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Mercados públicos de Fortaleza resistem entre tradição e precariedade
Reportagem

Mercados públicos de Fortaleza resistem entre tradição e precariedade

Questionada, a Prefeitura de Fortaleza afirma que está fazendo um levantamento das condições dos mercados e da regularização de permissionários
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MERCADO do Carlito Pamplona (Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal MERCADO do Carlito Pamplona

Gente andando de um lado para o outro com pressa, o cheiro de carne cozida e feijão inundando o ambiente, clientes antigos e novos fazendo o comércio girar. Esse é o cenário de uma manhã no Mercado da Messejana, um dos 12 mercados públicos de Fortaleza que ainda resistem ao tempo.

Prédio histórico construído no século XIX, o mercado faz parte de um modelo comercial que visava descentralizar a venda de alimentos frescos. Esses equipamentos entraram em declínio com a chegada e popularização dos supermercados. Apesar disso, os permissionários lutam para continuar trabalhando em meio a condições precárias de estrutura.

“Quem pensa na Messejana, esse mercado é referência”, diz Sérgio Freitas, 53, um dos permissionários mais antigos do local. Ele herdou o ponto do pai e já trabalha no mercado há 18 anos.

“A mãe trazia o filho e hoje é o filho que compra a linha, botão. Em termos de venda, aqui é bom”, diz Glória da Silva, 53, permissionária de um armarinho que também assumiu o ponto do pai e trabalha frente a frente com Sérgio.

No entanto, é só conversar por pouco tempo com os trabalhadores que as reivindicações começam a surgir. “Precisa de muita reforma. Quem trabalha aqui já sabe. Às vezes tem uma reforma e a pessoa fica naquela expectativa de ter uma melhora. E não tem, faz só uma maquiagem”, reclama Glória.

Os pedidos são por uma manutenção geral, mas um ponto é mencionado por todos: os banheiros do equipamento. Canos entupidos, sanitários quebrados e a impossibilidade de usar os banheiros dificultam o dia a dia do trabalhador e a experiência dos clientes. “O pessoal pergunta aqui onde tem banheiro, chega dá uma tristeza de dizer”, comenta Glória.

No Mercado da Bela Vista, inaugurado em 1967, o fluxo é diferente. A movimentação tímida dos clientes vai ao encontro da quantidade de boxes fechados. Os problemas relatados pelos permissionários vão desde a limpeza precária à falta de visibilidade do equipamento.

“Não tem nem uma placa dizendo que existe o mercado. Desde a reforma há cinco, seis anos, a gente não teve mais nenhum tipo de manutenção. Nosso quadro de energia já pegou fogo. A iluminação é precária, com luzes queimadas”, relatou Júlio César Monte, 50, permissionário há cinco anos.

A limpeza da lixeira de uso comum pelos permissionários é outro ponto de tensão. Maria José dos Santos, 77, que vende frutas e verduras no mercado há 42 anos, explica que o local de despejo dos resíduos é mal utilizado, por isso exala mau cheiro.

Somado a isso, Júlio César diz que o mercado só recebe coleta de lixo três vezes por semana. “Dia de segunda-feira é insuportável aqui”, conta. Para ele, tudo isso contribui para a diminuição da freguesia.
Ele também reivindica a abertura de boxes fechados. “Duas moças que começaram aqui há uma semana tentavam há quase dois anos numa fila de espera [para se tornar permissionário]. Se existe uma fila, por que não bota para andar?”, questiona Júlio.

Os sinais de precarização do Mercado do Carlito Pamplona, na regional 1, começam ainda na rua. As calçadas quebradas e a parede pichada denunciam a falta de manutenção. Apesar de precisar de reformas, o local mantém uma boa quantidade de clientes.

Gardênia Castelo Moreira, 58, já está trabalhando no mercado há mais de 40 anos, e reclama que faz anos da última reforma e, nesse período, “não ajeitaram nem uma telha”.

“O que precisa ajeitar? Tudo. Às vezes nem produto de limpeza tem. Se chover lá fora, chove aqui dentro”, diz. Mesmo assim, não se queixa da clientela. “Me procuram por causa do meu atendimento, da qualidade de mercadoria. Até hoje minha venda é muito boa. Quem faz o comércio é a gente”, afirma.

Comerciantes relatam dúvidas e inseguranças por falta de termo de permissão

A situação de irregularidade de alguns permissionários dos mercados causa dúvidas e inseguranças. Diversos comerciantes relatam estar com o termo de permissão — necessário para trabalhar nos boxes dos mercados — desatualizado.

O termo funciona como uma autorização temporária para utilizar um bem público. Em 2024, a Lei nº 11.468 foi aprovada e sancionada, dispondo sobre a regulamentação de espaços e permissionários dos mercados públicos de Fortaleza.

O dispositivo legal permite que o poder Executivo possa conceder aos atuais permissionários dos mercados o direito de permanecerem utilizando os respectivos boxes e quiosques. No entanto, nem todos tiveram os termos regularizados.

