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Capacete Elmo: inovação cearense que transformou o combate à Covid
Reportagem

Capacete Elmo: inovação cearense que transformou o combate à Covid

|Impacto|Da urgência da pandemia ao legado na saúde, a tecnologia que salvou vidas segue evoluindo
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LABORATÓRIO do RespiLab, que elaborou o equipamento Elmo. Na foto, o professor Marcelo Alcântara (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS LABORATÓRIO do RespiLab, que elaborou o equipamento Elmo. Na foto, o professor Marcelo Alcântara

Poucos dias após os primeiros decretos de lockdown por causa da pandemia, o médico, pesquisador e professor Marcelo Alcântara Holanda acompanhava os debates globais sobre a insuficiência de ventiladores mecânicos e leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para tratar os infectados pela Covid-19. Em meio a dilemas, pesquisas e notícias alarmantes, nasceu uma ideia revolucionária: o capacete Elmo.

Os primeiros protótipos logo surgiram. Desde então, mais de 11 mil unidades do Elmo, que atenderam aproximadamente 40 mil pessoas, foram vendidas ou doadas, evitando a intubação de 66% dos usuários, segundo o estudo ELMO Registry, conduzido pela Gerência de Pesquisa em Saúde da Escola de Saúde Pública do Ceará (ESP/CE), vinculada à Secretaria da Saúde do Estado (Sesa).

O impacto do dispositivo no combate à Covid-19 garantiu dezenas de premiações ao projeto, incluindo a Medalha da Abolição em 2022, a mais alta honraria do Ceará — a primeira concedida a um projeto. 

Idealizado em abril de 2020, o equipamento foi desenvolvido, testado, patenteado e aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em menos de um ano, impulsionado pela urgência da pandemia. Cinco anos depois, ainda é utilizado em tratamentos de insuficiência respiratória.

O futuro já aponta para novas versões, como o Elminho e o Elmo 2.0, e protocolos, segundo o professor Marcelo Alcântara. Com o fim da emergência, os investimentos na ciência voltaram a se tornar um obstáculo a ser superado. 

O pesquisador lembra que as primeiras medidas restritivas em Fortaleza foram anunciadas e o debate mundial era sobre a falta de respiradores (ventilador mecânico) e de leitos de UTI: "A taxa de intubação era de cerca de 4%, mas o volume de casos era tão grande que a demanda superava a capacidade do sistema de saúde".

Com a constatação de que a quantidade de leitos e ventiladores disponíveis não seria compatível com a demanda, a Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap) convocou uma reunião com diferentes gestores. 

Marcelo conta que a expectativa era de que um respirador de baixo custo, inspirado em um modelo belga, fosse desenvolvido. Um equipamento de alta qualidade, como demandava o funcionamento em 24h, não era possível, alertou o médico. A recusa causou surpresa.

Foi então que Marcelo teve que apresentar uma ideia inovadora: um dispositivo que prevenisse a intubação. Nesse momento, a ideia do Capacete Elmo ganhou força. O dispositivo, inspirado em um modelo de capacete italiano, ganhou seu primeiro protótipo duas semanas após a reunião.

No primeiro teste, o pesquisador relembra que a equipe ficou animada ao ver o capacete inflar após o manequim ser ligado. "Aí botou no manequim, ligamos lá e o bicho insuflou, né? Ficou bonitinho. Todo mundo ficou feliz, né? Aí eu: 'vamos ver se o cara tossiu se o capacete aguenta, né?', porque o meu medo era o contágio." Foi quando Marcelo deu uma leve batida na cúpula do capacete, para simular um aumento de pressão: "Pá. Rasgou", confessa.

Sem desânimo, a equipe continuou trabalhando e, duas semanas depois, já tinha um novo protótipo. "Dessa vez, a costura era melhor," explica o pesquisador. "Mas assim, a base era ruim. Enfim, o tamanho não era o ideal".

Entre um ajuste aqui e outro acolá, nove protótipos foram criados, em tempo recorde, até que um deles fosse considerado adequado, em junho de 2020.

