos depois, o que você lembra da pandemia? Seja um trauma ou uma memória distante, ela atingiu a todos. O Sars-CoV-2 infectou e foi se espalhando pelo mundo como ele age no nosso corpo. De forma fulminante e inesperada. Nesse cenário, a pesquisa científica ficou sob os holofotes e provou seu valor. Além do vírus, enfrentou a desinformação.
Foram quase 13 milhões de vidas perdidas no mundo entre 2020 e 2021, conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS). A tragédia seria ainda maior se não fosse o esforço dos profissionais e pesquisadores da saúde. A ciência salvou milhares de vidas e vai continuar a salvar tantas outras. Ela evoluiu e os esforços realizados no contexto de pandemia perduram.
Enquanto as ruas se esvaziavam e os hospitais ficavam abarrotados, cientistas buscavam respostas e soluções. Na luta contra o vírus, a tecnologia de vacinas deu um salto e a vigilância genômica se fortaleceu. O Elmo saiu da academia como alternativa de respiração assistida menos invasiva para pacientes na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Com a urgência do cenário de emergência a nível global, o compartilhamento de dados foi mais intenso, bem como o investimento nessas tecnologias.
Sandra Monteiro, secretária da Ciência, Tecnologia e Educação Superior (Secitece) do Ceará, cita que houve um aumento significativo nas publicações científicas durante a pandemia relacionadas à crise de saúde, com um rápido compartilhamento de informações para acelerar as investigações.
Foi observada uma intensa integração entre governo, academia e setor empresarial para o desenvolvimento de produtos e soluções para a sociedade.
Na perspectiva de Fábio Miyajima, chefe da Rede de Vigilância Genômica da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e professor/pesquisador voluntário da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), a pandemia demonstrou a importância da colaboração entre cientistas, universidades e governo para o desenvolvimento de soluções tecnológicas e vacinas em tempo recorde.
Por outro lado, segundo o pesquisador, a pandemia expôs a necessidade de autossuficiência na produção de insumos e medicamentos no Brasil. "Seja para fazer os testes diagnósticos, para produzir medicamentos, para produzir EPI (equipamentos de proteção individual), para ter um plano de contingência em que a gente não dependa de importação para situações de emergência como a pandemia", frisa.
Sobre o legado, ele calcula: "A gente pode dizer que tem um avanço em relação ao que a gente tinha antes da pandemia, mas não é o ideal dentro do que a gente sabe que poderia ter caminhado".
Fábio ressalta que, apesar dos avanços, ainda há um longo caminho a percorrer para alcançar um cenário ideal em termos de preparação e resposta a futuras emergências sanitárias. Há ainda a necessidade de investir em ciência, tecnologia e capacitação de profissionais, além de promover a autossuficiência na produção de insumos e medicamentos no Brasil.
As vacinas e a tecnologia de RNA mensageiro
Embora o RNA mensageiro seja pesquisado há décadas, os primeiros imunizantes com a tecnologia inovadora a serem aprovados e aplicados em larga escala foram no contexto de combate à Covid-19.
Raquel Stucchi, médica infectologista e professora da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), destaca a vacina de RNA mensageiro como o principal ganho tecnológico do período de emergência em relação à Covid-19, tanto pelo impacto no controle da pandemia quanto pelo potencial para utilização em outras doenças.
As vacinas de RNA mensageiro são baseadas em sequências do vírus que induzem o sistema imune a produzir uma resposta mais direcionada contra o patógeno. Para isso, se identifica a parte responsável pela formação de anticorpos que conferem proteção ao entrar em contato com o vírus. Esses genes são isolados e utilizados para criar o RNA mensageiro.
O RNA mensageiro é incorporado em uma molécula de gordura. Ao entrar no organismo, esse RNA mensageiro passa a produzir a parte do vírus que induz o organismo a fabricar anticorpos. Houve várias modalidades e variações da vacina de RNA, por exemplo, produzidas pela Moderna e pela Pfizer.
"O principal avanço tecnológico real e que acho que todos puderam perceber, com um impacto importante no controle da pandemia, foram as vacinas", avalia Raquel Stucchi. Ela inclui as vacinas de vírus inativado e de vetor viral, que foram extremamente importantes no início da vacinação porque conseguiram garantir a proteção da população prioritária e que tinha maior risco de morrer.
Ela destaca também os antivirais. Atualmente, temos dois antivirais importantes para impedir que os pacientes de risco tenham formas mais graves de Covid-19 e que pacientes em estado mais grave possam ter uma chance maior de recuperação: o Paxlovid e o Remdesivir. A pesquisadora também cita o desenvolvimento de anticorpos monoclonais, embora com limitações devido às variantes do vírus.
Flávio Guimarães da Fonseca, pesquisador do Departamento de Microbiologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Virologia, concorda que a rapidez no desenvolvimento de vacinas, especialmente as de RNA mensageiro,foi o legado crucial.
"A pandemia de Covid-19 trouxe a oportunidade de testar novos protocolos vacinais. As vacinas de RNA mensageiro talvez levassem muito mais tempo para chegar eh à população", afirma. Ele acredita que a pandemia acelerou o processo de desenvolvimento e testagem de vacinas, mostrando que é possível criar vacinas em tempos menores, mantendo a segurança e eficácia.