“A gestão passada eu creio que deu o termo de permissão para alguns permissionários. Não foi geral, não sei por que”, diz Betinho Dourado, 43, comerciante do Mercado São Sebastião, na regional 12.

Ele está com o termo atualizado, mas Rafael Bruno Silva, 39, dono do box quase ao lado e também vendedor de frutas, não. Rafael afirma que não consegue nem mesmo ver o seu cadastro no site da Secretaria de Finanças de Fortaleza (Sefin).

Júlio César Monte, 50, permissionário há cinco anos do Mercado da Bela Vista, na regional 11, conta que o termo foi suspenso durante a pandemia e, quando voltou a ser cobrado, precisou pagar a taxa com juros. “Agora não sei como vai ser”, afirma.

De acordo com a Prefeitura de Fortaleza, apenas quatro dos 51 permissionários do Mercado da Bela Vista estão com o termo de autorização válido. Cada regional deve reorganizar a situação dos próprios equipamentos, mas não há prazo específico para o serviço ser realizado.

O comerciante Francisco Naélio, 36, que trabalha em um box do Mercado da Messejana, na regional 6, afirma que o mesmo aconteceu com ele. No entanto, a cobrança não é igual para todos. “Já perguntei por aqui e tem pessoas que não pagam”, disse.

O secretário da Regional 6, Alexandre Medeiros, explicou que é preciso fazer um levantamento para saber o real cenário dos permissionários. “Precisamos que seja refeito todo um estudo para saber quem está legalizado, quem está atrasado”, afirma.

Por enquanto, a ideia é não dar permissões para novos comerciantes no Mercado ou na Feira de Messejana, localizados lado a lado. O estudo deve ser iniciado após o Carnaval.

Levantamento de condições de mercados públicos é realizado, diz Prefeitura

Para conseguir atender às demandas de infraestrutura dos 12 mercados públicos de Fortaleza, a Prefeitura afirma que está fazendo um levantamento das condições estruturais dos prédios e da regularização dos permissionários.

No Mercado da Messejana, os banheiros, que são o maior ponto de reclamação dos permissionários, foram vistoriados no fim de janeiro. Conforme o secretário da Regional 6, Alexandre Medeiros, a situação é decorrente de problemas no esgotamento sanitário do equipamento.

“Solicitei também a vistoria da iluminação. Apesar de só funcionar de manhã, precisa dessa iluminação noturna”, diz Alexandre.

Também na Regional 6, o Mercado da Aerolândia é outro que chama atenção pela estrutura de metal histórica, igual a do Mercado dos Pinhões, no Centro, mas não abriga mais atividades de comércio.

O local está fechado desde 2020 e recebeu promessa de reforma na gestão municipal anterior, em 2024. No entanto, questionada sobre isso, a Prefeitura não deu prazos para realizar a requalificação.

“Nos primeiros 100 dias de gestão, o foco das ações da Prefeitura está voltado à limpeza urbana e a intervenções nas unidades municipais de saúde, a fim de priorizar o bem-estar imediato dos fortalezenses. Demais obras serão avaliadas pelo prefeito e seu secretariado posteriormente”, afirmou por meio de nota conjunta as secretarias da Infraestrutura (Seinf) e da Cultura (Secultfor).

“A minha ideia seria fazermos um polo gastronômico. Seria até mais interessante. Se fizer dentro, do lado de fora fazer feirinha de artesanato. Ficaria revitalizada uma área que está abandonada”, pondera Alexandre, que ainda deve conversar com a população do bairro sobre as ideias.

Já o Mercado da Bela Vista, administrado pela regional 11, foi visitado no dia 4 de fevereiro pelo gestor da secretaria, Júlio Costa. Conforme a Prefeitura, o local será “mapeado para futuras benfeitorias”. A última reforma no equipamento foi realizada em 2019.

Quanto à reclamação dos permissionários sobre a falta de limpeza e coleta seletiva insuficiente, apenas três vezes por semana, o município respondeu que “o mercado passa por limpeza diária, garantindo a manutenção da higiene e organização”.

Na regional 4, o Mercado dos Peixes do Montese, como é conhecido o Mercado Paulo Mota, também deve receber serviços de conservação. Foram mapeadas necessidades de reparos na cobertura e na porta de entrada, segundo a Prefeitura.

O Mercado do Carlito Pamplona, na regional 1, e o Mercado São Sebastião, localizado na regional 12, foram contemplados por uma licitação lançada em 2024 para realização de reformas.

O valor de R$ 9.950.000 será dividido entre os dois equipamentos, com R$ 7,9 milhões destinados ao São Sebastião e R$ 2,049 milhões ao Carlito Pamplona. Os recursos provêm de convênio com a Caixa Econômica Federal, somada à contrapartida da Prefeitura.

No edital do certame são listadas as principais intervenções que a construtora vencedora deverá realizar. No Mercado São Sebastião, é preciso trocar revestimentos das fachadas, dos banheiros, pisos, forros PVC, recuperar estruturas metálicas e de concreto, requalificar guarda-corpos e calhas de drenagem, além da revisão de instalações elétricas e hidrosanitárias.