Para os primeiros testes, os próprios especialistas se voluntariaram, reunindo-se em um laboratório improvisado no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), da sede Parangaba, para dar início aos primeiros ensaios. Era fundamental que a equipe confiasse no dispositivo antes de testá-lo em pacientes. E deu certo. Após garantir a confiabilidade do equipamento e seguir os trâmites burocráticos, em julho, os primeiros pacientes começaram a usá-lo.

Apesar disso, o pesquisador conta que precisou enfrentar outros desafios, como a dificuldade do Governo Federal em expandir o acesso e distribuição do equipamento.

Ao fim da pandemia, o equipamento passou a ser utilizado no tratamento de outras doenças, em estudos clínicos para tratar condições como Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), enfisema, bronquite e pacientes pós-operatórios de cirurgia cardíaca. Esses projetos estão sendo conduzidos em parceria com a Universidade Federal do Ceará (UFC).

Linha do tempo

2019 - O vírus foi identificado pela primeira vez a partir de um surto em Wuhan, na China, em dezembro daquele ano.


2020 - Começo da pandemia, isolamento social e muitas dúvidas


- 30 de janeiro

OMS classifica o surto como Emergência de Saúde Pública de Âmbito Internacional (PHEIC).


- 26 de fevereiro

Primeiro caso de Covid-19 no Brasil é confirmado


- 11 de março

OMS classifica o caso como pandemia


- 12 de março

Primeira morte é registrada no País, em São Paulo


- 15 de março

No Ceará, acontece o registro oficial dos primeiros três casos


- 2 de abril

Mais de 3,9 bilhões de pessoas, metade da humanidade, são obrigadas ou instadas a se confinar, segundo a AFP


- 3 de maio

100 mil casos confirmados no Brasil


- 13 de maio

Ceará supera a marca de 100 novas mortes registradas em 24 horas pela 1ª vez


- 5 de junho

Ministério da Saúde retira do ar portal com dados oficiais sobre a Covid-19


- 8 de agosto

Brasil passa de 100 mil mortos por Covid-19


- 13 de agosto

Ceará torna obrigatório o uso de máscara em espaços públicos e privados


- 8 de dezembro

Reino Unido se torna o primeiro país do Ocidente a aplicar a vacina contra a Covid-19 fora do contexto dos testes clínicos.


2021 - Segunda onda, falta de oxigênio, recorde de mortes e início da vacinação


- 14 de janeiro

Estoque de oxigênio em Manaus se esgota e sistema de saúde colapsa, com dezenas de mortes por asfixia de pacientes com Covid-19.


- 17 de janeiro

Anvisa aprova o uso emergencial da CoronaVac e vacinação começa no Brasil


- 8 de fevereiro

Primeiros casos da P1 no Ceará são divulgados. Variante foi identificada inicialmente em Manaus e um dos principais fatores para a segunda onda no Brasil


- 23 de março

Pela primeira vez, mais de 3 mil mortes por Covid-19 são registradas em um dia no Brasil


- 26 de abril

Número de mortes por Covid-19 em 2021 (195.848) supera o de 2020 no País


- 29 de abril

Brasil bate a marca dos 400 mil mortos


- 1 de julho

Brasil registra queda de 40% das mortes com avanço vacinal


- 6 de agosto

50% da população brasileira tomou ao menos uma dose da vacina contra Covid-19 e 22% estava com o esquema vacinal completo


- 5 de novembro

OMS identifica a variante ômicron do SARS-CoV-2, que foi registrada no Brasil pela primeira vez no dia 30 do mesmo mês


- 16 de dezembro

Anvisa aprova uso de vacina contra Covid-19 em crianças de cinco a 11 anos


2022 - Queda de casos e mortes, avanço da vacinação e retomada da vida “normal”


26 de Janeiro - Pico de casos, com mais de 224 mil novos casos em um dia. Contudo, taxa de letalidade é menor


17 de abril - O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, encerra a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN) por Covid-19 no Brasil


17 de agosto - Anvisa determina o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras em aeroportos e aeronaves no Brasil


2023 - O depois


- 5 de maio

Covid-19 não é mais uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII), decide OMS

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