No Mercado do Carlito Pamplona, é necessário realizar pintura, implantação do sistema de proteção contra incêndio, manutenção da cobertura metálica e de esquadrias, construção de uma nova caixa d’água e a instalação de plataforma elevatória de acessibilidade (elevador).

Segundo Adams Gomes, secretário da regional 12, apesar da licitação já ter uma construtora vencedora, o contrato ainda não foi assinado. A expectativa é de que as obras no São Sebastião possam iniciar ainda neste semestre.

“Vamos fazer a obra com as coisas funcionando. Fazer de uma forma que não vai atrapalhar tanto”, explica.

FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 22-01-2024: Situação da estrutura com algumas defeitos no Mercado da Aerolândia. (Foto: Samuel Setubal/ O Povo)
FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 22-01-2024: Situação da estrutura com algumas defeitos no Mercado da Aerolândia. (Foto: Samuel Setubal/ O Povo)

Prefeitura faz levantamento sobre condições estruturais e de permissionários

Para conseguir atender às demandas de infraestrutura dos 12 mercados públicos de Fortaleza, a Prefeitura afirma que está fazendo um levantamento das condições estruturais dos prédios e da regularização dos permissionários.

No Mercado da Messejana, os banheiros, que são o maior ponto de reclamação dos permissionários, foram vistoriados no fim de janeiro. Conforme o secretário da Regional 6, Alexandre Medeiros, a situação é decorrente de problemas no esgotamento sanitário do equipamento.

"Solicitei também a vistoria da iluminação. Apesar de só funcionar de manhã, precisa dessa iluminação noturna", diz Alexandre.

Também na Regional 6, o Mercado da Aerolândia é outro que chama atenção pela estrutura de metal histórica, igual a do Mercado dos Pinhões, no Centro, mas não abriga mais atividades de comércio.

O local está fechado desde 2020 e recebeu promessa de reforma na gestão municipal anterior, em 2024. No entanto, questionada sobre isso, a Prefeitura não deu prazos para realizar a requalificação.

"Nos primeiros 100 dias de gestão, o foco das ações da Prefeitura está voltado à limpeza urbana e a intervenções nas unidades municipais de saúde, a fim de priorizar o bem-estar imediato dos fortalezenses. Demais obras serão avaliadas pelo prefeito e seu secretariado posteriormente", afirmou por meio de nota conjunta as secretarias da Infraestrutura (Seinf) e da Cultura (Secultfor).

"A minha ideia seria fazermos um polo gastronômico, do lado de dentro. Seria até mais interessante. E do lado de fora fazer feirinha de artesanato. Ficaria revitalizada uma área que está abandonada", pondera Alexandre, que ainda deve conversar com a população do bairro sobre as ideias.

Já o Mercado da Bela Vista, administrado pela regional 11, foi visitado no dia 4 de fevereiro pelo gestor da secretaria, Júlio Costa. Conforme a Prefeitura, o local será "mapeado para futuras benfeitorias". A última reforma no equipamento foi realizada em 2019.

Quanto à reclamação dos permissionários sobre a falta de limpeza e coleta seletiva insuficiente, apenas três vezes por semana, o município respondeu que "o mercado passa por limpeza diária, garantindo a manutenção da higiene e organização".

Na regional 4, o Mercado dos Peixes do Montese, como é conhecido o Mercado Paulo Mota, também deve receber serviços de conservação. Foram mapeadas necessidades de reparos na cobertura e na porta de entrada, segundo a Prefeitura.

O Mercado do Carlito Pamplona, na regional 1, e o Mercado São Sebastião, localizado na regional 12, foram contemplados por uma licitação lançada em 2024 para realização de reformas.

O valor de R$ 9.950.000 será dividido entre os dois equipamentos, com R$ 7,9 milhões destinados ao São Sebastião e R$ 2,049 milhões ao Carlito Pamplona. Os recursos provêm de convênio com a Caixa Econômica Federal, somada à contrapartida da Prefeitura.

No edital do certame são listadas as principais intervenções que a construtora vencedora deverá realizar. No Mercado São Sebastião, é preciso trocar revestimentos das fachadas, dos banheiros, pisos, forros PVC, recuperar estruturas metálicas e de concreto, requalificar guarda-corpos e calhas de drenagem, além da revisão de instalações elétricas e hidrosanitárias.

No Mercado do Carlito Pamplona, é necessário realizar pintura, implantação do sistema de proteção contra incêndio, manutenção da cobertura metálica e de esquadrias, construção de uma nova caixa d'água e a instalação de plataforma elevatória de acessibilidade (elevador).

Segundo Adams Gomes, secretário da regional 12, apesar da licitação já ter uma construtora vencedora, o contrato ainda não foi assinado. A expectativa é de que as obras no São Sebastião possam iniciar ainda neste semestre.

"Vamos fazer a obra com as coisas funcionando. Fazer de uma forma que não vai atrapalhar tanto", explica.

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